A declaração da Santa Sé sobre a bênção de “uniões homossexuais” e casais em “situações irregulares” não muda a doutrina da Igreja de que o casamento é entre um homem e uma mulher, disse a Conferência dos Bispos Católicos dos Estados Unidos (USCCB, na sigla em inglês).


O Dicastério para a Doutrina da Fé publicou ontem (18) a declaração Fiducia supplicans, que autoriza padres a abençoar uniões homossexuais. A declaração diz que tais bênçãos não podem ser realizadas de forma a parecer um casamento, e traça uma distinção entre bênção pastoral e bênção sacramental.


“A [declaração] articulou uma distinção entre bênçãos litúrgicas (sacramentais) e bênçãos pastorais, que podem ser dadas a pessoas que desejam a graça amorosa de Deus em suas vidas”, disse ontem (18) Chieko Noguchi, diretora executiva de assuntos públicos da USCCB, em comunicado. 

“A doutrina da Igreja sobre o casamento não mudou, e esta declaração afirma isso, ao mesmo tempo que faz um esforço para acompanhar as pessoas através da transmissão de bênçãos pastorais, porque cada um de nós precisa do amor curador e da misericórdia de Deus nas nossas vidas”, acrescentou Noguchi.


A declaração Fiducia Supplicans afirma que a Igreja não pode permitir uma bênção litúrgica para uniões homossexuais porque isso “ofereceria uma forma de legitimidade moral a uma união que presume ser um casamento ou a uma prática sexual extraconjugal”.


No entanto, a declaração afirma que a proibição das bênçãos litúrgicas não impede os sacerdotes de oferecerem bênçãos pastorais “espontâneas”, que são “destinadas a todos”. Acrescenta que tais bênçãos são para aqueles que “não reivindicam uma legitimação de seu próprio status, mas que imploram que tudo o que é verdadeiro, bom e humanamente válido em suas vidas e em seus relacionamentos seja enriquecido, curado e elevado pela presença do Espírito Santo."


O documento enfatiza que tais bênçãos pastorais “espontâneas” “não devem se tornar um ato litúrgico ou semilitúrgico” e “nunca devem ser concedidas ao mesmo tempo com as cerimônias de uma união civil, e nem mesmo em conexão com elas” e não podem “ser realizada com quaisquer roupas, gestos ou palavras próprias de um casamento”.

Segundo a declaração, assinada pelo prefeito do Dicastério da Doutrina da Fé, o cardeal argentino Victor Manuel “Tucho” Fernández, a distinção, “baseada na visão pastoral do papa Francisco, implica um verdadeiro desenvolvimento em relação a quanto já foi dito sobre bênçãos no Magistério e nos textos oficiais da Igreja”.

De fato, o documento não cita a Escritura nem a doutrina consagrada no Catecismo da Igreja Católica. Das 31 referências apontadas em notas de rodapé, 20 são de escritos do próprio papa Francisco.

O diretor executivo de The Catholic Project da Universidade Católica da América, Stephen P. White, disse à CNA, agência em inglês do grupo EWTN, que a declaração, em última análise, reconhece que “Deus não abençoa e não pode abençoar o pecado; mas ele pode e muitas vezes abençoa os pecadores, especialmente quando eles lhe pedem a graça de crescer em santidade”.


White acrescentou que “o Dicastério para a Doutrina da Fé alertou repetidamente sobre a necessidade de evitar escândalos e confusão”, mas que “quaisquer esperanças de evitar tal confusão e escândalo parecem ter evaporado quase instantaneamente após a publicação do documento”.


“Isto era totalmente previsível: desde a cobertura extremamente enganosa da imprensa, ao triunfalismo dos defensores da eliminação dos ensinamentos da Igreja sobre sexo e casamento, à insistência de certos setores da Igreja de que agora são livres para fazer precisamente o que o decreto proíbe", observou White. 


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Nos últimos anos, padres na Alemanha e na Bélgica têm desafiado a proibição de abençoar uniões homossexuais. Muitas dessas bênçãos ainda parecem violar as novas diretrizes da Santa Sé por terem as características de bênçãos sacramentais, distinção introduzida pelo novo documento. 

Tanto na Bélgica como na Alemanha, bispos têm avançado bênçãos de estilo litúrgico para indivíduos em uniões homossexuais. A diocese de Flandres, na Bélgica, aprovou uma liturgia para abençoar uniões homossexuais e o Caminho Sinodal Alemão. Ambas estas práticas parecem ainda estar em conflito com as diretrizes da Santa Sé.

O padre jesuíta americano James Martin elogiou a declaração. Martin é o autor do livro Construindo uma Ponte: Como a Igreja Católica e a Comunidade LGBT Podem Entrar em uma Relação de Respeito, Compaixão e Sensibilidade.

“A declaração abre a porta para bênçãos não litúrgicas para uniões homossexuais, algo que antes estava fora dos limites para bispos, padres e diáconos”, Martin disse em uma postagem no X, ex-Twitter. “Junto com muitos padres, terei agora o prazer de abençoar os meus amigos em uniões homossexuais”.

Martin se referiu à nova declaração como uma “mudança acentuada” de uma nota explicativa de 2021 em uma Resposta da Congregação para a Doutrina da Fé, que disse que a Igreja “não abençoa e não pode abençoar o pecado” quando questionada sobre as bênçãos das uniões homossexuais. Tanto o documento de 2021 quanto o recente documento de 2023 afirmam terem sido aprovados pelo papa Francisco.

Em resposta a Martin, o padre Ronald Vierling postou no X: “o objetivo da prática pastoral autêntica é a conversão dos pecadores”. “A pastoral deve estar subordinada à imitação de Cristo Bom Pastor, cujo apelo consistente e inabalável é ao arrependimento e à conversão da vida”.