São Crispín de Viterbo (1668-1750)

19 do novembro

Por Julio Micó, o.f.m.cap.

Apesar de que me considerarem um santo alegre, a impressão que fica de minha infância é a morte de meu pai, Ubaldo. Pelo menos meu tio Francisco -seu irmão- gostava muito de mim e me enviou, primeiro, à escola dos Jesuítas para que aprendesse gramática e, depois, acolheu-me como aprendiz em sua oficina de sapateiro, onde estive até os 25 anos quando fui aos frades.

Recordo que, de pequeno, gostava de ajudar nas missas e jejuar; e como era naturalmente magricelo e doentio, meu tio estava acostumado a dizer a minha mãe: «Você serve para criar frangos, mas não filhos. Não vê que o menino não cresce porque não come?» E depois disso ele se encarregava de fazer com que eu comesse; mas ao ver que seguia igualmente pequeno e muito fraco se deu por vencido e disse a minha mãe: «Deixa-o que faça o que quer, porque melhor será ter em casa um santo magro que um pecador gordo».

Capuchinho como São Félix

A gota que encheu o copo para que me decidisse a tornar-me Capuchinho foi ver um grupo de noviços que tinha descido à igreja por motivo de umas intercessões para pedir chuva; mas em realidade já havia pensado muito e tinha lido e relido a Regra de São Francisco, por isso minha opção era madura. Além disso, não queria ser sacerdote, mas sim como São Félix de Cantalicio, irmão laico.

Imediatamente fui falar com o Provincial, quem me admitiu na Ordem, pensando que já estava tudo superado, mas não foi assim. Os primeiros que se opuseram foram meus familiares, começando por minha mãe. A pobre já era idosa e com uma filha solteira a seu cargo; além disso, não compreendia que, fazendo os estudos com os Jesuítas, não queria ser sacerdote, mas sim laico. Entretanto, a decisão estava tomada. Procurei que umas pessoas do povoado as ajudassem e fui para o noviciado.

Qual não seria minha surpresa ao comprovar que, apesar de me haver admitido o Provincial, o mestre de noviços se negava a me receber. Diante de minha insistência me respondeu: «Bom, se ao Provincial lhe compete receber os noviços, me toca prová-los».

E bem que me provou. O primeiro que fez foi me dar uma enxada e me enviar à horta para cavar manhã e tarde. Já que resistia, mandou-me como ajudante do responsável pelas doações para que carregasse a provisão, para ver se agüentava as caminhadas sob o sol e a chuva. E as agüentei. Por último, não lhe ocorreu outra coisa que me nomear enfermeiro para que atendesse a um frade tuberculoso. Parece que não o fiz do todo mal, pois tanto o doente como o mestre de noviços se vangloriavam, quando já eram velhos, de me haver tido como enfermeiro e como noviço.

Uma vez que professei me enviaram por distintos conventos, até que ingressei no Orvieto. Ali estive durante quarenta anos como responsável pelas doações; quer dizer, toda minha vida, pois só me levaram a Roma para morrer.

Durante os cinqüenta anos que estive com os frades fiz de tudo menos de sapateiro, que era minha profissão. Fui cozinheiro, enfermeiro, cuidava da horta e responsável pelas doações; e eu não era uma besta para estar na sombra, mas sim ao fogo e ao sol; quer dizer, que devia estar ou na cozinha ou no pomar. Entretanto a maior parte de minha vida se queimou procurando comida para os frades e atendendo as necessidades das pessoas.

Pedindo pão e dando carinho

O primeiro que fazia antes de sair do convento era cantar o Ave, Maris Stella; depois, terço na mão, dirigia-me à esmola, que, de ordinário, estava acostumado a fazer logo. Para economizar tempo perguntava antes ao cozinheiro o que necessitava, e assim me limitava a pedir somente o necessário.

Como havia muitos pobres, procurava dirigir as esmolas que sobravam a uma casa do povoado para que dali fosse redistribuído; assim satisfazia a solidariedade dos ricos e a necessidade dos pobres.

Tão convencido estava de que grande parte da miséria provém da injustiça, que não podia me conter diante dos abusos dos patrões para com os trabalhadores. Quando algum tinha que vir ao convento procurava que o tratassem bem, porque ao trabalho terá que ir de boa vontade.

Uma vez que um estelionatário me pediu que rogasse por sua saúde, respondi-lhe que quando pagasse o que devia a seus credores e a seus servos então pediria a Virgem que o curasse. Eu gostava de visitar os doentes e encarcerados; não só para lhes dar bons conselhos, mas também para lhes remediar, na medida de minhas possibilidades, suas necessidades.

Não sei por que, as pessoas iam a mim em busca de remédios e se iam embora com a sensação de que fazia milagres. Inclusive me cortavam pedaços do manto para fazer relíquias; até que não pude mais e lhes gritei: «Mas o que fazem? Quanto melhor seria que lhe cortasse a cauda a um cão... Estão loucos? Tanto alvoroço por um asno que passa!»

Entretanto nem tudo era pedir esmola e atender às pessoas. Isto era a conseqüência. Minha opção tinha sido seguir a Jesus e isso após muito tempo de estar com ele e aprender suas atitudes. Minha devoção à Virgem ajudou muito. Eu gostava de exteriorizar meus sentimentos para com ela adornando seus altares. Quando estive trabalhando na horta coloquei uma imagem da María em uma pequena cabana. Diante dela pulverizava restos de sementes e migalhas de pão para que se aproximassem os pássaros, para alimentarem-se e cantarem, já que tivesse querido que todas as criaturas do universo se juntassem para elogiar em todo momento à mãe de Deus.

O reumatismo e a gota acabaram comigo. Já não podia quase andar e tive que me retirar à enfermaria de Roma. Mas ali também as pessoas vinham me procurar. Por que as pessoas iam a mim se não era nem santo nem profeta?

No mês de maio a enfermidade piorou. Para não estragar a festa de São Félix, assegurei ao enfermeiro que não morreria nem no dia 17 nem no dia 18. E, efetivamente, o Senhor me escutou e me levou em sua companhia em 19 de maio de 1750.

[O Propagador das Três Ave-Marias (Revista Mariana dos Capuchinhos, Valência), N. 818, maio-junho de 1999, pp. 7-9]

FONTE: Santoral Franciscano

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