Duas legislaturas estaduais estão considerando acabar com quaisquer proteções legais a um padre que saiba sobre abusos sexuais por confissão. Em resposta, líderes católicos alertaram que tais leis são inconstitucionais, colocando padres em risco legal e comprometendo a confidencialidade com penitentes.

 

O projeto de lei 74 da câmara de Delaware está entre as propostas para acabar com proteções ao clero em leis obrigatórias de denúncia de abuso sexual.

 

“Esta lei revoga o privilégio entre padre e penitente em uma confissão sacramental relacionada ao abuso e negligência infantil”, diz o resumo do projeto de lei no site da assembleia geral de Delaware. “Ela exige que padres denunciem abuso e negligência infantil ou forneçam ou aceitem evidências em um processo judicial relacionado a abuso ou negligência infantil”.

 

A legislação gerou críticas da diocese católica de Wilmington.

 

“O sacramento da confissão e seu sigilo de confissão são aspectos fundamentais da teologia e da prática sacramental da Igreja. Isso não é negociável. Nenhum padre ou bispo católico quebraria o sigilo da confissão em nenhuma circunstância”, disse a diocese de Wilmington na segunda-feira (6).

 

“A diocese de Wilmington considera a proteção dos vulneráveis ​​um dos objetivos mais importantes da política pública. No entanto, esta legislação não promoveria esse objetivo vital”, continuou a diocese.

 

O requisito seria praticamente “quase impossível de ser cumprido” pelo clero católico porque quase todas as confissões sacramentais são anônimas.

 

“Seria uma clara violação da Primeira Emenda o governo interferir em uma das práticas mais antigas e sagradas de nossa fé”, disse a diocese, que expressou preocupação com a violação dos direitos de outras comunidades religiosas.

 

A lei canônica católica caracteriza o sigilo da confissão sacramental como “inviolável” e diz que é “o confessor nãopode denunciar o penitente nem por palavras nem por qualquer outro modo nempor causa alguma”.

A diocese de Wilmington disse que quebrar este sigilo incorre em uma excomunhão automática que somente o papa pode perdoar. A lei de Delaware já exige que os padres sejam denunciantes obrigatórios de suspeitas de abuso, e a política interna da diocese exige que os padres denunciem suspeitas de abuso infantil às autoridades civis.

Em Vermont, o bispo Christopher Coyne, de Burlington, compareceu perante o Comitê Judiciário do Senado em 3 de março para se opor ao Projeto de Lei S.16. O projeto de lei eliminaria totalmente a proteção do clero da lei de denúncia obrigatória de abuso se a denúncia de abuso violar um privilégio ou divulgar comunicaçãoconfidencial.

Segundo Coyne, a legislação “esbarra em um elemento constitucionalmente protegido de nossa fé religiosa: o direito de adorar como bem entendermos”.

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“Não há dúvida de que proteger as crianças é essencial e que os criminosos devem ser responsabilizados por seus crimes. Mas desrespeitar os direitos religiosos fundamentais é desnecessário”, disse o bispo.

Segundo dom Coyne, a isenção à lei atual é “muito estreita”. Nenhuma conversa de escritório ou sessão de aconselhamento é privilegiada. Ele caracterizou a confissão como “um momento de adoração em que o penitente busca a misericórdia de Deus”.

Coyne disse que todos os clérigos e funcionários leigos da diocese de Burlington são obrigados a colaborarem com informações. Qualquer pessoa que trabalhe para a diocese ou em paróquias diocesanas deve ter uma verificação de antecedentes criminais e treinamento em ambiente seguro para reconhecer sinais de abuso infantil.

“O padre tem o dever sagrado de manter o segredo da confissão sacramental. O sigilo sacramental da confissão é a lei mundial da Igreja Católica, não apenas da diocese. Nenhum bispo tem autoridade para mudar isso”, disse.

“Exigir que o clero denuncie o abuso infantil que tenha sido revelado durante uma comunicação penitencial infringiria nossos direitos da Primeira Emenda. Não apenas os meus direitos e os do clero, mas os direitos de todos os católicos no estado de Vermont e os direitos de qualquer outra comunidade de fé que tenha esse tipo de comunicação penitencial privilegiada”, disse dom Coyne.

O bispo afirmou que desde os tempos antigos, as confissões não podiam ser compartilhadas com ninguém, mesmo que fosse algo vantajoso para a Igreja ou para o sacerdote.

“Hoje, o presidente dos Estados Unidos poderia se confessar com um padre e o padre não precisaria se preocupar em ser intimado pelo Congresso para expor o que foi dito”, disse Coyne.

“As pessoas no confessionário devem ser verdadeiramente penitentes e buscar mudar suas vidas. O clero poderia encorajar o penitente a ir às autoridades se um crime foi cometido, mas este é o dever do penitente”, acrescentou o bispo.

Outros estados estão considerando adotar uma legislação semelhante.

No Kansas, o membro do senado do estado Tom Holland, democrata de Baldwin City, introduziu a SB 87, que exigiria que ministros ordenados no estado relatassem suspeitas de abuso físico, sexual ou emocional e negligência de crianças. Deixar de relatar significaria uma acusação de contravenção.

Segundo informações divulgadas em janeiro pelo jornal Topeka Capital-Journal, embora seu projeto de lei de 2019 sobre o mesmo assunto contenha uma isenção para o privilégio penitencial, sua legislação de 2023 não isenta as comunicações penitenciais.

O diretor-executivo da Conferência Católica do Kansas, Chuck Weber, disse à CNA, agência em inglês do Grupo ACI, que não conhece planos de fazer uma audiência sobre o projeto.

“A Conferência Católica do Kansas apoia a medida há muito tempo, com apenas uma cláusula penitencial de proteção de privilégio. Os padres do Kansas já estão treinados e cumprindo a responsabilidade de denunciar casos de abuso e/ou negligência”, disse Weber.

Holland disse ao Topeka-Capital Journal que estava preocupado que a isenção fosse “uma porta dos fundos para não denunciar”, o que desencorajaria as investigações policiais. Assim, isentar confissões seria uma “saída mais fácil”.

“Se temos uma organização religiosa onde este é um problema generalizado, minha preocupação é a de que a isenção se torne basicamente um procedimento operacional padrão onde, se algo acontecer, corra e vá se confessar. E então, quando os investigadores chegarem, derem a justificativa: ‘Não sabemos. Não somos obrigados a compartilhar essa informação’ “, disse o político.

O poder legislativo do estado de Washington tinha dois projetos de lei relativos à denúncia obrigatória de abuso infantil pelo clero. A versão do Senado, SB 5280, preservou o privilégio entre clérigos e penitentes, enquanto a versão da Câmara dos Deputados, HB 1098, não. O Senado aprovou por unanimidade sua versão do projeto na quarta-feira (8) e o enviou à Câmara para aprovação.

A diretora de políticas e comunicações da Conferência Católica do Estado de Washington, Adrienne Joyce, disse à CNA que, embora fosse um projeto de lei viável, a HB 1098 teve sua última chance de passar pela Câmara na quarta-feira (8).

 

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