O rei Carlos III da Inglaterra agiu de modo contrário ao juramento feito em sua coroação e agora deve "deixar outra pessoa tomar seu lugar, que seja um verdadeiro protestante e que leve seus votos a sério", disse um ministro presbiteriano livre da Irlanda do Norte depois que o rei rezou ontem (23) com o papa Leão XIV na Capela Sistina, no Vaticano.

O reverendo Kyle Paisley, filho de Ian Paisley, fundador do Partido Unionista Democrático, fez as declarações numa carta a jornais da Irlanda do Norte e, depois, à empresa de comunicação pública do Reino Unido BBC.

A Irlanda do Norte fica na mesma ilha que a República da Irlanda, mas faz parte do Reino Unido, com Inglaterra, Escócia e País de Gales. As nove províncias de Ulster, nome geográfico da Irlanda do Norte, são a única parte da ilha em que a população é majoritariamente protestante. Os protestantes unionistas são a favor de que a Irlanda do Norte continue como parte do Reino Unido. Há uma militância política católica favorável a que a Irlanda do Norte passe a fazer parte da República da Irlanda. A disputa foi muito violenta durante boa parte do século XX.

O rei e o papa

Num culto de oração na Capela Sistina, o rei Carlos III, chefe supremo da Igreja da Inglaterra, acompanhado pela rainha Camila, sentou-se ao lado esquerdo de Leão XIV enquanto o papa e o arcebispo de York da Igreja da Inglaterra, Stephen Cottrell, faziam as orações.

O encontro e a oração também foram lamentados publicamente pela Ordem de Orange, organização protestante da Irlanda do Norte. O grupo disse que as orações ecumênicas são um "dia triste para o protestantismo", expressando "grande tristeza" e levantando suas objeções nos "termos mais fortes possíveis".

Em seus comentários, Paisley perguntou se a oração histórica em Roma foi um "momento cínico" ocorrendo 500 anos depois da impressão do Novo Testamento em inglês por William Tyndale, algo que ele diz que ainda faz o papado "lamber suas feridas".

“Em sua coroação, o rei disse ser um verdadeiro protestante e prometeu defender a religião da igreja estabelecida na Inglaterra, assim como a da Igreja da Escócia, que é historicamente protestante”, disse Paisley. “Nosso rei negou o Evangelho cristão, desrespeitou as Sagradas Escrituras, desmentiu seu juramento e demonstrou que não é nada do que diz ser — um verdadeiro protestante”.

“O protestantismo toma a Bíblia como a única regra de fé e prática", disse ele. “O romanismo, não. Sua regra de fé e prática são as Escrituras conforme interpretadas pela Igreja — isto é, pela Igreja Católica Romana — e pela tradição. Isso efetivamente torna a Igreja a regra de fé e prática. A Palavra de Deus por si só não é suficiente para ela”.

Wallace Thompson, da Sociedade Evangélica Protestante da Irlanda do Norte, concordou com Paisley, embora não tenha defendido a abdicação do rei. Ele disse à rede de comunicação britânica BBC: “As questões que existiam na época da reforma ainda existem — profundas diferenças doutrinárias. As duas igrejas estão tão distantes que não se deveria sentir que se pode orar em conjunto — conversar, sim. Isso é simbólico. O rei apresenta certos valores em sua coroação para manter no Reino Unido a religião protestante reformada estabelecida por lei. Ele está enviando um sinal agora de que, no fundo, ele não quer fazer isso”.

Receba as principais de ACI Digital por WhatsApp e Telegram

Está cada vez mais difícil ver notícias católicas nas redes sociais. Inscreva-se hoje mesmo em nossos canais gratuitos:

Paisley também falou sobre o fato de o rei Carlos III e outros membros da realeza britânica terem comparecido recentemente à missa de réquiem pela duquesa de Kent, que era católica.

Reforçando sua opinião, Paisley publicou uma declaração nas redes sociais antes da oração na Capela Sistina: "É uma vergonha que nenhum parlamentar cristão evangélico ou membro da câmara dos Lordes tenha falado publicamente sobre o flagrante comprometimento do juramento do rei, evidenciado no ato planejado de culto corporativo com o papa".

“A cadeira na basílica de São Paulo, que tem o emblema do rei, não é um ornamento vazio, mas está lá para ele usar em qualquer ocasião que a visite”, disse também ele.

Vendo nessa honraria o objetivo de longo prazo de Roma de uma reversão completa da reforma protestante, Paisley disse: “A besta mortal estava lambendo as feridas infligidas a ela pela reforma e agora vê seu caminho para a cura completa, auxiliada e instigada por um rei que não é fiel à sua palavra e por um governo e ministério das relações exteriores britânicos, e um primeiro-ministro britânico, que são tão ímpios quanto possível”.

O pai de Kyle Paisley, o reverendo Ian Paisley, que morreu em 1988 — protestante evangélico e político do Ulster — era virulentamente anticatólico. Em 1959, devido à visita da rainha Elizabeth, viúva do rei George VI, conhecida como rainha mãe, avó do rei Carlos III, e da princesa Margaret, tia de Carlos III, ao papa são João XXIII em Roma, ele as acusou de "fornicação e adultério com o anticristo".

Por ocasião da morte de são João XXIII, Ian Paisley disse: “Este homem romanista do pecado está agora no inferno”.

Em 1988, Ian Paisley foi expulso do Parlamento Europeu, em Estrasburgo, França, por gritar: "Eu te denuncio, anticristo!" para o papa são João Paulo II numa visita oficial do papa polonês ao parlamento. São João Paulo II observou calmamente enquanto o homem do Ulster era retirado do prédio.

Posteriormente, Paisley disse aos repórteres que havia sido "agredido" por deputados católicos romanos. Ele disse também: "O Parlamento Europeu é dominado pela Igreja Católica Romana. Maria é a Madona do Mercado Comum".

Mais em

Apesar de suas visões semelhantes ao pai sobre a fé católica, Kyle Paisley, por ocasião da morte do papa Francisco, ofereceu solidariedade aos “devotos católicos romanos que o admiravam como o chefe de sua Igreja e o guia de sua fé”.

O rei Carlos III se encontrou com os três papas mais recentes — mais notavelmente com Francisco, em abril, pouco antes da morte do papa argentino.

O papa são João Paulo II e o papa Bento XVI viajaram para a Grã-Bretanha, mas os encontros com membros da família real não tinham orações conjuntas.

O príncipe William, herdeiro do trono britânico, compareceu ao funeral do papa Francisco, e o príncipe Edward, irmão do rei, esteve na missa de posse do papa Leão XIV em maio.