O Dicastério para a Doutrina da Fé da Santa Sé publicou hoje (4), um comunicado em resposta aos “compreensíveis pronunciamentos de algumas Conferências Episcopais sobre o documento Fiducia supplicans” que permite bênçãos informais a casais em situação irregular e uniões homossexuais.

O objetivo declarado da nota é “ajudar a esclarecer a recepção de Fiducia supplicans, recomendando ao mesmo tempo uma leitura completa e atenta da citada Declaração para compreender melhor o significado de sua proposta”.

O texto é do prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé (DDF), cardeal Víctor Manuel Fernández, e pelo secretário da Seção Doutrinária da mesma organização, monsenhor Armando Matteo.

Estas são as seis mensagens principais contidas na nota:

1. Fiducia suppplicans não é sobre doutrina

Quanto às advertências expressas pelas diferentes conferências episcopais relativas ao conteúdo doutrinal da declaração, a DDF considera que, embora “evidenciar a necessidade de um período mais longo de reflexão pastoral”, esta “não pode ser interpretado como uma oposição doutrinal, porque o documento é claro e clássico a respeito do matrimônio e da sexualidade”.

A nota também acrescenta que “evidentemente, não há espaço para se tomar distância doutrinal desta Declaração ou para considerá-la herética, contrária à Tradição da Igreja ou blasfema”.

2. Os bispos não podem proibir as bênçãos pastorais

A nota reconhece que Fiducia suplicans “nos seus aspectos práticos” pode necessitar de tempo “para a sua aplicação, segundo os contextos locais e o discernimento de cada Bispo diocesano com a sua Diocese”.

Assim, reconhece que os bispos “têm sempre o poder do discernimento in loco, isto é, naquele lugar concreto que ele melhor que outros conhece, porque é o seu rebanho”

“A prudência e a atenção ao contexto eclesial e à cultura local poderiam admitir diversas modalidades de aplicação, mas não uma negação total ou definitiva deste caminho que é proposto aos sacerdotes”, continua.

3. Países onde “uma bênção seria imprudente”

A nota da DDF centra-se em particular na situação das nações nas quais o simples fato de declarar-se homossexual é penalizado com prisão “e em alguns casos com tortura e até morte”. Nesses casos, considera que “seria imprudente uma bênção”.

“Permanece importante, porém, que estas Conferências Episcopais não sustentem uma doutrina diferente daquela da Declaração aprovada pelo Papa, enquanto é a doutrina de sempre, mas sobretudo que proponham a necessidade do estudo e do discernimento para agir com prudência pastoral em um tal contexto”, continua o texto.

Em relação aos países que “em diversa medida condenam, proíbem e criminalizam a homossexualidade”, o Dicastério defende que “além da questão das bênçãos, existe uma tarefa pastoral de grande amplitude, que inclui formação, defesa da dignidade humana, ensinamento da Doutrina Social da Igreja e diversas estratégias que não admitem pressa”.

4. Distinguir entre bênçãos “litúrgicas” e bênçãos “pastorais”

A nota assinada pelo cardeal Fernández convida a descobrir “a verdadeira novidade” da Fiducia suplicans, que requer “um esforço generoso de recepção”, e é “o convite a distinguir duas formas diferentes de bênção: ‘litúrgicas ou ritualizadas’ e ‘espontâneas ou pastorais’”.

“Como pano de fundo, encontra-se a avaliação positiva da ‘pastoral popular’ que aparece em muitos textos do Santo Padre. Neste contexto, o Santo Padre nos convida a valorizar a fé do Povo de Deus, que mesmo em meio aos seus pecados sai da imanência e abre o seu coração para pedir a ajuda de Deus”.

“Por esta razão, mais que pela bênção a casais irregulares, o texto do Dicastério adotou a elevada forma de uma “Declaração”, que representa muito mais que um responsum ou que uma carta”, diz o texto.

Assim, defende-se que o tema central é “a compreensão mais ampla das bênçãos e a proposta de aumentar as bênçãos pastorais” e, consequentemente, “para além da polêmica, o texto requer um esforço de reflexão serena, feita com coração de pastor, livre de toda ideologia”.

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5. Características das bênçãos pastorais

A nota de resposta às reações à Fiducia supplicans dedica uma seção para responder à pergunta: “Como se apresentam concretamente estas “bênçãos pastorais”?”, da qual podem ser extraídas sete características:

1) Devem ser “muito breves”, o que implica que sejam feitas durante “poucos segundos, sem uso do Ritual de Bênçãos”.

2) “Se se aproximam juntas duas pessoas para pedi-la, simplesmente implora-se ao Senhor paz, saúde e outros bens para estas duas pessoas que as pedem”.

3) A bênção pastoral deve incluir um pedido para que “possam viver o Evangelho de Cristo em plena fidelidade” e que o Espírito Santo “as livre de tudo que não corresponde à vontade divina e de tudo que requer purificação”.

4) Esta forma de bênção “não pretende justificar algo que não seja moralmente aceitável”. Também não é “um matrimônio, nem mesmo uma ‘aprovação’, nem a ratificação de coisa alguma. É unicamente a resposta de um pastor a duas pessoas que pedem a ajuda de Deus”, por isso o sacerdote “não põe condições nem quer conhecer a vida íntima dessas pessoas”.

5) A nota explicativa dá um exemplo concreto de um casal de “divorciados em nova união” que pede ao padre no meio de uma grande peregrinação: “Por favor, nos dê uma bênção, não conseguimos encontrar trabalho, ele está muito doente, não temos uma casa, a vida está se tornando muito pesada: que Deus nos ajude!” Assim, propõe-se uma oração: “Senhor, olha estes teus filhos, concede-lhes saúde, trabalho, paz e ajuda recíproca. Livra-os de tudo aquilo que contradiz o teu Evangelho e concede-lhes viver segundo a tua vontade. Amém». E conclui com o sinal da cruz sobre cada um deles”.

6) Para evitar confusão com o sacramento do matrimônio ou com as cerimônias de união civil, além de não usar roupas que possam induzir essa ideia, ressalta-se que a bênção pastoral “não deve acontecer num lugar importante do edifício sacro ou diante do altar, porque isto causaria confusão”.

7) Cada bispo na sua diocese é autorizado pela Declaração Fiducia supplicans a ativar este tipo de bênçãos simples “com todas as recomendações de prudência e de atenção”. Isto implica que “em nenhum modo é autorizado a propor ou a ativar bênçãos que possam assemelhar-se a um rito litúrgico”.

6. Catequese para “libertar-nos do medo”

O último ponto da nota do DDC em resposta aos bispos e conferências episcopais que expressaram relutância sobre o seu conteúdo ou aplicação doutrinária, é dedicado a expressar a necessidade de implementar “uma catequese que ajude a todos a entender que este tipo de bênção não é uma ratificação da vida que levam aqueles que a imploram. Menos ainda é uma absolvição, enquanto estes gestos estão longe de ser um sacramento ou um rito”.

“Deveremos habituar-nos todos a aceitar o fato que, se um sacerdote dá este tipo de bênçãos simples, não é um herético, não ratifica nada, não está negando a doutrina católica”.

Esta catequese ajudará, segundo o DDC, “o Povo de Deus a descobrir que este tipo de bênção é um simples canal pastoral que ajuda as pessoas a manifestar a própria fé, ainda que sejam grandes pecadores”.

“Não as estamos consagrando, nem nos estamos congratulando com elas, nem estamos aprovando o seu modo de união”, destaca.

“Se isto é esclarecido graças a uma boa catequese, podemos livrar-nos do medo de que nossas bênçãos exprimam algo de inadequado”, conclui.