Respondendo a um recente artigo do relator do Sínodo para a Amazônia, Cardeal Claudio Hummes, o bispo prelado emérito de Marajó, Dom José Luis Azcona, ressalta que o objetivo do Sínodo deve ser uma renovação da fé para torna-la missionária, e assevera que “sem este objetivo, sem conversão em sentido estrito, não tem Sínodo, nem futuro para a Amazônia”.

O artigo que Dom Azcona comenta em seu trabalho está tomado de um artigo de Dom Hummes publicado no L’Osservatore Romano (6 de agosto 2019), intitulado “Relançar uma Igreja próxima e dialogante”.

“Este escrito quer ser um pequeno comentário a este artigo com harmonias e dissonâncias sobre o mesmo. O Senhor Cardeal, Relator do Sínodo na trilha do Discurso do Santo Padre em Rio de Janeiro por ocasião da JMJ (2013) aos Bispos do Brasil, coloca em evidência dois objetivos importantes a destacar para o próximo Sínodo: A conversão missionária e a esperança”, escreve o prelado ao iniciar seu artigo, enviado em exclusiva a ACI Digital.

A respeito da conversão missionária, abordada no artigo do Cardeal Hummes, Dom Azcona refere: “Ser missionário é ser cristão. E para ser cristão precisa arrependimento, conversão e homem novo (Atos 2,38). Os Onze terão que ser testemunhas disso: “Que em seu Nome seja proclamado o arrependimento para a remissão dos pecados a todas as nações, a começar por Jerusalém. (Lc 24, 47-48) É o que repete fielmente Aparecida exortando a conversão pessoal dezessete vezes e dela fazendo depender a conversão pastoral e missionária. É do “encontro pessoal com Cristo” (Ibid), encontro transformante, que nasce o cristão, o homem novo, o missionário. Da mesma maneira, como destaca a Laudato Sii, a conversão ecológica nasce e tem seu fundamento nesta conversão pessoal, “no encontro pessoal e transformante com Cristo”.

“Sem este objetivo, conversão em sentido estrito, não tem Sínodo, nem futuro para a Amazônia”, afirma.

“Na verdade, se trata da falta de fé na Igreja e na Amazônia. Falta de fé que impede a conversão missionária. “O impulso missionário sempre foi um sinal de vitalidade, assim como a sua diminuição constitui um sinal de crise de fé” (Redemptoris Missio 2). São João Paulo II deixa bem claro que a finalidade desta Encíclica é a renovação da fé e da vida cristã. “De fato a missão renova a Igreja, revigora a sua fé e identidade, dá-lhe novo entusiasmo e novas motivações. “É dando a fé que ela se fortalece” (Ibid)”.

“Por tanto o objetivo central do Sínodo é suscitar, renovar a fé e assim fazê-la missionaria. Qualquer outro objetivo entra na região dos fantasmas, do inútil”, escreveu Dom José.

Ainda para o emérito de Marajó é vital assinalar que “Não há missão na América Latina, nem na Amazônia sem este Novo Pentecostes (Aparecida 548-549; 362)”.
“Esta é a única maneira de enfrentar o cansaço, o desânimo, a desilusão, a tristeza e a falta de esperança em tantos evangelizadores da Amazônia!”.

“O segundo eixo para descrever o Objetivo do Sínodo para a Amazônia na mente de Dom Claudio, é a esperança: “Reacender as esperanças frustradas e superar os sentimento de desanimo”, prossegue.

“A resposta do Senhor Cardeal nasce de um impulso nobre: “não devemos ceder ao medo”, “nem ao desencanto, nem as lamentações, nem ao sentimento de uma estação perdida”. “Também a Amazônia se encontra nessa situação... parece que a colheita de séculos de missão esteja a perder-se”, “muitos caminham sozinhos, sem meta, com o seu próprio desencanto””.

Porém, esclarece Dom José Azcona, “isto não é “dar razão da nossa esperança a todo aquele que nô-la pede” (1 Ped. 3,15). “Tampouco diante dos pagãos de hoje, também da Amazônia, que vivem sem esperança (Ef 2, 12; 1 Tess 4,13). As motivações para suscitar e manter a esperança apresentadas por D. Claudio, não são propriamente cristãs e, portanto, se perdem no vazio sem possibilidade alguma real de superar o desanimo, e a tristeza”.

Para Dom Azcona, “a necessária conexão entre fé e esperança, aquela fundamentando e sendo principio desta, fica completamente esquecida”

“Paulo nos lembra, pelo contrario: “Tendo sido pois, justificados pela fé, estamos em paz com Deus (Rom 5,1)...e na qual (fé) estamos firmes e nos gloriamos na esperança na gloria de Deus (V 2 )...e a esperança não decepciona porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado” (V 5)”.

Assim, o prelado reitera críticas já feitas a Instrumentum Laboris do Sínodo, afirmando: “a esperança segundo IL e o objetivo são inexistente, sumindo desta maneira ao leitor na angustia, nas tristezas mais profundas diante da situação da Igreja e do mundo em geral e mais em particular, da Amazônia”.

“Como quem dá consistência e perseverança a esperança, é o amor e este consiste no amor do Crucificado e do Pai que o entrega a morte aos próprios inimigos (V 6-11), no objetivo do Sínodo não se fala uma palavra sobre amor”.

“Carregados de pelagianismo, tão justa e providencialmente fustigado pelo Santo Padre, de conselhos ingênuos sobre utopias, esperanças “penúltimas”, “pequenas” por muito justas que sejam, silencia de modo alarmante a “Grande Esperança” (Spe Salvi). O moralismo bem intencionado dos dois textos com exortações, imperativos, conselhos sobre a necessidade de manter o animo, a esperança e o entusiasmo se perdem na noite do nada, se diluem diante do indicativo absoluto: “Deus estava reconciliando o mundo consigo e colocando em nós a palavra da reconciliação” (2 Cor 5,18-19). Daqui nasce a profunda convicção, a certeza alegre orgulhosamente proclamada por Paulo: “Assim, se Deus está conosco quem estará contra nós?.... Quem nos separará do amor de Cristo?...Em tudo isto somos mais que vencedores, graças aquele que nos amou” (Rom 8, 31-37)”, expressa Dom José.

“Por isso, tanto o IL como o Objetivo destilam um sentimento difuso de tristeza, de desanimo, de derrota anunciada. Ao máximo a que chegam os dois textos e neles alguns grupos indígenas especialmente com o “bem viver” ou com a “terra sem males”, é a “nostalgia do totalmente Outro” que permanece inacessível, no grito do desejo dirigido sem resposta a história universal e a toda a criação (Horkheimer). Ou, chegariam com Adorno, filósofo também da escola de Frankfurt, a uma cosmovisão exigida pela racionalidade “onde fosse anulado o sofrimento presente; Isto segundo ele seria impossível sem a Ressurreição corporal dos mortos. Por tanto, algo completamente estranho para o idealismo assim como a visão da “terra sem males” (Cfr Spe Salvi 42)”.

“Assim”, segundo o prelado emérito, “se perpetuam no mundo, também na Amazônia, a nostalgia, a fome e sede devoradoras pela realização plena do homem e da história. As utopias mais luminosas, as profecias mais ardentes por justiça, nunca encontrarão realização se não é a partir da Cruz de Cristo: “Salve Crux, Spe Única”. “Salve Cruz, Esperança única”.

“Unicamente assim, o Sínodo poderá se erguer como profeta, testemunha e servidor da esperança. Porque “a fé (esperança) é uma posse antecipada do que se espera, um meio de demonstrar as realidades que não se veem” (Heb 11,1)”, concluiu Dom Azcona.

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