Na manhã de hoje (1), o papa Francisco celebrou uma missa na basílica de São Pedro pela solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus.

A seguir, a homilia completa do papa Francisco:

As palavras do apóstolo Paulo iluminam o início do novo ano: «Quando chegou a plenitude do tempo, Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher» (Gal 4, 4). Impressiona a expressão «plenitude do tempo». Antigamente era costume medir o tempo esvaziando e enchendo ânforas: quando estavam vazias, começava um novo período de tempo, que terminava quando estivessem cheias. Vemos nisto a plenitude do tempo: quando a ânfora da história está cheia, a graça divina transborda. Deus faz-Se homem e faz-Se através de uma mulher, Maria. Ela é o caminho escolhido por Deus; Ela é o ponto de chegada de muitas pessoas e gerações que, «gota a gota», prepararam a vinda do Senhor ao mundo. Deste modo a Mãe está no coração do tempo: aprouve a Deus fazer a viragem da história através d’Ela, a mulher. Com esta palavra, a Escritura remete-nos para as origens, para a génese, e sugere-nos que a Mãe com o Menino assinala uma nova criação, um novo início. Portanto, no início do tempo da salvação, temos a Santa Mãe de Deus, a nossa Mãe santa.

Assim é bom que o ano se abra com a invocação d’Ela; é bom que o povo fiel, como outrora em Éfeso (eram corajosos, aqueles cristãos!), proclame com alegria a Santa Mãe de Deus. De facto, as palavras Mãe de Deus exprimem a feliz certeza de que o Senhor, terno Menino nos braços da Mãe, Se uniu para sempre à nossa humanidade, de tal modo que esta já não é só nossa, mas d’Ele. Mãe de Deus: poucas palavras para confessar a aliança eterna do Senhor connosco. Mãe de Deus, um dogma de fé, mas é também um «dogma de esperança»: Deus no homem e o homem em Deus, para sempre. A Santa Mãe de Deus.

Na plenitude do tempo, o Pai enviou o seu Filho nascido de uma mulher; o texto de São Paulo, porém, acrescenta um segundo envio: «Deus enviou aos nossos corações o Espírito do seu Filho, que clama: “Abbá! – Pai!”» (Gal 4, 6). E a Mãe, também no envio do Espírito, é protagonista: o Espírito Santo pousa sobre Ela na Anunciação (cf. Lc 1, 35); depois, nos primórdios da Igreja, desce sobre os Apóstolos reunidos em oração «com Maria, a Mãe» (At 1, 14). Assim, o acolhimento de Maria trouxe-nos os dons maiores: «tornou o Senhor de majestade nosso irmão» (Tomás de Celano, Vita seconda, CL, 198: FF 786) e possibilitou ao Espírito gritar nos nossos corações: «Abbá – Papá». A maternidade de Maria é o caminho para encontrar a ternura paterna de Deus, o caminho mais próximo, mais direto, mais fácil. Este é o estilo de Deus: proximidade, compaixão e ternura. Com efeito, é a Mãe que nos conduz ao início e ao coração da fé; esta não é uma teoria nem um empenho pessoal, mas um dom imenso, que nos faz filhos amados, moradas do amor do Pai. Por isso, acolher na própria vida a Mãe, não é uma decisão de mera devoção; é uma exigência de fé: «Se queremos ser cristãos, devemos ser marianos» (S. Paulo VI, Homilia em Cagliari, 24/IV/1970), isto é, filhos de Maria.

A Igreja precisa de Maria para descobrir o seu próprio rosto feminino: para se assemelhar ainda mais a Ela que, como mulher Virgem e Mãe, representa o seu modelo e figura perfeita (cf. Lumen gentium, 63); para abrir espaço às mulheres e ser geradora através duma pastoral feita de cuidado e solicitude, paciência e coragem materna. Mas, o próprio mundo precisa de olhar para as mães e as mulheres a fim de encontrar a paz, escapar das espirais da violência e do ódio, voltar a ter um olhar humano e um coração que vê. E toda a sociedade precisa de acolher o dom da mulher, de cada mulher: respeitá-la, protegê-la, valorizá-la, sabendo que, quem fere ainda que seja uma única mulher, profana Deus, nascido de mulher.

Maria, a mulher, assim como é decisiva na plenitude do tempo, também o é para a vida de cada um; porque ninguém melhor do que a Mãe conhece os tempos e as urgências dos filhos. Demonstra-no-lo mais uma vez um «início»: o primeiro sinal realizado por Jesus, nas bodas de Caná. Lá, é precisamente Maria que Se apercebe da falta do vinho e assinala o caso ao Filho (cf. Jo 2, 3). São as carências dos filhos que A movem a Ela, a Mãe, a instigar Jesus a intervir. E, em Caná, Jesus diz: «“Enchei as vasilhas de água”. Eles encheram-nas até acima» (Jo 2, 7-8). Maria, que conhece as nossas necessidades, apressa também o transbordamento da graça para nós e leva as nossas vidas rumo à plenitude. Irmãos, irmãs, todos nós temos falhas, solidões, vazios que pedem para ser preenchidos. Cada um de nós conhece os seus. Quem poderá preenchê-los senão Maria, Mãe da plenitude? Quando sentirmos a tentação de nos fecharmos em nós mesmos, acorramos a Ela; quando não conseguirmos desembaraçar-nos por entre os nós da vida, procuremos refúgio n’Ela. Os nossos tempos, vazios de paz, precisam duma Mãe que congregue a família humana. Fixemos Maria para nos tornarmos construtores de unidade, fazendo-o com a sua criatividade de Mãe, que cuida dos filhos: reúne-os e conforta-os, escuta as suas penas e enxuga as suas lágrimas. Olhemos aquele ícone tão terno da Virgo lactans [da Abadia de Montevergine]! A Mãe é assim: com quanta ternura cuida de nós e permanece junto de nós. Cuida de nós e permanece ao nosso lado.

Confiemos o novo ano à Mãe de Deus. Consagremos-Lhe as nossas vidas. Ela saberá, com ternura, apontar-nos a sua plenitude; com efeito, levar-nos-á a Jesus, e Jesus é a plenitude do tempo, de cada tempo, do nosso tempo, do tempo de cada um de nós. De facto – como escreveu alguém – «não foi a plenitude dos tempos que fez com que o Filho de Deus fosse enviado, mas, ao invés, foi o envio do Filho que fez jorrar a plenitude dos tempos» (cf. M. Lutero, Vorlesung über den Galaterbrief, 1516-1517, 18). Irmãos e irmãs, que este ano seja cheio da consolação do Senhor! Que este ano seja repleto da ternura materna de Maria, a Santa Mãe de Deus.

E agora convido-vos a aclamar, todos juntos, três vezes «Santa Mãe de Deus!» Juntos: Santa Mãe de Deus! Santa Mãe de Deus! Santa Mãe de Deus!