25 de jun de 2025 às 10:26
Um santuário mariano dedicado aos cristãos perseguidos foi inaugurado na igreja de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, em Astana, Cazaquistão, na última sexta-feira (20). É o sexto centro de oração estabelecido pela organização americana Nasarean.org (link em inglês) — e o primeiro na Ásia Central.
Num país marcado por décadas de repressão religiosa, o santuário, estabelecido com a bênção do arcebispo de Astana, Tomasz Peta, e apoiado pelo bispo-auxiliar Athanasius Schneider, se junta a uma crescente rede internacional centrada no ícone de Nossa Senhora, Mãe dos Cristãos Perseguidos. O Cazaquistão era uma das 15 repúblicas que formavam a União Soviética.
Em sua homilia na inauguração do santuário na última sexta-feira, o bispo Schneider citou as palavras de são João Paulo II em sua visita a Astana em 2001, quando falou das “indizíveis provações” dos que sofreram “por não terem desejado renunciar à sua fé”.
Lançada em 2018, essa iniciativa convida dioceses do mundo todo a receber um ícone pintado pela freira melquita libanesa Souraya Herro, inspirado na imagem tradicional da "Mãe da Ternura". O ícone tem a inscrição em aramaico "Mãe dos Perseguidos", ligando a Igreja moderna sofredora à língua dos judeus do tempo de Cristo.
Cada santuário é inaugurado com a bênção episcopal e se torna um lar espiritual para oração e solidariedade com os cristãos que enfrentam violência, discriminação ou exílio no mundo todo.
O Cazaquistão, um país vasto e escassamente povoado, que faz fronteira com a Rússia e a China, tem um peso simbólico particular no projeto. Sob o regime comunista, foi um dos principais locais do sistema Gulag soviético, em que milhões de pessoas foram aprisionadas, entre elas vários clérigos, freiras e fiéis leigos.
Uma testemunha silenciosa, mas duradoura
A partir da década de 1930, grupos étnicos inteiros foram realocados à força para o Cazaquistão, como alemães, poloneses, ucranianos e bálticos, muitos deles católicos ou ortodoxos. A prática religiosa foi criminalizada. As igrejas foram fechadas ou readaptadas, e os sacramentos passaram a ser celebrados em segredo.
Entre os afetados estava a família do bispo Schneider, nascido em 1961, filho de católicos de etnia alemã exilados nos montes Urais. Criado na Igreja clandestina, ele frequentou liturgias clandestinas e viveu em primeira mão a experiência da resistência espiritual, legado que moldou seu compromisso pastoral e motivou seu apoio ao novo santuário.
Desde a independência em 1991, o Cazaquistão reconhece oficialmente a liberdade religiosa. Na prática, porém, essa liberdade permanece rigorosamente regulamentada. Cerca de 70% da população é muçulmana. Os cristãos, na maioria ortodoxos russos, são cerca de 26%. Os católicos são uma pequena minoria, mas mantêm uma presença ativa por meio de escolas, paróquias e ações de caridade.
Barreiras persistentes à liberdade religiosa
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Apesar dessa abertura, os cristãos no Cazaquistão, especialmente os convertidos do islamismo, continuam enfrentando dificuldades. Em sua "Lista Mundial da Perseguição" do ano passado, a Missão Portas Abertas classificou o Cazaquistão em 38º lugar entre os lugares mais difíceis para ser cristão, colocando-o próximo a outros países da Ásia Central, como o Uzbequistão e o Tajiquistão.
A associação diz que os convertidos sofrem rejeição social e familiar, abuso físico e, em alguns casos, prisão domiciliar ou casamentos forçados. As mulheres são particularmente vulneráveis em áreas rurais, sofrendo assédio, violência e até mesmo sequestro de noivas. Os homens enfrentam vigilância governamental, restrições de viagem e extorsão.
Essa dinâmica é reforçada pela restritiva “Lei da Religião” do Cazaquistão, adotada em 2011, que impõe requisitos rigorosos de registro, limita o culto público e proíbe atividades religiosas não-registradas. A Missão Portas Abertas diz que, embora as comunidades ortodoxas russas sejam amplamente poupadas de interferências, grupos católicos e protestantes que interagem com a população em geral estão sujeitos a vigilância, invasões e assédio legal.
Em 2017, a Comissão dos EUA para a Liberdade Religiosa Internacional disse que 20 indivíduos foram presos no Cazaquistão por expressarem pacificamente sua fé. Um relatório divulgado em 2018 pelo órgão de vigilância norueguês Forum 18, resumindo 15 anos de observação, descreveu o clima de liberdade religiosa no país como fundamentalmente repressivo, apesar da retórica oficial.
Uma crescente rede de oração
O ícone de Nossa Senhora, Mãe dos Cristãos Perseguidos, já foi instalado em cinco cidades ocidentais: Nova York, EUA; Londres, Reino Unido; Estocolmo, Suécia; Clinton, Massachusetts, e Lander, Wyoming, ambas nos EUA. Embora esses locais reflitam a crescente indiferença espiritual do Ocidente, o Cazaquistão é uma terra onde a opressão foi vivida e, para alguns, ainda persiste.
Em 2023, na inauguração do santuário de Estocolmo, o padre Benedict Kiely, fundador do Nasarean.org, lamentou que muitos fiéis no Ocidente ainda desconheçam a dimensão da perseguição aos cristãos em todo o mundo e tendam a se concentrar cada vez mais em questões sociais ou ambientais. "A Escritura nos diz especificamente que se uma parte do Corpo sofre, todas sofrem", disse ele ao jornal National Catholic Register, da EWTN.
Três novos santuários estão atualmente em desenvolvimento, como parte da visão do padre Kiely para uma cadeia de intercessão verdadeiramente global que conecte dioceses em todos os continentes por meio de uma única imagem e uma única intenção: oração pelos perseguidos.
No Cazaquistão, onde a fé sobreviveu ao silêncio e ao exílio, a instalação do ícone restaura uma memória há muito confinada às sombras. Ela homenageia os que permaneceram fiéis diante da repressão e estende o cuidado da Igreja aos que ainda arcam com o custo de serem discípulos de Cristo, muitas vezes na obscuridade, mas não mais sozinhos.





