30 de nov de 2025 às 12:19
O céu sobre o Líbano — outrora dominado por trocas de mísseis e incessantes bombardeios aéreos durante o conflito de 2023-2024 entre o Hezbollah e Israel — abriu-se neste domingo não para aviões de guerra, mas para a aeronave que transportava o papa Leão XIV. Ao aterrissar na Terra dos Cedros, o papa Leão XIV começa uma missão de pregar o Evangelho da paz a uma nação há muito ferida por conflitos e instabilidade.
Os combates ao longo da fronteira sul do Líbano recomeçaram em outubro de 2023, como consequência da guerra em Gaza. O Hezbollah, uma milícia xiita apoiada pelo Irã e formada depois da invasão israelense do Líbano em 1982, tornou-se o principal ator no novo confronto com Israel. Embora um frágil acordo no final de novembro de 2024 tenha reduzido as hostilidades, a violência intermitente continuou, e o cessar-fogo permanece incerto até que a Resolução 1701 das Nações Unidas — que exige a retirada do Hezbollah ao norte do rio Litani — seja totalmente implementada.
Depois do desembarque em Beirute, a comitiva do papa foi em direção ao palácio presidencial, passando por uma das áreas politicamente mais sensíveis do país. Dahieh, reduto do Hezbollah no sul de Beirute, sofreu bombardeios intensos e uma série de assassinatos ao longo do último ano. O secretário-geral de longa data do Hezbollah, Hassan Nasrallah, e seu potencial sucessor, Hashem Safieddin, foram mortos em ataques separados em 2024. Recentemente, em 23 de novembro, um ataque aéreo israelense no subúrbio matou um comandante local e outras cinco pessoas, além de ferir 28.
Apesar das tensões, vários clérigos xiitas acolheram publicamente a visita do papa Leão, e as municipalidades de Dahieh convidaram os moradores a cumprimentá-lo ao longo do trajeto da comitiva.
As feridas do Líbano vão além do seu conflito mais recente. Anos de paralisia política e colapso econômico deixaram o país profundamente enfraquecido. Protestos em massa eclodiram em 2019 contra a corrupção e o sectarismo, enquanto a pandemia de Covid-19 e a catastrófica explosão no porto de Beirute, em agosto de 2020, agravaram o sofrimento.
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Historicamente um ponto de encontro entre o cristianismo e o islamismo, o Líbano continua sendo um mosaico de comunidades unidas por uma identidade nacional compartilhada, porém frágil. Os cristãos — incluindo maronitas, ortodoxos gregos, católicos melquitas e armênios — continuam a desempenhar um papel vital na vida cultural e social, mesmo que a emigração e a instabilidade tenham reduzido seu número.
O sistema político confessional do Líbano, estabelecido durante o Mandato Francês e formalizado no Pacto Nacional não escrito de 1943, dividiu o poder entre as comunidades religiosas do país. Embora tivesse como objetivo preservar a coexistência, o acordo também consolidou a rivalidade sectária. A Guerra Civil Libanesa (1975-1990), alimentada pelo conflito árabe-israelense e pelo fluxo maciço de refugiados palestinos, deixou um saldo estimado de 150 mil mortos e remodelou o cenário político do país.
O Acordo de Taif de 1989 pôs fim à guerra reequilibrando o poder entre cristãos e muçulmanos e restringindo a autoridade da presidência maronita. Mas não resolveu os problemas subjacentes da corrupção, da interferência estrangeira e da fragmentação sectária. As tropas sírias, destacadas como garantidoras da paz, permaneceram no país até 2005.
Hoje, a Terra dos Cedros continua sendo um delicado mosaico de identidades, esperanças e tensões não resolvidas. Nesse cenário complexo e ferido, o papa Leão XIV chega como peregrino da paz, oferecendo uma mensagem de reconciliação e renovação para um país que anseia por estabilidade e um futuro alicerçado na justiça e na confiança mútua.



