Ao receber o novo colégio de cardeais - que inclui 18 novos eleitores para votar em qualquer possível conclave - o papa Francisco continua a desenvolver o trabalho de seus antecessores ao tornar o colégio mais internacional, embora tenha adicionado sua marca própria aos membros.

Após o consistório de amanhã (30), o colégio de cardeais terá 136 cardeais eleitores com menos de 80 anos. Desses, há 53 da Europa, 24 da América Latina, 22 da Ásia, 19 da África, 15 da América do Norte e três da Oceania.

Este grupo está bem acima do limite de 120 eleitores, mas esse requisito estabelecido pelo papa são Paulo VI em 1970 foi posto de lado várias vezes, incluindo pelo papa são João Paulo II em 2001 e 2003, pelo papa Bento XVI em 2010 e 2012, e agora pelo papa Francisco. Quinze cardeais completam 80 anos no próximo ano, de modo que o limite tradicional será alcançado naturalmente com o tempo.

Francisco nomeou 131 cardeais ao todo, com uma média de um consistório por ano, com uma pausa em 2021 por causa da pandemia de covid-19. Ao todo, ele nomeou 98 atuais cardeais eleitores em nove consistórios, o que significa que 72% de todos os atuais eleitores foram nomeados por ele. Os demais foram nomeados por João Paulo II e Bento XVI. Em comparação, João Paulo II nomeou um 231 cardeais em apenas nove consistórios.

No entanto, tal como está, o número de cardeais eleitores conta apenas uma parte da história que se desenrolou com o colégio ao longo das últimas décadas. Francisco abraçou e acelerou o processo de internacionalização do organismo. Embora tenha nomeado um total de 37 eleitores da Europa, reduziu a proporção do contingente europeu e aumentou o número de cardeais da Ásia, América Latina e África. Ao todo, ele nomeou cardeais de 66 países, incluindo várias nações de primeira viagem, como Sudão do Sul, Singapura e Mongólia.

O declínio dos europeus no colégio faz parte de um processo contínuo que se desenrola há mais de um século. No conclave de 1903 que elegeu o papa são Pio X, todos os 62 cardeais participantes, exceto um, eram da Europa (o único não europeu era o cardeal James Gibbons, de Baltimore, nos EUA), e dos europeus, mais da metade eram italianos.

No conclave de 1958 que elegeu o papa são João XXIII, o colégio era radicalmente diferente geograficamente, graças aos esforços deliberados do papa Pio XII para adicionar cardeais de todo o mundo. Dos 51 participantes votantes, 17 eram de Itália, 16 eram da Europa e 18 eram de vários países não europeus. Houve dois participantes americanos, os cardeais James McIntyre, de Los Angeles, e Francis Spellman, de Nova York, ao lado de cardeais da Argentina, Cuba, Índia, Colômbia, China, Síria e outros lugares. O número de eleitores não-europeus continuou a aumentar durante os conclaves de 1963, 1978, 2005 e 2013.

A partir de amanhã (30), 39% dos eleitores serão da Europa, 18% da América Latina e do Caribe, 16% da Ásia, 14% da África, 11% da América do Norte e 2% da Oceania.

Isto marca um declínio do número de europeus no Colégio desde 2013, de 53%, e um aumento na América Latina de 16% para 18%, de 9% para 16% para a Ásia e de 9% para 14% para África. E olhando para a influência dos italianos, o seu número diminuiu de 28 eleitores em 2013 para 16 no último consistório.

As mudanças geográficas e os realinhamentos dentro do colégio sob o papa Francisco estão, portanto, em sintonia com a tendência de longa data de um colégio representativo do catolicismo global. O papa, no entanto, moldou diretamente o colégio de duas outras maneiras significativas.

Na verdade, Francisco nomeou alguns cardeais das fileiras das principais arquidioceses tradicionais, como os cardeais Blase Cupich, de Chicago, e Jozef De Kesel, de Mechelen-Bruxelas, em 2016, Celestino Aós Braco, de Santiago do Chile, e o recém-nomeado José Cobo Cano, de Madri. Mas, visivelmente, ele tem ignorado com frequência as sedes cardinalícias tradicionais – grandes arquidioceses como Los Angeles, Paris, Milão e Veneza – em favor de bispos de pequenas dioceses ou mesmo bispos auxiliares.

Em agosto de 2022, Francisco nomeou cardeal o bispo Robert McElroy de San Diego, uma diocese sufragânea de Los Angeles, uma declaração clara de seu apoio pessoal ao prelado e outro desprezo inequívoco da arquidiocese de Los Angeles – a maior dos EUA - que já foi contornada nove vezes pelo papa.

Ainda mais incomum foi a decisão de nomear bispos auxiliares para o colégio. Em 2017, por exemplo, foi nomeado Gregorio Rosa Chávez, então bispo auxiliar de San Salvador, El Salvador (completou 80 anos em outubro de 2022). Da mesma forma, neste último conclave, Francisco nomeou dom Américo Manuel Alves Aguiar, bispo auxiliar de Lisboa. E, embora houvesse rumores de que dom Aguiar se dirigia a Roma para chefiar um dos dicastérios da Cúria ou mesmo para suceder ao cardeal Manuel José Macário do Nascimento Clemente como patriarca de Lisboa, ele foi enviado para a modesta diocese portuguesa de Setúbal, diocese sufragânea de Lisboa.

Igualmente incomum tem sido a seleção de novos cardeais por Francisco de territórios e dioceses genuinamente distantes, muitas vezes com pequenas populações católicas – um movimento que incorpora as preocupações do Santo Padre em alcançar as periferias da Igreja. Estes incluem cardeais da Mongólia, Marrocos, Suécia e Laos, cujas populações católicas são contadas não na casa dos milhões, mas na casa dos milhares.

No geral, o colégio em 2023 é mais internacional, diverso e imprevisível do que aquele que elegeu Francisco ao papado em 2013. Certamente, existem cardeais progressistas comprometidos, mas é impossível fazer suposições abrangentes sobre as tendências ideológicas ou teológicas do todo o corpo de eleitores globalmente distantes. Isto torna igualmente difícil prever o resultado de um futuro conclave e, embora Francisco possa parecer ter adotado uma abordagem vanguardista ao nomear cardeais eleitores, essa própria imprevisibilidade pode ser exatamente o que ele deseja.