Em decisão liminar, a justiça de São Paulo estabeleceu no início de abril que crianças e adolescentes que estudam em regime de internato nas escolas dos Arautos do Evangelho retornem para casa até o fim do semestre. Segundo padre Alex Barbosa, representante dos Arautos junto ao Comissário Pontifício, a instituição já está tomando medidas para reverter esta decisão que consideram “equivocada e precipitada”.

A juíza Cristina Ribeiro Leite Balbone Costa, da Vara da Infância Juventude, concedeu liminar determinando a suspensão de novas matrículas, a proibição do ensino em regime de internato e que os estudantes internos das unidades dos Arautos do Evangelho devem voltar para suas casas até o dia 1º de julho.

A decisão liminar foi proferida em uma ação civil pública ajuizada pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo e pelo Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CONDEPE), órgão da Secretaria da Justiça e Cidadania de São Paulo. As acusações contra os Arautos são de tortura, assédios sexual e moral, racismo, maus-tratos, estupro contra crianças e adolescentes, entre outros. Essas denúncias ganharam repercussão na mídia nacional nos últimos anos. Os Arautos sempre negaram.

“Os advogados dos Arautos, bem como os representantes dos pais e professores, já estão tomando as medidas processuais cabíveis para reverter essa decisão, que consideramos equivocada e precipitada, visto ter sido proferida sem que os Arautos tivessem a oportunidade de prestar os devidos esclarecimentos”, disse padre Alex Barbosa à ACI Digital. Segundo ele, “os Arautos tomaram conhecimento dessa decisão liminar através da mídia, apesar de ser um processo que tramita sob segredo de justiça”.

Em nota publicada em 13 de abril, os Arautos do Evangelho afirmaram que “o ter sido iniciado um processo judicial será extremamente favorável para o estabelecimento da verdade, pois permitirá, finalmente, que todos os nossos colaboradores, integrantes, professores e estudantes tenham voz e vez, oportunidade que lhes havia sido tolhida até o presente momento, em outros procedimentos de teor acusatório promovidos pela imprensa”.

Padre Alex Barbosa disse em um vídeo divulgado no sábado (30) por Arautos do Evangelho que a instituição não possui internatos. Segundo ele, os colégios são “entidades civis autônomas” e os Arautos oferecem apenas hospedagem a alguns alunos, mas muitos retornam para casa com seus pais. “Existe um contrato entre os pais, a instituição Arautos do Evangelho que fornece a hospedagem e as várias escolas que são entes independentes. Por meio desse contrato, cada instituição deve fornecer aquilo que lhe é próprio”, afirmou.

Em sua decisão, a juíza Balbone Costa citou uma determinação do ano passado da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica da Santa Sé de que, ao fim do ano letivo, todos os menores de idade admitidos aos Arautos do Evangelho deveriam retornar para suas casas. Após serem notificados, os Arautos apresentaram um recurso solicitando que a decisão fosse revogada e apresentando o que afirmam ser “irregularidades e ilegalidades” do decreto.

Na época, a decisão da Santa Sé foi comunicada aos Arautos pelo cardeal Raymundo Damasceno, arcebispo emérito de Aparecida (SP), nomeado comissário pontifício para os Arautos do Evangelho, em 2019. “Com relação ao comissário cardeal Raymundo Damasceno, todas as questões referentes aos colégios estão sendo tratadas de forma harmônica e fraterna, e ele inclusive emitiu uma nota apresentando à imprensa correções das informações apresentadas de forma distorcida e sensacionalista nas matérias jornalísticas”, disse padre Alex Barbosa.

A assessoria jurídica do cardeal Damasceno publicou em 26 de abril uma nota afirmando que “a recente decisão da Vara da Infância e Adolescência da capital paulista, dada de modo provisório (liminar), é apenas mais um capítulo de um longo caminho que está longe de acabar”. “Dela serão interpostos os recursos cabíveis, e não convém extrair conclusões precipitadas”, declara.

O comunicado é assinado por Hugo José Sarubbi Cysneiros Oliveira, assessor jurídico do Comissário Pontifício para os Arautos do Evangelho. O texto afirma que recentes notícias veiculadas na mídia sobre a decisão judicial contra os Arautos tendem “ao sensacionalismo” e “apenas reiteraram acusações antigas, já afastadas por decisões das autoridades civis e religiosas competentes, por terem se demonstrado temerárias e inconsistentes”.

Entre as acusações veiculadas contra os Arautos estão denúncias de estupro, maus-tratos e possível homicídio. O comunicado afirma que a denúncia de estupro foi arquivada em maio de 2021, após a Polícia Civil e o Ministério Público atestarem “absoluta inconsistência da alegação”. Cita ainda o caso da morte da jovem Lívia Uchida que, segundo reportagens, poderia ter sido por suicídio ou homicídio. Entretanto, segundo a nota do comissariado, investigações policiais revistas pelo Ministério Público e validadas por juiz concluíram “não haver evidências de crime, mas sim de acidente doméstico”.

“Sobre as demais ilações acerca de outros crimes hipotéticos, é possível atestar que até o presente momento nenhum tribunal civil ou eclesiástico, pátrio ou estrangeiro, veio a declarar que a associação ou qualquer um de seus membros tenha praticado qualquer tipo de delito”, afirma a nota.

Por fim, declara que “no momento, o Comissário Pontifício tem se reunido com diversos setores da instituição para que, em espírito de cooperação, e através do diálogo e da escuta – como ensina o Santo Padre o papa Francisco – seja possível encontrar bons caminhos para os desafios da Igreja no Brasil e no mundo”.

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