George Weigel, autor da mais importante biografia de são João Paulo II já publicada, disse que o livro Etica Teologica della Vita (Ética Teológica da Vida, em tradução livre), publicado pela Pontifícia Academia para a Vida (PAV) da Santa Sé, é “mais um atentado contra João Paulo II”.

Weigel escreveu um artigo online para a revista americana First Things na terça-feira (2) dizendo que “o livro propõe nada menos do que uma mudança radical no modo como a Igreja ensina sobre a vida moral: uma ‘mudança de paradigma’ como um dos autores diz, que entronizaria o proporcionalismo (e sua recusa de admitir que alguma coisa é simplesmente errada, ponto final) como o método oficial de pensamento moral”.

O livro a que Weigel se refere é composto das contribuições apresentadas em um congresso organizado pela PAV em outubro do ano passado. O livro saiu no final de julho. Nele se afirma, por exemplo, que métodos anticoncepcionais artificiais, salvo o aborto, deveriam ser aceitos pela Igreja.

O uso de métodos anticoncepcionais artificiais foi proibido pelo papa são Paulo VI em 1968, quando a pílula anticoncepcional era uma novidade, na encíclica Humanae vitae.

A encíclica foi escrita depois de uma extensa consulta a cardeais e bispos. Muitos deles aconselharam o papa a aceitar a pílula. Depois da proibição, Paulo VI foi criticado por muitos dos bispos e cardeais que haviam tido papel importante no Concílio Vaticano II, encerrado apenas três anos antes, e lançaram a ideia de que a consciência dos fiéis poderia guiá-los a desobedecer um ensinamento da Igreja.

Esse tipo de ideia levou são João Paulo II a escrever duas encíclicas: Evangelium vitae, em 1995, com a qual definiu a “cultura da morte” como característica da cultura que se vivia no final do século XX, e Veritatis splendor, “sobre algumas questões fundamentais do ensinamento moral da Igreja.”

Para Weigel, a mudança de paradigma proposta no livro da PAV significa repudiar Humanae vitae, Evangelium vitae e Veritatis splendor.

“Discussões sobre um tal repúdio não faltaram nos últimos anos no Instituto João Paulo II de Roma (uma sombra do que foi no passado) e na Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma, administrada pelos jesuítas”, escreve Weigel.

Ele conta em seu artigo que, no dia 13 de maio de 1981, o papa são João Paulo II recebeu para almoçar o pediatra e geneticista francês Jerôme Lejeune (1926-1994). Lejeune, responsável por identificar a anormalidade cromossômica que causa a síndrome de Down, era um importante militante pró-vida. O papa e o médico discutiram o que a Santa Sé poderia fazer para “promover a causa da vida através de teologia moral sólida, o melhor da ciência moderna, e através de políticas públicas que apoiassem uma cultura da vida”, diz Weigel.

Poucas horas depois desse almoço, são João Paulo II sofreu o atentado a tiros prepetrado pelo terrorista turco Mehemet Ali Agca.

Duas instituições da Santa Sé foram resultado direto dessa conversa, segundo Weigel. O Instituto João Paulo II de Estudos sobre o Casamento e a Família, e a Pontifícia Academia para a Vida.

“O Instituto João Paulo II floresceu nas últimas três décadas, formando uma geração de teólogos dedicados a refundar a teologia moral católica sobre um conceito sólido e contemporâneo de pessoa humana, e ao mesmo tempo recentrado na reflexão moral católica sobre as virtudes e as Beatitudes”, escreve Weigel.

O biógrafo comenta que o instituto gerou vários centros em diversos países do mundo. “Visitar qualquer um desses centros acadêmicos era entrar num mundo de grande aventura teológica, cheio de homens e mulheres comprometidos apostolicamente a converter as culturas em que viviam”, diz.

Isso incomodou as corporações profissionais de teólogos católicos da época, diz Weigel, “presas na areia movediça de um conceito moral da década de 1960, segundo o qual não existem absolutos morais, nada é sempre mal, e a vida moral é considerada uma ininterrupta negociação entre normas éticas fluídas, a sociedade e a consciência individual”.

Essa visão era muito influenciada pelo clima que se vivia nos anos 1960 com a chamada revolução sexual. Para Weigel, o “proporcionalismo” foi uma rendição ao “tsunami cultural” da época e Humanae vitae, Veritatis splendor, e Evangelium vitae rejeitaram o proporcionalismo como algo contrário ao Evangelho e à correta compreensão da vida moral.

As três encíclicas causaram desprezo e fúria das corporações dominantes de teólogos, diz Weigel.

“Segundo relatos da mídia, essas corporações agora pressionam por uma nova encíclica papal”, segundo o biógrafo. Uma encíclica “que levasse a Igreja à terra prometida do ‘discernimento’ moral, que fica ‘além’ do que a corporação ‘proporcionalista’ agora caricatura como a ‘moralidade branco-e-preto’, o ‘rigorismo’ e o ‘fundamentalismo’ de João Paulo II”.

Para Weigel, essa é mais “uma tentativa de assassinato contra o papa cujo ensino e exemplo animam as partes vivas da Igreja”.

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