Heidi Crowter, uma britânica de 26 com síndrome de Down, se apresentou na corte suprema do Reino Unido para contestar a lei que permite o aborto até o momento do nascimento de crianças com síndrome de Down. “Esta lei me faz sentir que estaria melhor morta”, disse Crowter.

Na Inglaterra, Escócia e País de Gales, a prática do aborto é permitida até as 24 semanas de gravidez. No entanto, o artigo 1.1.d da lei de 1967 permite o aborto até o nascimento se “existe um risco substancial de que, nascendo a criança, sofra de anormalidades físicas ou mentais que a deixem seriamente incapacitada”. Em 2020, foram registrados 3.083 abortos por deficiência na Inglaterra e no País de Gales. Desses, 693 foram feitos por causa de um diagnóstico pré-natal de síndrome de Down.

Heidi Crowter tem emprego, mora em seu próprio apartamento, faz suas tarefas domésticas e está prestes a completar seu primeiro ano de casada com James Bryn Carter, que também tem síndrome de Down.

No dia 6 de julho, Crowter apresentou-se perante o Supremo Tribunal de Londres, ao lado de Máire Lea-Wilson, de 33 anos, mãe de uma criança com síndrome de Down, para desafiar a lei do aborto que ambas afirmam ser discriminatória. Crowter, da cidade de Coventry, na Inglaterra, diz ser “a primeira pessoa com síndrome de Down a denunciar o governo do Reino Unido perante a corte”. Ela processa o Estado para que a lei de aborto seja mudada. Lea-Wilson, de Londres, disse que a causa delas é a igualdade. “Todos, no mundo inteiro, merecem ser tratados igualmente, sem importar a deficiência, o gênero, a raça, a religião”.

Entre os apoiadores de Crowter e Lea-Wilson, estava Sally Phillips, atriz dos filmes sobre “Bridget Jones”, cujo filho mais velho tem síndrome de Down.

“Não há diferença entre eu e alguém que não tem síndrome de Down, como o meu sobrinho”, disse Crowter a seus seguidores. “A vida é boa para pessoas como eu e a lei do aborto deve refletir isso. Somos todos iguais e os médicos não devem dizer às mulheres que se arrependerão se o seu filho nascer. Deviam apoiá-los. Me entristece que isso não aconteça. Minha família não lamenta que eu tenha nascido, meu marido não lamenta que eu tenha nascido e todos os meus amigos também me apreciam. Estamos felizes com nossas vidas”.

A ativista lembrou que as pessoas com sua condição também podem ser felizes. “Minha mãe, que também é minha agente, aqui hoje, viu que estava errada quando eu nasci. Ela achou que eu não me casaria, mas eu me casei faz um ano. Esta semana faremos aniversário. James, meu marido, também tem síndrome de Down. Ele me apoia neste caso”.

Em 6 de julho, Jason Coppel, advogado que representa Crowter e Lea-Wilson, disse ao Tribunal Superior que Heidi sofreu abusos devido à sua deficiência e acredita que a existência de uma lei que permite o aborto até o nascimento dos bebês com síndrome de Down “é uma causa cultural que contribui para este tipo de abuso”, informou o jornal The Guardian.

Heidi Crowter e Lea-Wilson contam com o apoio do grupo Don’t Screen Us Out. Eles arrecadaram 140 mil dólares para financiar o caso perante a corte, que durará dois dias conforme o programado. Espera-se que o julgamento seja adiado para uma data posterior.

Lea-Wilson disse à CNA, agência em inglês do Grupo ACI, que em maio se sentiu inspirada a participar no caso depois de ver Crowter discutindo sobre a lei de aborto na televisão.

Ele disse que as palavras da jovem defensora dos direitos das pessoas com deficiência ressoaram nela após o nascimento de seu segundo filho, Aidan, em junho de 2019.

Lea-Wilson descobriu “que Aidan provavelmente nasceria com síndrome de Down quando estava com 34 semanas de gravidez”, e então eles me perguntaram repetidamente se eu queria interromper a gravidez”

“De repente, a forma como eu fui tratada mudou. Deixei de ser uma mãe emocionada, que esperava o seu segundo filho, e passei a ser uma mulher que enfrentava uma grande tragédia e que tinha que tomar uma 'decisão': abortar ou não a minha gravidez”, disse ela. “Tenho dois filhos que amo e valorizo da mesma forma, então não consigo entender por que a lei não os valoriza por igual”, enfatizou.

“Os juízes devem saber que não estamos sofrendo e que nossos pais e família não sofrem. Os médicos precisam ouvir isso, precisam ouvir pessoas como eu e aprender mais sobre a vida com síndrome de Down”, disse Heidi fora do tribunal.

“Minha luta pela justiça e a igualdade nos trouxe aqui hoje para mudar uma lei que me faz achar que eu não deveria ter nascido”, afirmou. “Quando a lei mudar para nós, teremos ganho a luta. Vamos fazê-lo”, concluiu.

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