“Reconhecemos e apresentamos, a cada um e a cada uma daqueles e daquelas que sofreram estes abusos em ambiente eclesial, um profundo, sincero e humilde pedido de perdão, em nome da Igreja, na qual eles confiaram e onde sofreram tão injusta e perturbadora violência”, disse hoje (20) o presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), dom José Ornelas, no início da missa celebrada na basílica da Santíssima Trindade, em Fátima.

A celebração se insere na jornada nacional de oração pelas vítimas de abusos sexuais, de poder e de consciência na Igreja, convocada pela CEP para hoje. Também coincide com o encerramento da Assembleia Plenária da CEP, que teve início na segunda-feira (17).

Os abusos sexuais de menores e adultos vulneráveis tem sido um tema constante na CEP desde a divulgação, em fevereiro, do relatório final da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica em Portugal. Segundo este documento, há pelo menos 4815 vítimas no país, de 1950 a 2022.

No início da missa em Fátima, dom Ornelas reconheceu que “estes comportamentos são exatamente o inverso daquilo que somos e que celebramos”. “Por isso, imploramos o perdão de Deus que pediu aos seus discípulos que fossem misericordiosos e cuidadores, particularmente para com os mais pequenos e frágeis”, disse.

Para o presidente da CEP, os abusos são “comportamentos completamente iníquos, cruéis e manipuladores, por vezes disfarçados de atenção, afeto e até de motivação religiosa”.

“Como Igreja que somos assumimos a dor, a perturbação e a revolta dessas pessoas, tanto das que tiveram a coragem dolorosa de reagir e denunciar, como daquelas que se calam, ainda na incapacidade de falar dessa realidade que lhes barrou o caminho de uma vida mais feliz”, disse.

Dom Ornelas também reconheceu que, “em muitas ocasiões”, a Igreja Católica e seus responsáveis falharam na missão de “evitar estes abusos e para lidar com a gravidade das ofensas que foram feitas”.

O bispo pediu perdão a Deus e suplicou “o dom do Seu Espírito criador para que possamos construir e reconstruir, a nível pessoal e como Igreja, um caminho de verdadeira vida, segundo o Coração manso e humilde de Jesus, nosso Senhor e nosso Mestre”.

Em sua homilia, dom José Ornelas defendeu um compromisso de “tolerância zero” para com os abusos. “A nossa Igreja não pode voltar atrás neste caminho, não deve e não vai voltar: é mesmo preciso estar ao lado dos mais pequenos, dos mais esquecidos”, disse, destacando a necessidade de dar prioridade a quem “sofre esta devastadora realidade”.

“Não se pode passar ao lado nem encobrir, por comodidade ou conivência. Não se pode pactuar com situações e atitudes que comprometam, deste modo, a vida de pessoas inocentes”, declarou. Ao contrário, disse, é preciso “acolher, acompanhar, sarar feridas, criar futuro na verdadeira liberdade e na esperança”.

Para dom Ornelas, a atenção às vítimas está acima de “qualquer interesse dito estratégico, corporativo, estatal, espiritual ou religioso”. E é a “atitude de humildade” que “permite colocar os que sofrem como prioridade do nosso agir e não a nós próprios, do nosso grupo ou mesmo do bom nome da Igreja”, disse.

O presidente da CEP destacou que o trabalho de atenção às vítimas “entra agora numa nova fase”. Segundo ele, estão sendo criadas “condições para que esse encontro seguro e transformador seja possível”.

Em seu discurso de aberta da Assembleia da CEP na segunda-feira (17), dom Ornelas adiantou que será criado um Grupo de Acompanhamento, com “a autonomia necessária para acolher e acompanhar as vítimas e para assegurar o necessário apoio e a possível recuperação dos danos por estas sofridos, dispondo de uma linha de atendimento e de condições para o contato e acompanhamento pessoal”.

Comunidades paroquiais e religiosas rezam pelas vítimas

A CEP convidou todas as comunidades paroquiais e religiosas de Portugal a participar da jornada nacional de oração pelas vítimas de abusos sexuais, de poder e de consciência na Igreja. Para isso, enviou uma proposta de oração universal, a ser rezada nas missas de hoje.

Uma das intenções pede “pelas pessoas que foram vítimas de qualquer espécie de abusos, para que encontrem em Cristo ressuscitado a cura das suas feridas e a coragem para uma vida nova”. Também se deve rezar “pelos familiares e amigos que acompanham as vítimas de abusos, para que sejam uma presença de conforto e de ambiente seguro, e ajudem na recuperação da dignidade humana”.

Por fim, a oração após as preces pede a Deus que “concedei-nos tempos de purificação e de reparação”.

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