Os membros da assembleia geral estão reunidos no Vaticano de ontem (11) até o dia 16 de maio para eleger um novo presidente, o secretário-geral, e outras autoridades, seis meses depois que o papa Francisco destituiu toda a liderança da organização. Em cartas abertas enviadas aos delegados, dois ex-secretários gerais da Caritas, Aloysius John e seu antecessor, Michel Roy criticam duramente a intervenção do papa Francisco.

A Caritas Internationalis, fundada em 1951, é uma confederação católica de 162 organizações de caridade sediadas em 200 países ao redor do mundo. Sua sede está no Vaticano e a Santa Sé supervisiona sua atividade.

Um decreto do papa Francisco de novembro passado ordenou uma revisão na Caritas "para melhorar suas normas e procedimentos de gestão - mesmo que os assuntos financeiros fossem bem geridos e as metas de arrecadação de fundos fossem regularmente alcançadas - e, assim, servir melhor suas instituições de caridade em todo o mundo”.

O comunicado de imprensa divulgado com a intervenção do papa em novembro, dizia que não foram constatados má administração financeira ou abusos sexuais, mas foram encontradas deficiências "nos procedimentos de gestão (da Cáritas), que tiveram um efeito negativo também no espírito de equipe e na moral dos funcionários".

Uma administração interina, liderada por um ex-especialista em gerenciamento da Bain Capital, dirige a organização global desde então.

Na carta de oito páginas que enviou aos delegados reunidos em Roma desde ontem, o ex-secretário John disse que a ação do papa foi uma "tomada brutal de poder".

Para ele, a intervenção é um "ato incompreensível" à luz do processo sinodal em andamento na Igreja mundial.

As mudanças na liderança obedecem “a uma vontade deliberada de alguns superiores de dicastérios que pensam e agem numa lógica de controle da instituição, das pessoas, dos recursos”, diz John. Ele também denuncia uma atitude "colonialista" de alguns membros da confederação, que o estariam vendo como um intruso por ser de origem indiana.

Em sua carta, John lembra que a inspeção externa havia começado no verão de 2022, após uma carta que ele havia enviado ao cardeal Michael Czerny, prefeito do Dicastério para a Promoção do Desenvolvimento Humano Integral, em 23 de junho. A inspeção havia sido solicitada porque "alguns funcionários, insatisfeitos com as mudanças, escreveram cartas anônimas e uma carta assinada ao vice-presidente da Caritas International".

A inspeção pretendia "ajudar a entender a situação", escreve John na carta. No entanto, o relatório final da inspeção foi classificado como "confidencial", diz. Ao mesmo tempo, quando a liderança da Cáritas foi demitida, destacou-se que não houve "nem má-administração nem abuso sexual, mas deficiência na gestão".

Algumas palavras "surpreendentemente vagas", "sem fundamento" e "fruto de uma investigação exclusivamente incriminatória", diz John.

O governo provisório, diz John, humilha "os membros da confederação, que depositam sua confiança nesta instituição e em seu futuro".

John disse que “o anúncio desta suspensão, feito às pressas, com incrível violência e pouca comunicação pública, desacreditou a Igreja e uma de suas joias”.

Em sua carta, Roy adverte que “a confederação corre o risco de se tornar uma mera plataforma sujeita a decisões de cima e não de seus membros”.

Ele diz que "não há dúvida" de que "os responsáveis" do Dicastério para a Promoção do Desenvolvimento Humano Integral são os responsáveis ​​por tentar centralizar o controle sobre a Cáritas. E acrescenta: “O fato de que a decisão tomada não pode ser questionada porque está sujeita a um decreto do Santo Padre não pode esconder de onde vem”.

Eleição dos novos dirigentes

O Secretariado Geral da Caritas Internationalis tem a sua sede na Cidade do Vaticano. A partir daí, a direção da organização “coordena as respostas de emergência, a política e defesa, as comunicações, a representação internacional e o desenvolvimento de capacidades”, segundo o site da Cáritas.

As organizações nacionais da Cáritas estão vinculadas às suas Conferências Episcopais. A cada quatro anos, representantes dessas organizações se reúnem em Assembleia Geral na Cidade do Vaticano para eleger seu presidente, vice-presidentes, secretário-geral e tesoureiro. A última Assembleia foi em 2019.

Os possíveis sucessores do cardeal Luis Antonio Tagle, destituído do cargo de presidente da Cáritas em novembro, incluem o cardeal Soane Patita Paini Mafi, arcebispo de Tonga; o arcebispo de Tóquio Tarcisius Isao Kikuchi; o arcebispo maronita de Trípoli, Líbano, Joseph Soueif, candidato à presidência da Caritas em 2015; e dom Gabriel Hatti, presidente do escritório do Oriente Médio e Norte da África.

Entre os candidatos a secretário-geral estão Cristina Calvo, consultora da Cáritas América Latina, e Alistair Dutton, diretor-executivo da Caritas Escócia e ex-diretor humanitário da Caritas Internationalis.

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A Catholic News Agency - agência de notícias EWTN em inglês - contatou a Caritas Internationalis na quarta-feira (10) para comentar as críticas de seus ex-dirigentes, mas não recebeu resposta antes desta publicação.

Em comunicado à Associated Press, a Cáritas diz que passou os últimos seis meses em uma "jornada de renovação e comunhão" em resposta ao apelo do papa Francisco por reformas.

"Estamos nos preparando para que [a Assembleia Geral, já em andamento] seja um momento de encontro alegre, de diálogo sincero e de escuta recíproca, visando construir juntos o futuro caminho de cooperação fraterna, a serviço dos pobres e dos mais vulneráveis ", acrescentou o comunicado.

Em sua audiência de ontem (11) com os participantes da Assembleia Geral da Caritas Internationalis, o papa Francisco disse: “não devemos esquecer que a origem de toda nossa atividade caritativa e social é Cristo”.

“A falta de caridade esvazia qualquer ação de conteúdo”, assim como ensinava São Paulo, disse o papa. "Mesmo as ações mais extraordinárias, a generosidade mais heroica, até mesmo a distribuição de todos os bens para dá-los aos famintos, sem caridade não valem nada"

Para o papa Francisco, a fé em Deus Pai, a amizade com Cristo e a orientação do Espírito Santo são fundamentais. Portanto, sem estes elementos, “seria fácil perder de vista a finalidade da diaconia a que somos chamados: levar a alegria do Evangelho, a unidade, a justiça e a paz”.

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