A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) publicou um relatório identificando "provas sérias e suficientes" para concluir que "agentes" do governo cubano participaram das mortes do fundador do Movimento Cristão Libertação (MCL) Oswaldo Payá e do ativista Harold Cepero.

“Este relatório da CIDH, mais de dez anos depois de suas mortes, nos dá alguma esperança de que a justiça um dia será feita. É importante reconhecer que a ditadura cubana estava por trás da morte de Oswaldo Payá e Harold Cepero”, disse Osvaldo Gallardo, leigo católico de 47 anos e ativista pela liberdade religiosa em Cuba, à ACI Prensa, agência em espanhol do grupo ACI, ontem (13).

Oswaldo Payá e o líder juvenil Cepero morreram em 22 de julho de 2012, quando iam de carro ao leste da ilha. A versão do governo é que foi um acidente de trânsito. No entanto, este fato ocorreu depois que ambos os opositores foram “sujeitos a vários atos de violência, assédio, ameaças, atentados contra suas vidas”, diz o relatório publicado pela CIDH em 9 de junho de 2023.

O espanhol Ángel Carromero, que no momento do atentado dirigia o veículo e sobreviveu, foi condenado por esses fatos. No entanto, o documento da CIDH diz que Carromero “foi violado em seus direitos às garantias judiciais no âmbito do processo penal que se seguiu”.

O relatório da CIDH conclui que o Estado cubano violou os direitos à vida, à honra, à liberdade de expressão e ao devido processo em detrimento de Payá e Cepero, bem como outros direitos contidos na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem.

O documento identifica “múltiplas irregularidades e omissões na investigação seguida” pelo Estado.

“Em particular, a CIDH observa que imediatamente após a ocorrência do fato, as autoridades estatais mantiveram a posição oficial de que o ocorrido foi um acidente de carro. Isso sem que tenham sido feitas as diligências, perícias ou avaliações das declarações dos sobreviventes, bem como o acompanhamento das linhas de investigação relacionadas à participação de agentes estatais nos fatos”, diz a corte.

“Pelo contrário, segundo disse o senhor Carromero e que não foi contestado pelo Estado, ele foi ameaçado para confessar que ele foi o único responsável pelo acidente”, acrescenta o relatório.

A organização internacional diz ainda que, apesar dos muitos pedidos, “os familiares nunca tiveram acesso aos relatórios das autópsias nem ao conteúdo dos autos realizados”.

Nesse sentido, a CIDH conclui que o Estado de Cuba é responsável, entre outras violações de direitos humanos, pela violação do direito à justiça dos familiares de Payá e Cepero.

Rosa María Payá Acevedo, filha de Oswaldo Payá e promotora da iniciativa Cuba Decide, disse ontem (13) que "depois de mais de 10 anos, a verdade prevaleceu".

“Agora é oficial, como demonstra esta decisão da CIDH, o regime cubano assassinou meu pai, Oswaldo Payá, e Harold Cepero. Nada pode compensar as perdas que nossas duas famílias sofreram, mas hoje estamos mais próximos da justiça, que só virá quando o legado de democracia e liberdade a que meu pai e Harold dedicaram suas vidas for cumprido em nosso país", escreveu a ativista em mensagem publicada nas redes sociais.

Segundo Payá Acevedo, este relatório “não é só um alívio para nossas famílias que tanto lutaram pelo reconhecimento da verdade, mas uma vitória para todos os cubanos que foram e são vítimas da ditadura de Castro”.

Gallardo disse que Oswaldo Payá (morto aos 60 anos) foi para "os jovens leigos de minha geração um símbolo da Cuba que viria".

Ele disse que com este relatório “estamos limpando não só a morte de Payá e de Cepero, mas também a morte de tantos cubanos que morreram em circunstâncias estranhas e desconhecidas, mas por trás disso está a mão pesada da ditadura”.

“Payá foi um símbolo naquela época e continua sendo hoje, em sua obra, em sua vida e também em sua morte. Payá foi um cristão, um verdadeiro católico, que, devido ao seu compromisso de fé a partir da Doutrina Social da Igreja, teve coragem e determinação para lutar pela liberdade de seu povo até entregar a própria vida”, disse Gallardo.

O ativista disse que muitos cubanos e membros da Igreja Católica sentem gratidão e honram sua memória.

Recomendações do relatório ao Estado de Cuba

A CIDH exortou o Estado de Cuba a cumprir uma série de recomendações, incluindo a reparação material e imaterial para as vítimas e suas famílias, bem como a iniciar uma investigação criminal "diligente, eficaz e dentro de um prazo razoável" para "esclarecer os fatos, identificar os responsáveis e impor as sanções adequadas".

Também pede a promoção de "mecanismos de não repetição", como "cessar a criminalização daqueles que exercem o direito à liberdade de expressão e associação, incluindo dissidentes políticos e defensores dos direitos humanos".

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Também pede "garantir que os defensores dos direitos humanos possam fazer o seu trabalho e cooperar livremente com os mecanismos de direitos humanos sem medo de intimidação ou represálias e sem restrições indevidas".

Finalmente, a CIDH exorta o Estado cubano a adequar "as leis, procedimentos e práticas com as normas internacionais de direitos humanos sobre o devido processo legal, o acesso à justiça e a liberdade de expressão".

Esse relatório será incluído no relatório anual da CIDH para a Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos.

Gallardo acrescentou: "Esse "ato de justiça nos convida a continuar contando a verdade do Evangelho para Cuba e nos dá esperança de que a noite não será eterna".

"Esse também é um ato de justiça para a família de Payá, seus amigos e seus companheiros de luta do MCL. E esperamos que outros órgãos internacionais se unam a esse ato de justiça e proclamem a verdade. A memória de Payá deve ser honrada dessa forma", acrescentou.

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