O padre Rafael Bermúdez, nicaraguense exilado nos EUA, disse que se o papa Francisco tivesse falado mais duramente sobre a perseguição à Igreja na Nicarágua as turbas de apoiadores do governo teriam se “lançado sobre os templos naquele mesmo domingo”.

Rafael Bermúdez está exilado nos EUA desde 2018, ano em que o regime de Daniel Ortega, ex-líder guerrilheiro de esquerda que soma 29 anos no poder, aumentou a perseguição à Igreja Católica em retaliação às declarações de padres e bispos sobre a crise do país.

Em entrevista ao meio colombiano Notícias Caracol, o padre respondeu a uma pergunta sobre as palavras que o papa Francisco disse no domingo (21) sobre a situação na Nicarágua, onde vários padres estão presos num presídio famoso como centro de tortura e o bispo de Matagalpa, dom Rolando Álvarez, está em prisão domiciliar.

No domingo (21) o papa disse que acompanha de perto "com preocupação e tristeza a situação que se criou na Nicarágua, que envolve pessoas e instituições". Ele disse ter esperança de que "por meio de um diálogo aberto e sincero, se possam encontrar as bases para uma convivência respeitosa e pacífica",

"É complexo", disse Bermúdez. “Quando digo complexo, é porque o sentimento da opinião popular é que o papa não só atrasou, mas também não disse o que as pessoas esperavam, mas é muito complexo, porque nos lembra que de certa forma não há relação concreta” da Santa Sé “com a ditadura”.

O padre observou que, em março de 2022, Ortega expulsou o núncio apostólico, dom Waldemar Stanislaw Sommertag. "A partir daí, não há nenhuma pessoa oficialmente da Santa Sé" no país, disse ele.

“O papa lembrou que o meio, o mecanismo que a Igreja sempre usa é o diálogo; mas aqui vem a parte dolorosa: o diálogo é impossível. Por qual razão? O papa o explicou: não há condições, e qual é a condição principal, que haja convivência humana”, disse Bermúdez. "Não temos convivência" porque "a ditadura não permite".

“Se eles são intolerantes, dominam, matam, perseguem, aprisionam, então não há condições” para um diálogo, disse.

“Se o papa falasse, se falasse pelo menos como eu falo, o que teria acontecido naquele mesmo dia? (...) O que teria acontecido? Bem, todas as turbas deles, todos os paramilitares, provavelmente teriam se lançado aos templos naquele mesmo domingo, atacando a população e as próprias estruturas físicas, atacando os padres”, disse.

"Não consigo imaginar todas as coisas que fazem, porque basta um sinal e agem com toda a raiva e agressividade possível", acrescentou.

Na entrevista a Notícias Caracol, o padre Bermúdez também falou sobre a ausência da Colômbia, por ordem do presidente Gustavo Petro, na reunião da Organização dos Estados Americanos (OEA) que condenou a perseguição à Igreja na Nicarágua.

"Não me surpreende, porque eles [Ortega e Petro] são da mesma linha", disse o padre

Petro foi membro da extinta guerrilha M-19, é presidente da Colômbia desde 7 de agosto.

Bermúdez disse ainda que "infelizmente" os povos "não se olham no espelho alheio" e que "há muitos países que estão tomando a linha da esquerda, dos populistas, daqueles que sabem usar a via democrática para alcançar o poder”. "Agora temos vocês com o senhor Petro", disse ele.

Sobre a Nicarágua, o padre disse que o governo nicaraguense persegue a Igreja Católica porque “quer que ela se submeta e isso não é possível, porque estamos aqui para servir e obedecer a Deus”.

Na Nicarágua “é um problema grave cumprir o Evangelho, que nos convida a fazer obras de caridade, de misericórdia”, mas os membros da ditadura sandinista “querem que só eles apareçam como os que fazem as coisas”.

"O problema é que eles não fazem e têm capacidade para fazê-lo, porque tudo o que fazem é populismo", disse.

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