Ryan Burge, um dos principais pesquisadores sobre religião e política, levantou dados que mostram o "catolicismo de cafeteria" em crescimento acelerado nos EUA. Os católicos do país discordam especialmente da doutrina da Igreja sobre aborto, eutanásia e pena de morte.

O termo "católico de cafeteria" refere-se a um católico que escolhe quais doutrinas da Igreja afirmar e aderir. O arcebispo de Washington D.C, o cardeal Wilton Gregory, usou recentemente o termo para descrever o presidente Joe Biden, que, embora se apresente publicamente como católico, defende o aborto irrestrito a qualquer momento da gravidez.

Burge descobriu que apenas 0,9% dos católicos concordam com a doutrina da Igreja em todas as três questões. Suas conclusões foram baseadas em dados de 2022 coletados pelo Global Social Survey (GSS, na sigla em inglês) e compilados pela Associação de Arquivos de Dados da Religão (ARDA, na sigla em inglês). Burge disse à CNA, agência em inglês do grupo EWTN, a que pertence ACI Digital, que 0,9% é o menor número de todos os tempos desde que o GSS começou a coletar dados em 1972.

"Não são apenas muitos católicos que discordam da doutrina da Igreja. Na verdade, se você olhar para os dados, são quase todos eles", disse Burge, que dá aulas de ciência política na Eastern Illinois University.

Isso coincide com um declínio geral de 12% na frequência à Igreja entre os católicos nas últimas duas décadas, segundo dados do instituto de pesquisa Gallup.

Aborto

“Apesar da clara doutrina da Igreja Católica de que o aborto é gravemente imoral, há claro apoio majoritário ao aborto eletivo em quase todas as circunstâncias", disse Burge.

Mais de 50% dos católicos apoiam o aborto quando a saúde da mãe está em risco, em caso de estupro, se há uma "forte chance de defeito grave no bebê" e quando a família ou a mãe não quer ou não pode sustentar outro filho.

Quase 90% dos católicos apoiam o aborto nos casos em que a saúde da mãe está em risco. Mais de 80% dos católicos apoiam o aborto em casos de estupro, e cerca de 80% dos católicos apoiam o aborto por causa de defeitos graves.

Segundo a ARDA, só 17,7% dos católicos acreditam que o aborto deve ser ilegal em todos os casos.

Eutanásia

Sobre a eutanásia, que a Igreja diz ser moralmente inaceitável, e o suicídio, que o Catecismo da Igreja Católica chama de "contrário ao amor do Deus", a maioria dos católicos mais uma vez não aceita a doutrina da Igreja.

Segundo os dados, 70% dos católicos apoiam a eutanásia, definida na pesquisa como a habilidade de uma pessoa cometer suicídio no caso de uma doença incurável. Como indicado por Burge, o apoio dos católicos à eutanásia e ao suicídio assistido vem crescendo desde a década de 1980.

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Pena de morte

Nas últimas décadas, a Igreja vem aumentando sua oposição à pena de morte. Em 2018, o Catecismo da Igreja Católica foi revisto para refletir essa oposição.

O catecismo diz que "durante muito tempo, considerou-se o recurso à pena de morte por parte da autoridade legítima, depois de um processo regular, como uma resposta adequada à gravidade de alguns delitos e um meio aceitável, ainda que extremo, para a tutela do bem comum".

"Hoje vai-se tornando cada vez mais viva a consciência de que a dignidade da pessoa não se perde, mesmo depois de ter cometido crimes gravíssimos. Além disso, difundiu-se uma nova compreensão do sentido das sanções penais por parte do Estado. Por fim, foram desenvolvidos sistemas de detenção mais eficazes, que garantem a indispensável defesa dos cidadãos sem, ao mesmo tempo, tirar definitivamente ao réu a possibilidade de se redimir”, continua o parágrafo.

O catecismo chega a citar o papa Francisco “a pena de morte é inadmissível, porque atenta contra a inviolabilidade e dignidade da pessoa”.

Apesar disso, a ARDA mostrou que 61% dos católicos são a favor da pena de morte para assassinos condenados. O apoio à pena de morte entre os católicos diminuiu nas últimas décadas, depois de atingir um máximo de 81% em 1990.

“Temos muito trabalho a fazer”

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Monsenhor Charles Pope, pároco da Igreja Santo Consolador-São Cipriano na arquidiocese de Washington e escritor católico, disse à CNA que o número de 0,9% não representa com precisão a "adesão" dos católicos à fé.

Pope chamou o estudo de "muito injusto" e disse estar "reunindo coisas que precisam ser analisadas separadamente". Ele destacou que a Igreja é clara em sua doutrina de que o aborto é intrinsecamente mau, enquanto há mais margem para opinião quando se trata da pena de morte, que ele descreveu como uma questão "prudencial" e não "doutrinária".

Ele concordou, no entanto, que ainda há uma desconexão entre a doutrina da Igreja e o que muitos católicos acreditam. Isso, segundo ele, se deve ao que chamou de "politização das questões morais".

"A política, infelizmente, está conduzindo a conversa mais do que a fé, porque somos muito mundanos em nossa visão. Então, se há uma coisa positiva a tirar deste estudo é que certamente temos muito trabalho a fazer para convencer nossos próprios fiéis de nossas doutrinas”, disse Pope.

"Temos muito trabalho a fazer, mas isso não significa que nossas doutrinas estejam erradas. Não é função da Igreja refletir as pesquisas de opinião pública do nosso povo, é função da Igreja dizer: 'Eis aqui o que Jesus diz' ".