Em uma sociedade cada vez mais politicamente correta, que não valoriza os idosos, somos chamados a perceber que a transmissão da fé precisa do testemunho de uma história vivida, porque senão "dificilmente pode levar a escolher o amor para sempre, a fidelidade à palavra dada, a perseverança na dedicação, a compaixão pelos rostos feridos e desanimados”, disse o papa na audiência geral de hoje (23).

O papa Francisco continuou o ciclo de catequeses dedicadas à velhice, e falou hoje sobre o Cântico de Moisés, que o patriarca pronunciou aos 120 anos, com uma vitalidade do olhar que segundo o papa Francisco "é um dom precioso: permite-lhe transmitir a herança da sua longa experiência de vida e de fé, com a necessária lucidez".

Segundo o papa “uma velhice à qual é concedida esta lucidez é um dom precioso para a geração que há de vir. A escuta pessoal e direta da narração da história de fé vivida, com todos os seus altos e baixos, é insubstituível”.

Para o papa Francisco, falta a verdadeira tradição, a vida vivida, pensa-se até que o velho deve ser descartado. No entanto, "a narração direta, de pessoa a pessoa, tem tons e modos de comunicação que nenhum outro meio pode substituir".

“Posso dar um testemunho pessoal. Aprendi o ódio e a raiva pela guerra com o meu avô, que combateu no Piave em 1914. E isto não se aprende nos livros, nem de outra forma; aprende-se assim, transmitindo-o dos avós aos netos. Hoje, infelizmente, não é assim, e pensa-se que os avós são material descartável: não! São a memória viva de um povo”, diz o papa.

“Um idoso que viveu muito tempo, e recebe o dom de um testemunho lúcido e apaixonado da sua história, é uma bênção insubstituível”, mas hoje "na nossa cultura, tão politicamente correta, este caminho parece ser impedido de muitas maneiras: na família, na sociedade, na própria comunidade cristã. Alguns até propõem a abolição do ensino da história, como informação supérflua sobre mundos que já não são atuais, que tira recursos ao conhecimento do presente”.

A falta de história vivida também falta na transmissão da fé, diz o papa Francisco, destacando que “as histórias da vida devem ser transformadas em testemunho, e o testemunho deve ser leal.”.

“Não é certamente leal a ideologia que limita a história aos próprios esquemas; não é leal a propaganda que adapta a história à promoção do próprio grupo; não é leal fazer da história um tribunal no qual se condena todo o passado, desencorajando-se qualquer futuro.”

O papa elogia a honestidade dos Evangelhos, que não escondem "os erros, os desentendimentos e até as traições dos discípulos", e destaca que este "é o dom da memória que os ‘anciãos’ da Igreja transmitem, desde o início, passando-o ‘de mão em mão’ à geração seguinte".

O papa fala sobre a "estranha anomalia" que acontece hoje na transmissão da fé. O catecismo da iniciação cristã inspira-se generosamente na Palavra de Deus e transmite informações exatas sobre os dogmas, a moral da fé e os sacramentos. No entanto, muitas vezes falta um conhecimento da Igreja que derive da escuta e do testemunho da história real da fé e da vida da comunidade eclesial, desde o princípio até aos dias de hoje”.

Então, as crianças aprendem sobre a palavra de Deus nas aulas de catequese, "mas quando se é jovem ‘aprende-se’ a Igreja nas salas de aula e nos meios de comunicação da informação global".

Por isso, o papa destaca que "a narração da história da fé deveria ser como o Cântico de Moisés, como o testemunho dos Evangelhos e dos Atos dos Apóstolos. Ou seja, uma história capaz de evocar com emoção as bênçãos de Deus e com lealdade as nossas falhas”.

Por fim, o papa disse que “seria bom se, desde o início, nos itinerários de catequese houvesse também o hábito de ouvir, da experiência vivida pelos idosos, a lúcida confissão das bênçãos recebidas de Deus, que devemos preservar, e o testemunho leal das nossas faltas de fidelidade, que devemos reparar e corrigir”.

E isto porque "os idosos entram na terra prometida, que Deus deseja para cada geração, quando oferecem aos jovens a bonita iniciação do seu testemunho e transmitem a história da fé, a fé em dialeto, em dialeto familiar, naquele dialeto que passa dos idosos para os jovens. Assim, guiados pelo Senhor Jesus, idosos e jovens entram juntos no seu Reino de vida e de amor", concluiu Francisco.

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