Está em análise na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 998/23, que considera crime de tortura constranger alguém a não abortar ou retardar, dificultar ou impedir a interrupção da gravidez nos casos em que a pena não é aplicada ao crime.

O aborto no Brasil só não acarreta pena em três casos. O artigo 128. Do Código Penal estabelece que “não se pune o aborto praticado por médico” (...) “se não há outro meio de salvar a vida da gestante” ou “se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal”.

O Supremo Tribunal estendeu, em 2012, essa impunidade ao aborto de bebê portador de anencefalia.

A proposta é de autoria da deputada federal Sâmia Bomfim (Psol-SP) e pede a alteração na Lei nº 9.455, de 7 de abril de 1997, que define os crimes de tortura, a fim de prever a motivação do crime de tortura em razão de gênero, bem como criar o tipo penal de impedimento de realização de aborto legal.

Em sua justificativa, Sâmia diz que a legislação brasileira é “bastante restritiva no que tange ao direito da mulher interromper a gravidez”, e destaca “que não são raros os casos em que pessoas agem deliberadamente para impedir o livre exercício deste direito” e menciona o caso de uma menina de onze anos, moradora de Tijucas (SC), que ficou grávida após suposto estupro e foi recolhida em um abrigo por ordem da juíza Joana Ribeiro Zimmer em 1º de junho de 2022. A juíza não havia autorizado o aborto porque a menina já havia passado da 22ª semana de gravidez, data limite prevista por lei e recomendada pela Organização Mundial de Saúde.

“Diante desta odiosa decisão que tratou uma criança vítima de estupro como mera incubadora do feto que trazia consigo, a criança foi arrancada do seu núcleo familiar e colocada em um abrigo com o escopo de inviabilizar o exercício de seu direito de interromper a gravidez resultante do crime de estupro”, escreveu Bonfim, sobre a ação da juíza Zimmer.

A menina havia sido engravidada por um menor de 11 anos, mas a legislação define como estupro presumido qualquer relação sexual anterior à idade de consentimento, que é de 14 anos no Brasil.

O processo corria em segredo de justiça, mas, com o vazamento da informação, houve grande pressão para que o aborto fosse feito. No dia 22 de junho, a menina que estava grávida de 29 semanas foi submetida ao procedimento.

Ainda no texto da proposta, a deputada aponta uma nota técnica feita pela Rede Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Reprodutivos, no qual, 252.786 meninas foram mães entre 2010 a 2019 e diz que isso “demonstra de maneira inconteste que o Estado brasileiro age deliberadamente para impedir o exercício do aborto seguro, posto que toda gravidez de uma criança menor de 14 anos é decorrente de um estupro de vulnerável, haja vista a tenra idade fazer presumir a violência do ato sexual”.

“O Estado brasileiro não pode agir de forma a revitimizar mulheres vítimas de violência criando entraves para o exercício do aborto nas hipóteses previstas pelo ordenamento jurídico, motivo pelo qual se faz necessária a previsão de impedimento do exercício de um direito como uma forma de tortura”, relatou a deputada pró-aborto.

A PL será analisada pelas comissões de Defesa dos Direitos da Mulher e de Constituição e Justiça e de Cidadania e depois vai ao Plenário. E está aguardando a designação de relator na Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher (CMULHER).

 

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