O cardeal Raymond Burke pediu ao papa Leão XIV para suspender as restrições à liturgia anterior a 1970 alegando que o respeito pela tradição litúrgica é fundamental para a missão da Igreja e que a corrupção doutrinária e moral se manifesta em "divisões e facções" que levam ao abuso litúrgico.

Em mensagem de vídeo (link em inglês) a uma conferência em Londres comemorando 60 anos da Sociedade da Missa em Latim da Inglaterra e do País de Gales, o cardeal Burke disse que a dificuldade mais séria que são Paulo apóstolo enfrentou na Igreja primitiva em Corinto foi o "abuso que havia ocorrido na celebração da Santíssima Eucaristia", que estava "diretamente relacionado às divisões doutrinárias e morais entre os membros da comunidade".

A história da Igreja, disse ele, mostra que “a corrupção doutrinária e moral na Igreja se manifesta na falsificação do culto divino”.

“Onde a verdade da doutrina e a bondade da moral não são respeitadas, a beleza do culto também não é”, disse Burke.

Para o cardeal, a solução é um respeito renovado pela tradição e pelas leis que regem a sagrada liturgia.

O cardeal americano disse também na conferência que já havia pedido a Leão XIV que removesse as restrições à missa tradicional em latim "assim que fosse razoavelmente possível", na esperança de que a situação fosse restaurada ao que era no pontificado de Bento XVI.

No início de sua fala, o cardeal Burke citou são Próspero da Aquitânia, padre da Igreja do século V: “A lei da oração postula a lei da fé”. O cardeal disse também que a sagrada liturgia é a “expressão mais elevada de nossa vida em Cristo e, portanto, a verdadeira adoração não pode deixar de refletir a verdadeira fé”.

A sagrada liturgia é o “maior tesouro” da Igreja e é insubstituível ele. “A desordem e a corrupção” na fé e em sua prática não resistirão à “verdade, à beleza e à bondade contidas na adoração a Deus ‘em espírito e verdade”.

Respeito pela tradição

Burke enfatizou que o culto divino não foi estabelecido pelo homem, mas pelo próprio Senhor Jesus Cristo, e, portanto, a fidelidade à tradição, como ela foi transmitida desde o tempo dos apóstolos, é primordial.

“O respeito pela Tradição nada mais é do que o respeito pelo ius divinum (do direito divino) essencial para “o relacionamento justo e correto entre Deus e sua criação”, especialmente o homem criado à imagem e semelhança de Deus, disse ele.

O cardeal chamou atenção para um “foco exagerado no aspecto humano da sagrada liturgia” no período posterior ao Concílio Vaticano II (1962-1965), que, segundo ele, leva a uma ênfase diminuída no encontro com Deus por meio de sinais sacramentais e a uma negligência do “correto relacionamento do homem com Deus”.

Burke culpou o antinomianismo — a crença de que não há leis obrigatórias — que se espalhou desde a década de 1960 e deu origem ao "antinomianismo litúrgico", que ele chamou de sua manifestação "mais hedionda".

Ele disse à plateia que o "foco principal" dos Dez Mandamentos é o culto divino, e que o princípio fundamental do ius divinum é "o direito de Deus de receber o culto do homem da maneira que Ele ordena". Se o culto oferecido a Deus "em espírito e verdade", que o cardeal chamou de "dádiva de Deus ao homem", não for honrado, então a lei de Deus está "corrompida para propósitos humanos", disse Burke. "Só observando e honrando o direito de Deus de ser conhecido, adorado e servido como Ele ordena é que o homem encontra sua felicidade".

O cardeal lamentou que hoje, a atenção à lei litúrgica “pareça totalmente estranha ou, pelo menos, esotérica”, mas que “sem uma apreciação adequada da estrutura legal da sagrada liturgia, o maior e mais belo tesouro da Igreja esteja sujeito a mal-entendidos e até mesmo abusos”.

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Destacando como, em 1963, o papa são Paulo VI alertou contra tais abusos e enfatizou a importância da disciplina que rege a liturgia para que ela permaneça fiel à tradição, o cardeal Burke disse que "é de se admirar" como, já desde a década de 1970, a advertência de são Paulo VI tenha sido em grande parte ignorada ou ignorada. Ele também lembrou as preocupações do papa são João Paulo II com "certa liberdade criativa" na liturgia em seus dois documentos de 1980 sobre a liturgia, Dominicae cenae e Inaestimabile donum.

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“A fonte das dificuldades é a perda de conhecimento da tradição sagrada como veículo insubstituível de transmissão da sagrada liturgia”, disse o cardeal Burke, falando sobre o discurso de Bento XVI à Cúria Romana em 2005.

Para ele, os magistérios de Bento XVI e são João Paulo II “indicam claramente que a devida atenção às normas litúrgicas não constitui um tipo de legalismo ou rubricismo, mas um ato de profundo respeito e amor ao Senhor que nos deu o dom do culto divino, um ato de profundo amor que tem como fundamento insubstituível o conhecimento e o cultivo da tradição”.

Burke comentou as palavras de Bento XVI na carta que acompanhava o motu proprio Summorum pontificum, publicado em 2007, que liberalizou a celebração da liturgia anterior a 1970: “O que as gerações anteriores consideravam sagrado continua sagrado e grandioso para nós também, e não pode ser de repente totalmente proibido ou mesmo considerado prejudicial”.

Traditionis custodes

Mas Traditionis custodes, carta apostólica publicada pelo papa Francisco em 2021 que impôs severas restrições à liturgia tradicional, "perturbou seriamente" a "paz litúrgica que foi fruto da aplicação do Summorum Pontificum", disse o cardeal Burke. Ele disse esperar que as questões legais relativas a Traditionis custodes "sejam abordadas o mais breve possível".

Respondendo a uma pergunta da plateia, o cardeal Burke disse que a implementação da Traditionis custodes equivalia a uma “perseguição de dentro da Igreja” e que ele “já teve ocasião de expressar isso” a Leão XIV.

“Certamente espero que ele, assim que for razoavelmente possível, retome o estudo dessa questão e tente restaurar a situação como era depois do Summorum pontificum, e até mesmo continue a desenvolver o que o papa Bento XVI legislou tão sabiamente e amorosamente para a Igreja”, disse ele.

O cardeal concluiu expressando sua esperança de que uma “renovada apreciação da tradição como princípio próprio da sagrada liturgia [resulte] na realização da esperança dos padres conciliares em comunhão com o Romano Pontífice”.