O Procurador-Geral da República, Augusto Aras, emitiu parecer no qual defende a inconstitucionalidade de um decreto do governo de Santa Catarina que proíbe o uso da chamada linguagem neutra, reivindicada pelo movimento LGBT, em documentos escolares e em editais no Estado. Para o PGR, o decreto extrapola a atuação estadual, pois só a União pode legislar sobre isso.

“A adoção do uso da Língua Portuguesa como idioma oficial do Brasil, a partir da norma culta previamente estabelecida, dá-se em âmbito nacional, por ser matéria que interessa a todos indistintamente. Proibições nesse campo haverão de ser discutidas e promovidas, se for o caso, também em escala nacional, não sendo dado aos entes estaduais adentrar nesse domínio”, afirmou Aras.

A linguagem neutra é defendida por ativistas da ideologia de gênero e estabelece o uso de expressões que não sejam no masculino nem no feminino. Por isso, substituem os artigos “a” e “o”, por exemplo, por letras como “e” ou “x”, para expressar o que classificam como gênero neutro ou não-binário. Assim, palavras como “todos” e “todas” são escritas “todes” ou “todxs”, “menino” ou “menina” passam a ser escritos como “menine”, entre outros.

Em junho de 2021, o governo de Santa Catarina publicou o decreto 1.329, determinando que “fica vedada a todas as instituições de ensino no Estado de Santa Catarina, independentemente do nível de atuação e da natureza pública ou privada, bem como aos órgãos ligados à Administração Pública Estadual, a utilização, em documentos oficiais, de novas formas de flexão de gênero e de número das palavras da língua portuguesa, em contrariedade às regras gramaticais consolidadas e nacionalmente ensinadas”. Diz ainda que “nos ambientes formais de ensino, fica vedado o emprego em documentos oficiais de linguagem que, contrariando as regras gramaticais da língua portuguesa, pretendam se referir a gênero neutro”.

O Partido dos Trabalhadores (PT) ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF) contra o decreto do governo de Santa Catarina. Para o PT, o decreto viola os princípios constitucionais da igualdade, da não-discriminação, da dignidade humana e do direito à educação.

O parecer de Aras é parte da ADI, que está sob relatoria do ministro Kassio Nunes Marques. O Procurador-Geral da República ressaltou que “a discussão proposta nos autos não tem a pretensão de definir ou chegar a consensos sobre a necessidade, a viabilidade ou mesmo a vontade de tornar oficial a hoje denominada linguagem neutra”. Mas o que se questiona “é ato estadual proibindo o uso dessa linguagem alternativa em documentos escolares e no âmbito da administração estadual”. Por isso, disse que o debate se encerra “na delimitação de competências para tratar do tema”.

Segundo ele, “extrapola o campo possível de atuação normativa estadual a vedação expressa ao uso da denominada linguagem neutra no âmbito escolar e da Administração Pública, além de ser previsão desnecessária diante das regras nacionais vigentes vinculadas ao uso da norma culta da Língua Portuguesa, que seguem preservadas”.

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Especificamente sobre a esfera escolar, Aras citou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). Afirmou que, ao pretender vedar o uso em documentos escolares “de novas formas de flexão de gênero e de número das palavras da língua portuguesa”, o decreto do governo de Santa Catarina “invadiu a competência legislativa da União, e mostra-se aparentemente destoante de princípios já consolidados e disciplinados na esfera federal, como o da ‘liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber’ e o ‘pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas’”.

O PGR recordou que a questão foi recentemente examinada em ação no STF em que o ministro Edson Fachin deferiu medida liminar para suspender a eficácia da lei do Estado de Rondônia que proibia o uso da linguagem neutra nas escolas. O ministro considerou que esta lei “ao proibir determinado uso da linguagem, atenta contra as normas editadas pela União, no legítimo exercício de sua competência privativa, já que, a pretexto de valorizar a norma culta”. Esta decisão liminar aguarda referendo do Plenário da Corte.

O governo do Mato Grosso do Sul também proibiu o uso da linguagem neutra nas escolas, em documentos oficiais e materiais didáticos. A lei nº 5.820, publicada em 30 de dezembro no Diário Oficial do Estado determina que “é obrigatória a utilização da norma culta da Língua Portuguesa nos instrumentos de aprendizagem utilizados no ambiente escolar, nos documentos oficiais e na confecção de materiais didáticos, como forma de padronização do idioma oficial do país”.

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