“O Sínodo dos Bispos Católicos está agora ocupado construindo o que eles consideram ser o 'sonho de Deus' da sinodalidade. Infelizmente, esse sonho divino se transformou em um pesadelo tóxico, apesar das boas intenções dos bispos”, escreveu o cardeal em um artigo publicado ontem (11) por The Spectator sobre o Sínodo dos Bispos sobre a sinodalidade.

O cardeal Pell, que foi prefeito da Secretaria de Economia da Santa Sé e arcebispo emérito de Sydney, na Austrália, morreu em 10 de janeiro em Roma.

A etapa continental do sinodo, vai de janeiro a março de 2023. Os trabalhos dessa fase têm como base o texto “Alarga o espaço da tua tenda”, que foi apresentado em outubro de 2022 no Vaticano, tendo em vista a terceira fase que será em duas etapas: em outubro de 2023 e em outubro de 2024, ambas em Roma.

O cardeal Pell escreveu que, depois da primeira fase de "escuta e discernimento" do sínodo, no nível diocesano, muitas contribuições foram enviadas à Santa Sé. O texto produzido, o documento de trabalho para a fase continental, "é um dos textos mais incoerentes já publicados por Roma", diz Pell.

Para o cardeal Pell, o texto se refere a “um lugar onde as pessoas são ouvidas, não julgadas ou excluídas”.

“Até agora, o caminho sinodal negligenciou, até mesmo degradou, o Transcendente. Encobriu a centralidade de Cristo com apelos ao Espírito Santo e fomentou o ressentimento, especialmente entre os participantes”, lamentou o arcebispo emérito de Sydney.

Depois de lembrar que “documentos de trabalho não fazem parte do magistério. Eles são uma base para discussão; para ser julgados por todo o povo de Deus e especialmente pelos bispos com o papa e sob ele”, o cardeal disse que este texto “precisa de mudanças radicais. Os bispos precisam perceber que há trabalho a ser feito, em nome de Deus, mais cedo ou mais tarde”.

O cardeal lamentou que “o documento não exorta nem mesmo os participantes católicos a fazer discípulos de todas as nações (Mt 28,16-20), muito menos a pregar o Salvador a tempo e a destempo (2Tim 4,2)”

“Por causa das diferenças de opinião sobre aborto, contracepção, ordenação de mulheres ao sacerdócio e atividade homossexual, alguns acham que as posições definitivas sobre estes temas não podem ser estabelecidas nem propostas. Isso também se aplica à poligamia, ao divórcio e ao novo matrimônio”, disse Pell.

No entanto, disse ele, "o documento é claro sobre o problema especial da posição inferior das mulheres e os perigos do clericalismo, embora reconheça a contribuição positiva de muitos padres".

Pell pergunta: “O que pode ser feito com este pot-pourri, esta efusão de boa vontade da Nova Era?”

“Não é um resumo da fé católica ou do ensinamento do Novo Testamento. É incompleto, hostil em formas significativas à tradição apostólica e em nenhum lugar reconhece o Novo Testamento como a Palavra de Deus, normativa para todo ensinamento sobre fé e moral”, advertiu.

O cardeal Pell também comentou que "o relator, o cardeal Jean-Claude Hollerich rejeitou publicamente os ensinamentos básicos da Igreja sobre sexualidade, alegando que eles contradizem a ciência moderna".

“Em tempos normais, isso significaria que sua continuação como relator seria inadequada, até mesmo impossível”, disse o cardeal.

Pell disse que “os Sínodos devem escolher se são servidores e defensores da tradição apostólica sobre a fé e a moral, ou se seu discernimento os obriga a afirmar sua soberania sobre a doutrina católica”.

“Eles devem decidir se os ensinamentos básicos sobre realidades como o sacerdócio e a moralidade podem ser deixados em um limbo pluralista, onde alguns escolhem redefinir os pecados e a maioria concorda em diferir respeitosamente”, disse ele.

Depois de dizer que os bispos são sucessores dos Apóstolos e garantidores da fé, o cardeal Pell disse que "há sinais de esperança, de liderança efetiva e de cooperação, mas o documento opina que os modelos piramidais de autoridade devem ser destruídos e que a única autoridade genuína provém do amor e do serviço”.

Os protagonistas dos Sínodos são os bispos, diz Pell. Omitir seu papel de custódios da fé e “transmitir apenas os pontos de vista da comissão organizadora ao Santo Padre para que ele faça o que decidir é um abuso da sinodalidade, uma marginalização dos bispos, que não é justificada pelas Escrituras ou pela tradição”.

"Não é o devido processo e é suscetível de manipulação", denunciou.

O atual processo ou caminho sinodal "não conta com o apoio" dos católicos que costumam ir à missa, escreveu o cardeal. "Os ex-anglicanos entre nós têm razão em identificar a crescente confusão: o ataque à moral tradicional e a inserção no diálogo do jargão neomarxista sobre exclusão, alienação, identidade, marginalização, os sem voz, os LGBTQ (n.d.r. lésbica, gay, bissexual, transgênero e queer), bem como o deslocamento das noções cristãs de perdão, pecado, sacrifício, cura, redenção”.

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O cardeal pergunta: "Por que o silêncio sobre a vida após a morte e a recompensa ou o castigo, sobre as quatro realidades últimas: a morte e o juízo, o céu e o inferno?"

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