“Mesma ciência que busca vida inteligente fora da Terra” que “vai ao fundo dos mares encontrar vida, encontrar outros seres, esta ciência” que a ministra Rosa Weber “se refere” em seu voto favorável à descriminalização do aborto “não é capaz de encontrar a vida no útero de uma mulher, como é interessante, né?!”, disse o bispo de Piracicaba (SP), dom Devair Araújo da Fonseca em vídeo postado ontem (28), nas redes sociais da diocese.

O julgamento da Arguição de Descumprimento de Provimento Constitucional (ADPF) 442 que pretende legalizar o aborto até 12 semanas de gravidez no Brasil, a pedido do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), começou na madrugada do dia 22 de setembro no plenário virtual do Supremo Tribunal Federal (STF). Mas, logo após o voto da ministra Rosa Weber, foi interrompido com um pedido de destaque do ministro Luís Roberto Barroso. Não há ainda nova data agenda no STF.

Dom Devair Araújo destacou que “uma das coisas que” Weber citou em seu voto de 129 páginas “é que não há um consenso entre a ciência, a filosofia e a religião sobre o princípio da vida”.

Em uma publicação do dia 26 de setembro, o bispo também destacou o “número 36” do texto de Rosa Weber, que tem “a seguinte afirmação: ‘A inexistência de consenso a respeito de quando inicia a vida é fato notório, mesmo para a área da ciência, na qual dissensos razoáveis sobre a questão coexistem desde sempre. Como afirmado, na audiência pública, pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) ... o conhecimento científico permite falar sobre critérios para definição de vida em nível celular, mas não de vida humana. Lado outro, igualmente constata-se a inexistência de consensos sobre o início da vida humana no campo da filosofia, da religião e da ética’”. “Aqui começa uma encruzilhada”, alerta o bispo de Piracicaba.

Segundo dom Devair, “a referência científica é perfeitamente razoável”, como disse “são João Paulo II” sobre a “fé e a razão”: “constituem como que as duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade. Foi Deus quem colocou no coração do homem o desejo de conhecer a verdade e, em última análise, de conhecer a Ele, para que, conhecendo-O e amando-O, possa chegar também à verdade plena de si próprio” (Fides et ratio).

“A grande questão está na instrumentalização da ciência, que é capaz de comprovar a vida celular, mas é incapaz de declarar que seja vida humana. A mesma ciência que consegue descobrir galáxias distantes e estrelas extintas, ou que procura por água e estruturas elementares de vida em outros planetas, não consegue reconhecer a vida desde a concepção no útero materno. Aqui cabe um questionamento: onde de fato existe fundamentalismo? O argumento religioso não é fundamentalista, mas é fundamentado na razão, de ordem natural, e na fé, de ordem divina. Esse ensinamento do magistério nunca poderá ser alterado”, disse.

Para o bispo de Piracicaba, “nessa encruzilhada, a questão deixou de ser o consenso científico e passou a ser uma realidade de discursos seletivos”, pois “quando convém, a ciência é afirmativa, e quando não, a utilizam para negar a evidência de vida humana”.

“Por trás de tudo isso, existe um grande jogo de interesses e ideologias, que passam a ser assumidos como direito reprodutivo, direitos do corpo, políticas de saúde pública e tantos outros nomes. A verdade é que a vida humana é um dom, da concepção até o seu fim natural, e deve ser preservada e defendida contra toda violação. A verdade é que o aborto é um mal, uma violência contra alguém que não tem defesas. A verdade é que, na falta de consenso, esse julgamento deveria considerar o benefício da dúvida em favor da vida, que se tornou a ré. Se a ciência não tem consenso, então não tem critérios para distinguir entre vida celular e vida humana, deveria prevalecer a humana que está em risco. Pois, se a sentença for favorável ao aborto, a vida humana será simplesmente descartada, e a justiça cometerá uma injustiça irreparável. Quebrar a ordem natural da vida é um ato de irracionalidade e não um avanço social”, disse dom Devair.