O papa Francisco criticou a "tagarelice" que levou o arcebispo de Paris, dom Michel Aupetit a renunciar. Renúncia, explicou o papa, que aceitou "não no altar da verdade, mas no da hipocrisia". O papa fez a crítica durante a entrevista coletiva a bordo do avião que o trouxe de volta da viagem ao Chipre e à Grécia hoje.

Foram Cinco perguntas em cerca de quarenta minutos de conversa com jornalistas que Francisco, a exemplo de são João Paulo II, chamou de "companheiros de viagem".

A notícia de que o Papa havia aceitado a renúncia do arcebispo Michel Aupetit, de Paris, chegou no mesmo dia do início da viagem. O arcebispo havia sido acusado por uma investigação jornalística de um relacionamento impróprio com uma mulher, o arcebispo admitiu ter enviado mensagens impróprias, mas negou qualquer envolvimento sentimental ou sexual.

“Eu me pergunto o que Aupetit fez de tão grave que teve que renunciar”, disse o papa. “Se não conhecemos a acusação, não podemos condenar. Qual foi a acusação? Quem sabe?" Francisco diz que “foi uma falta contra o sexto mandamento, mas não total pequenas carícias, mensagens que mandava para a secretária. Isso é um pecado, mas não é um dos pecados mais graves. Os pecados da carne não são os mais graves. Os pecados mais graves são os de maior angelicalidade: a soberba, o ódio, esses são os mais graves”.

Francisco observou que Pedro, o primeiro chefe da Igreja, também pecou. “A comunidade daquele tempo tinha aceitado um bispo pecador e ele tinha pecados de tanta ‘angelicalidade’ como renegar Cristo! Mas era uma igreja normal, estava habituada a se sentir pecadora sempre, todos, era uma igreja humilde. Vê-se que a nossa Igreja não está acostumada a ter um bispo pecador”.

“Quando a tagarelice cresce, cresce, cresce e tira a fama de uma pessoa, aquele homem não poderá governar porque perdeu a fama não por seu pecado, que é pecado, como o de Pedro, como o meu, como o seu, mas pela tagarelice das pessoas responsáveis por contar as coisas”, disse Francisco. “Isso é uma injustiça. Por isso aceitei a demissão de Aupetit não sobre o altar da verdade, mas sobre o altar da hipocrisia.

Em seguida, abordando a questão do relatório sobre os abusos na França, o Papa Francisco pediu "cuidado com a interpretação", pois corre-se o risco de "confundir a maneira de sentir um problema em uma época com o que se sente em outra. Uma situação histórica deve ser interpretada com a hermenêutica da época, não com a nossa”.

Outro tema: um próximo encontro com o patriarca Kirill de Moscou. Há algum tempo ele fala sobre um encontro no Cazaquistão, no festival de religiões do próximo ano, ao qual o papa Francisco e Kirill foram convidados.

O papa diz que o encontro se situa "num horizonte não muito distante", e que, na próxima semana, o Metropolita Hilarion, chefe do Departamento de Relações Exteriores do Patriarcado de Moscou, deverá visitá-lo para "chegar a um acordo sobre um possível encontro".

O papa Francisco disse que também está disposto a ir a Moscou para "falar com um irmão", porque quando se fala com um irmão "não há protocolos". E Kirill é irmão assim como os outros patriarcas, como Crisóstomo e Hyeronimos, e é preciso "ir juntos, andar em unidade". O papa Francisco admite que é preciso estudar, consultar os teólogos, mas, enquanto isso, deve-se "caminhar juntos", fazer caridade juntos

 

O Papa Francisco também olha para a União Europeia, onde são publicadas orientações pedindo para não mencionar o Natal para não ofender outras religiões. Para o papa Francisco, é “um anacronismo da história. Muitas ditaduras tentaram fazê-lo: pense em Napoleão, na ditadura nazista e comunista”. Para o Papa Francisco, é "uma moda da lacidade diluída, e isso é algo que não funciona ao longo da história".

Olhando para o diálogo, o Papa retorna ao seu pedido de desculpas ao Arcebispo Ieronymous, em seu discurso. O papa disse que se deve pedir desculpas ignorando o "espírito de auto-suficiência", e que é mais difícil pedir desculpas a Deus do que a um irmão

Pergunta-se ao papa se é preciso aprender mais com a sinodalidade ortodoxa. Para o papa, “clero e leigo é uma divisão funcional”, mas é a sinodalidade que faz “ouvir-se e ir juntos”, e “a Igreja latina havia esquecido o Sínodo, foi são Paulo VI quem restaurou o caminho sinodal”.

As perguntas também levam o Papa a voltar à sua denúncia de um "retrocesso da democracia". Para Francisco, “a democracia é um tesouro, um tesouro da civilização e deve ser protegida, e não apenas protegida por uma entidade superior, mas pelos próprios países”.

E ele ressalta que hoje existem dois perigos para a democracia. O primeiro é o populismo, que não é "popularismo", mas sim o que foi o nazismo, que o papa descreve como "um populismo que defendeu os valores nacionais e conseguiu aniquilar a vida democrática, para se tornar uma ditadura sangrenta".

O papa enfatiza que “quando os valores nacionais são sacrificados”, chegamos a um império, a um governo supranacional. Esse é o segundo perigo: das potências internacionais.

Há também uma pergunta sobre a questão dos migrantes. O Papa Francisco denuncia como "uma moda" o fechamento de fronteiras, inclusive com arame farpado, e convida aqueles que o fazem a se lembrarem de quando foram migrantes e não fecharam as portas.

Para aqueles que dizem que o governo tem o dever de governar e que não pode fazê-lo com ondas migratórias em massa, o papa responde que cada governo deve deixar claro quanto pode receber. Mas - acrescenta - “os migrantes devem ser acolhidos, acompanhados, promovidos e integrados”. E se isso não for possível, é necessário encetar um diálogo, e é esta harmonia que a União Europeia é chamada a fazer.

“Não é fácil acolher os migrantes - diz o Papa Francisco - não é fácil resolver o problema dos migrantes, mas se não resolvermos o problema dos migrantes corremos o risco de destruir a civilização. Não apenas naufragou no Mediterrâneo, mas também na civilização”.

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Por isso, pede aos governantes que "cheguem a um acordo", aponta o modelo de integração da Suécia que acolheu muitos migrantes que fugiam das ditaduras latino-americanas e lembra a tragédia dos traficantes, que retomam os migrantes se forem mandados de volta.

É por isso, diz o Papa Francisco, que os migrantes “não podem ser deixados sozinhos. Se eu mandar o migrante de volta, tenho que acompanhá-lo e integrá-lo ao seu país. Não o deixe na costa da Líbia".

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