O patriarca latino de Jerusalém, cardeal Pierbattista Pizzaballa, condena a violência que atualmente abala a Terra Santa, região que passa por “um dos períodos mais difíceis e dolorosos” da sua história recente.

O cardeal publicou hoje (24) uma carta aos fiéis da Terra Santa, pouco mais de duas semanas após o ataque do grupo terrorista Hamas contra o sul de Israel, que resultou numa série de bombardeios do exército israelense em direção à Faixa de Gaza.

Segundo relatos, a incursão do grupo islâmico causou a morte de pelo menos 1,4 mil pessoas e mais de 220 sequestrados, que foram levados para Gaza, região controlada pelo Hamas desde 2007 e onde também existem outros grupos anti-israelenses como a Jihad Islâmica.

Os ataques aéreos israelenses deixaram mais de 5 mil mortos em Gaza. Segundo o Ministério da Saúde, 40% são crianças e 22% são mulheres ou idosos.

“A minha consciência e o meu dever moral me obrigam a declarar claramente que o que aconteceu em 7 de outubro no sul de Israel não é de forma alguma admissível e não podemos deixar de o condenar. Não há razão para tal atrocidade. Sim, temos o dever de afirmá-lo e denunciá-lo”, diz o cardeal Pizzaballa.

“O recurso à violência não é compatível com o Evangelho e não conduz à paz. A vida de cada pessoa humana tem igual dignidade diante de Deus, que nos criou a todos à Sua imagem”, continua.

No entanto, acrescenta, “a mesma consciência, com um grande peso no coração, leva-me hoje a afirmar com a mesma clareza que este novo ciclo de violência causou mais de cinco mil mortes em Gaza, entre elas muitas mulheres e crianças, dezenas de milhares de feridos, bairros devastados, falta de medicamentos, água e bens de primeira necessidade para mais de dois milhões de pessoas. São tragédias que não são compreendidas e que temos o dever de denunciar e condenar sem reservas”.

O patriarca latino de Jerusalém adverte que os bombardeios só continuarão causando mais mortes em Gaza “e só aumentarão o ódio e o ressentimento, não resolverão nenhum problema, mas criarão novos. É hora de parar esta guerra, esta violência sem sentido”.

Para o cardeal Pizzabala, é necessário resolver este conflito desde as suas raízes, o que inclui acabar com a ocupação israelense dos territórios palestinos – como está acontecendo na Cisjordânia – e dar "uma perspectiva nacional clara e segura ao povo palestino", caso contrário “nunca haverá a estabilidade que todos desejamos”.

“A tragédia destes dias deve nos levar a todos, religiosos, políticos, sociedade civil, comunidade internacional, a um compromisso mais sério a este respeito do que aquele que foi assumido até agora. Só assim poderemos evitar mais tragédias como a que vivemos agora. Devemos isso às muitas, muitas vítimas destes dias e de todos estes anos. Não temos o direito de deixar esta tarefa para outros”, diz.

Orar, fazer penitência e interceder

Na sua carta, o cardeal Pizzaballa diz que os dias de oração pela Terra Santa convocados, como o que o papa Francisco convocou para 27 de outubro, são “um belo olhar” e “um importante momento de unidade com a nossa Igreja”.

“É talvez a principal coisa que nós, cristãos, podemos fazer neste momento: rezar, fazer penitência, interceder. E por isso agradecemos do fundo do coração ao Santo Padre”, diz.

O cardeal exorta a voltar o olhar para o Evangelho de Jesus, “porque no final é de lá que todos devemos partir e para onde devemos sempre voltar”.

“Olhar para Jesus, claro, não significa se sentir isento do dever de dizer, denunciar, recordar, bem como consolar e encorajar. Como ouvimos no Evangelho do domingo passado, é necessário dar ‘a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus’. Portanto, olhando para Deus, queremos, antes e tudo, dar a César o que é dele”, diz.

Segundo o cardeal Pizzabala, a fé iluminará o modo de ver o que está acontecendo na Terra Santa. “Precisamos de uma Palavra que nos acompanhe, nos console e nos encoraje. Precisamos disso como do ar que respiramos”.

Na sua carta, o cardeal recorda a passagem do Evangelho de João em que Cristo diz: “Referi-vos essas coisas para que tenhais a paz em mim. No mundo haveis de ter aflições. Coragem! Eu venci o mundo”.

“Ele dirige estas palavras aos seus discípulos, que em breve serão abalados como por uma tempestade antes da sua morte. Eles entrarão em pânico, se dispersarão e fugirão, como ovelhas sem pastor”, lembra o patriarca.

Para o cardeal, “esta última palavra de Jesus é um encorajamento. Ele não diz que vai vencer, mas já venceu. Mesmo no drama que se aproxima, os discípulos poderão ter paz”.

Isto, acrescenta, não é uma resignação de que não há nada que possa ser feito para mudar o mundo, “mas sim ter a certeza de que foi precisamente no meio de todo este mal que Jesus saiu vitorioso”.

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“Foi na cruz que Jesus venceu. Nem com armas, nem com poder político, nem com grandes meios, nem por imposição. A paz de que ele fala nada tem a ver com a vitória sobre os outros. Ele conquistou o mundo, amando-o”.

"A resposta de Deus à questão de por que os justos sofrem não é uma explicação, mas uma Presença. ‘É Cristo na cruz’”, diz.

O cardeal também lembrou as 18 vítimas do atentado a bomba que afetou a Igreja Ortodoxa de Gaza, cujas famílias são conhecidas dos fiéis católicos, já que a comunidade cristã na Faixa tem pouco mais de mil pessoas.

A dor das famílias “é grande e, no entanto, a cada dia percebo mais que estão em paz. Assustados, chocados, angustiados, mas com paz no coração. Estamos todos com eles, em oração e em solidariedade concreta, agradecendo-lhes o seu belo testemunho”, diz.

“É preciso coragem para poder exigir justiça sem espalhar o ódio”, bem como para manter a unidade “apesar da diversidade das nossas opiniões, sensibilidades e visões”, continua.

O cardeal Pizzaballa conclui a sua carta convidando a rezar por todas as vítimas inocentes, porque o seu sofrimento tem diante de Deus “um valor precioso e redentor, porque está unido ao sofrimento redentor de Cristo. Que o seu sofrimento traga a paz cada vez mais perto”.