Desde os tempos antigos, peregrinos cristãos e observadores curiosos notaram uma linha invisível que atravessa o continente europeu até a Terra Santa, conhecida como Espada de São Miguel. A linha une sete santuários dedicados ao comandante das hostes celestiais, do extremo norte da Irlanda até Jerusalém, passando pela França, Itália e Grécia.

“As pessoas se surpreendem quando falamos de uma linha”, diz Tatiana Bogni, que é guia há 20 anos na basílica de São Miguel, no Piemonte, Itália, à CNA, agência em inglês da EWTN. “Se você olhar para um mapa, a linha não é perfeitamente reta”, diz ela. “Mas vivemos num globo — linhas são relativas. Para mim, o que importa é a direção que este símbolo indica”.

Bogni é apaixonada pela abadia Sacra di San Michele, que fica no centro da linha invisível que conecta os sete santuários, e fala incansavelmente sobre a construção medieval erguida sobre uma rocha onde dizem que são Miguel apareceu.

Ao longo dos séculos, vários peregrinos percorreram os caminhos dessa linha angelical em forma de espada, movidos pela devoção pessoal, pela busca de significado ou vinculados por um voto.

Segundo algumas tradições, é costume começar a peregrinação pelo norte e descer até Jerusalém. Bogni, no entanto, acredita que faz mais sentido começar na Terra Santa e viajar para o norte, até a Irlanda — representando a jornada dos monges bizantinos que trouxeram o culto a são Miguel do Oriente para o Ocidente.

Um mapa da espada de São Miguel pela Europa, chegando até Jerusalém. cortesia de Sacra di San Michele
Um mapa da espada de São Miguel pela Europa, chegando até Jerusalém. cortesia de Sacra di San Michele

Seja qual for a direção escolhida, essa linha invisível foi “criada” há muito tempo.

Os sete santuários têm uma característica notável: todos são de difícil acesso — isolados, longe de tudo, construídos em ilhas ou afloramentos rochosos. Às vezes, só para alcançá-los é preciso encarar a força bruta da natureza. Mais importante ainda, cada um deles tem uma história de séculos ligada ao arcanjo.

Os sete santuários de são Miguel

Na Irlanda, o santuário de Skellig Michael é uma ilha rochosa que se ergue do mar como um templo. Agora deserta e lar de aves marinhas, só é possível chegar de barco. Os peregrinos podem ver os restos mortais dos monges que viveram lá entre os séculos VI e XII e que dedicaram o local ao anjo que derrotou o demônio.

De lá, a segunda parada do santuário é no Reino Unido: o monte de São Miguel, outra ilha dedicada ao arcanjo. Reza a lenda que são Miguel apareceu aos pescadores para salvá-los dos recifes. O castelo-fortaleza ali construído serviu como reduto estratégico nas guerras europeias. Hoje, só 30 moradores preservam seu legado.

O terceiro local é o monte Saint-Michel, na França, cuja famosa abadia é um destino turístico mundial. De tempos em tempos, o monte sagrado — onde são Miguel apareceu ao bispo Aubert de Avranches no século VIII, pedindo-lhe que construísse um santuário — é cercado pelas ondas do oceano, deixado à mercê das marés selvagens.

A linha continua pela Itália com dois santuários ainda habitados por monges.

A primeira é a Sacra di San Michele, uma abadia medieval no Piemonte, a 965 metros de altura e visível de todo o vale de Susa. Para quem se aproxima, suas colossais fundações de pedra, que se projetam sobre o penhasco, ainda irradiam uma força mística e uma sensação da dureza da vida.

Mais ao sul, na região da Apúlia, fica o santuário de São Miguel Arcanjo, no monte Gargano, construído entre os séculos V e VI ao redor de uma caverna onde se diz que são Miguel apareceu. Entre os mistérios do local, a lenda diz que a pegada do arcanjo está impressa na rocha.

Receba as principais de ACI Digital por WhatsApp e Telegram

Está cada vez mais difícil ver notícias católicas nas redes sociais. Inscreva-se hoje mesmo em nossos canais gratuitos:

O sexto santuário é o mosteiro de Panormitis, na ilha grega de Simi, lar de uma imagem de são Miguel com armadura de prata. O mosteiro ortodoxo data do século XVIII e ainda é habitado por monges.

Por fim, a linha termina — ou começa — na Terra Santa, no mosteiro de Stella Maris, no monte Carmelo, em Israel. Embora não esteja historicamente ligado a são Miguel, o mosteiro carmelita permanece como uma âncora simbólica para sua devoção a são Miguel na terra de Jesus Cristo.

Mais em

Uma jornada em direção à luz

“Desde os primórdios da humanidade, as pessoas sempre escolheram lugares privilegiados para a saúde espiritual, para se refugiarem da vida caótica e retornarem mais fortes”, diz Bogni, referindo-se a esses santuários antigos.

“Eu sempre digo que a Idade Média não foi melhor — só igualmente caótica”, diz também a guia. “A tecnologia muda, mas as pessoas permanecem as mesmas”.

Bogni frequentemente encontra peregrinos determinados a visitar todos os sete locais da linha de são Miguel.

“Ontem mesmo, levei um francês da Bretanha para um passeio. Ele está visitando cada santuário, um por um. Antigamente, os peregrinos percorriam a fila inteira de uma só vez. Eles se preparavam, faziam um testamento caso não retornassem. Hoje em dia, as pessoas costumam visitar em etapas, aos poucos”.

Isso não é "turismo", enfatiza Bogni. "Eles caminham para se encontrar. Cada um tem suas razões”.

“Acredito que São Miguel representa a batalha contínua dentro de si mesmo. Quem é como Deus? Quem quer tomar o lugar de Deus? — essa é a grande questão de são Miguel. Ele é uma figura guerreira que dá força, um símbolo poderoso que ajuda as pessoas a se manterem equilibradas e centradas”.

O francês Éloi Gillard, agora na casa dos 30 anos, foi ao monte Saint-Michel quando era um jovem escoteiro.

"Caminhei três dias sozinho para chegar lá — foi uma das experiências mais poderosas da minha vida: como estar no deserto, encarando a mim mesmo e a Deus", diz ele.

Agora pai de três filhos, Gillard diz que são Miguel o ajudou a "fazer um balanço da vida" naquela época.

"Foi como chegar à maioridade — um momento de compromisso, de conversão. São Miguel, com sua figura poderosa e masculina de um bravo cavaleiro, tornou-se uma imagem marcante para a minha vida de jovem".