A maioria dos brasileiros continua sendo contrário à legalização do aborto no país, indicam dados de uma recente pesquisa divulgada nesta semana, segundo a qual 59% dos entrevistados não concordam em alterar a legislação atual sobre esta prática.

O levantamento foi feito pelo Instituto Datafolha e ouviu 8.433 pessoas de 313 municípios, nos dias 20 e 21 de agosto, e se deu dias após o Supremo Tribunal Federal realizar em 3 e 6 de agosto uma audiência pública sobre a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 442/2017 (ADPF 442), que propõe a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação.

De acordo com a pesquisa, cuja margem de erro é de dois pontos percentuais, as pessoas favoráveis à manutenção das atuais regras em relação ao aborto passou de 67% em 2015 para 59%.

Entretanto, este recuo não representa necessariamente aumento dos que são a favor da descriminalização do aborto, pois a taxa de brasileiros que acreditam que o aborto deveria ser legalizado em qualquer situação passou de 11%, em 2015, para 14%.

Estes dados vêm ao encontro de outras pesquisas anteriores sobre o aborto no Brasil, como os levantamentos dos Institutos Locomotiva de Pesquisa e Paraná Pesquisas, divulgadas em dezembro de 2017.

A pesquisa domiciliar do Instituto Locomotiva ouviu 1.600 pessoas em 12 regiões metropolitanas de 27 de outubro a 6 de novembro do ano passado, indicando que 62% dos brasileiros são contrários a que “as mulheres possam decidir por interromper a gravidez”.

Por sua vez, Paraná Pesquisas fez um levantamento online com 2.056 pessoas nos 26 estados brasileiros, entre 28 de novembro e 1º de dezembro. Os dados mostraram que 86,5% dos brasileiros são contrários à “legalização do aborto em qualquer situação”.

Além disso, em março de 2017, pesquisa Ipsos “sobre apoio ao direito à interrupção de gravidez”, revelou que o Brasil é o segundo país que mais rechaça o aborto, entre 24 que participaram do estudo.

De acordo com este levantamento, apenas 13% dos brasileiros apoiam o aborto quando a mulher desejar. A pesquisa sinalizou ainda que, no Brasil, 17% são totalmente contra o aborto, independente do cenário; e 21% afirmam que o aborto não deve ser realizado, exceto em casos em que a vida da mãe esteja em perigo.

Mensagem ao STF

Após a divulgação da mais recente pesquisa sobre a aprovação do aborto no Brasil, a presidente do Movimento Brasil Sem Aborto, Lenise Garcia, assinalou ao site ‘Gazeta do Povo’, que uma pesquisa de opinião pode não ser de “muita relevância” para a decisão dos ministros.

Entretanto, ressaltou, “tem sido usado o argumento de que é importante o Supremo Tribunal Federal entrar nesse assunto, porque o Congresso Nacional não ‘avança’, como se houvesse um posicionamento contrário ao da população brasileira”.

“Havendo evidências de que a população brasileira também não demanda mudanças na lei, qualquer justificativa para que o Supremo analise a questão fica prejudicada”, completou.

Por sua vez, Angela Martins, doutora em Filosofia do Direito e professora visitante de Harvard, a pesquisa que confirma que a população não deseja alterar a legislação do aborto “demonstra que não deveríamos ter deslocado esse debate para o Supremo, e sem representatividade”.

“Essa pesquisa pode auxiliar a demonstrar que a vontade política de muitos brasileiros seria frustrada nesse sentido, e ainda, em uma matéria de extrema relevância para a vida social do país”, observou.

Martins explicou que atualmente se vive “em uma era que chamamos filosoficamente de pós-verdade, que é uma verdade mais subjetiva e emotiva”. Foi o que disse a acadêmica ao referir-se à sua experiência em Brasília, quando participou da audiência pública sobre a ADPF 442.

Segundo a especialista, mais que argumentos sendo discutidos havia “um desejo de comoção em relação ao fato”. “Isso não nos leva a pensar sobre as consequências a longo prazo”, assinalou sobre o pedido ajuizado pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSol).

Segundo nota de imprensa publicada no site oficial do STF, na ADPF 442, “o partido questiona os artigos 124 e 126 do Código Penal, que criminalizam a prática do aborto. O PSOL pede que se exclua do âmbito de incidência dos dois artigos a interrupção voluntária da gravidez nas primeiras 12 semanas de gestação, alegando a violação de diversos princípios fundamentais”.

Ainda segundo o texto, para o PSOL, que é o autor da ação, “os dispositivos questionados ferem princípios constitucionais como a dignidade da pessoa humana, a cidadania, a não discriminação, a inviolabilidade da vida, a liberdade, a igualdade, a proibição de tortura ou o tratamento desumano e degradante, a saúde e o planejamento familiar das mulheres e os direitos sexuais e reprodutivos”.

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