No segundo dia de sua viagem à Hungria, o papa Francisco se reuniu com milhares de jovens no ginásio de esportes Papp László Budapest Sportaréna na capital do país. A seguir, a íntegra do discurso pronunciado pelo papa.

Queridos irmãos e irmãs, quero dizer-vos köszönöm [obrigado]!

Obrigado pela dança, os cânticos, os vossos testemunhos corajosos, e obrigado a cada um por estar aqui: estou feliz por estar convosco! O bispo dom Ferenc Cserháti disse-nos que a juventude é tempo de grandes perguntas e grandes respostas. É verdade! Importante é haver alguém que provoque e ouça as vossas perguntas e não vos dê respostas fáceis e pré-fabricadas, mas vos ajude a enfrentar sem medo a aventura da vida à procura de respostas grandes. Era assim que fazia Jesus. Bertalan, disseste que Jesus não é personagem dum livro de fábulas nem super-herói duma banda desenhada e isso é verdade. Ele é Deus em carne e osso, o Deus vivo que Se faz próximo; é o Amigo, o melhor dos amigos; é o Irmão, o melhor dos irmãos, e é muito hábil a colocar perguntas. Com efeito, no Evangelho, Ele, que é o Mestre, antes de dar respostas, faz perguntas. Recordemos a atitude d’Ele quando tem diante de Si aquela mulher adúltera contra quem todos apontavam o dedo acusador. Jesus intervém; os que a acusavam, vão-se embora e fica ela sozinha.

Então, com delicadeza, «perguntou-lhe: “Mulher, onde estão eles? Ninguém te condenou?” Ela respondeu: “Ninguém, Senhor!”» (Jo 8, 10-11). E assim, ao dizê-lo, compreende que Deus não quer condenar, mas perdoar. Deus perdoa sempre, está pronto a reerguer-nos de cada uma das nossas quedas! Por isso, com Ele, nunca devemos ter medo de caminhar e avançar na vida. Pensemos também em Maria Madalena, que, na manhã de Páscoa, foi a primeira a ver Jesus ressuscitado. Banhada em lágrimas estava junto do túmulo vazio, e Jesus pergunta-lhe: «Mulher, por que choras? Quem procuras?» (Jo 20, 15). E assim, tocada profundamente, Maria de Magdala abre o coração, conta-Lhe as suas angústias, revela os seus anseios e o seu amor.

E vejamos o primeiro encontro de Jesus com aqueles que haviam de se tornar seus discípulos. Encaminhados por João Batista, dois deles vão atrás de Jesus. O Senhor volta-Se e faz-lhes uma única pergunta: «Que pretendeis?» (Jo 1, 38). Querem saber onde mora; e Jesus não lhes dá o endereço, mas abre-lhes um caminho, dizendo: «Vinde e vereis» (1, 39). Não lhes faz um sermão, mas percorre a estrada juntamente com eles: não quer que os seus discípulos sejam alunos que repetem uma lição, mas jovens livres e a caminho, companheiros de estrada dum Deus que escuta as suas necessidades e está atento aos seus sonhos.

Bastante tempo depois daquele primeiro encontro, sucedeu a dois jovens discípulos uma escorregadela infeliz, fazendo a Jesus um pedido errado: pedem para ficar à sua direita e à sua esquerda, quando Ele se tornar Rei. Mas é interessante ver que Jesus não os repreende pelo atrevimento; não lhes diz: «Como ousais pedir isso? Parai de sonhar com essas coisas!» Jesus não derruba os seus sonhos, mas corrige-os quanto ao modo de os realizar; aceita o seu desejo de chegar ao cimo, mas insiste numa coisa, que devem ter bem em mente: uma pessoa não se torna grande passando por cima dos outros, mas abaixando-se para os outros; não à custa dos outros, mas servindo os outros (cf. Mc 10, 35-45).

Vede, amigos! Jesus fica feliz, se alcançarmos metas altas. Não nos quer preguiçosos e inativos, não nos quer calados e tímidos; quer-nos vivos, ativos, protagonistas. E nunca desvaloriza as nossas expetativas; mas, ao contrário, eleva o nível dos nossos anseios. Jesus estaria de acordo com um provérbio vosso (espero pronunciá-lo bem!): Aki mer az nyer [quem ousa, vence].

Mas como se faz para vencer na vida? Há duas coisas fundamentais, como no desporto: primeira, apostar alto; segunda, treinar-se. Apostar alto. Possuis um talento? De certeza que o tens! Não o ponhas de lado, pensando que, para ser feliz, basta o mínimo indispensável: um diploma, um emprego para ganhar dinheiro, divertir-se um pouco... Não basta! Põe em campo aquilo que tens. Possuis uma qualidade boa? Investe nela, sem medo. Sentes no coração que possuis uma capacidade que pode ser benéfica para tanta gente? Sentes que é belo amar o Senhor, criar uma família numerosa, ajudar os necessitados? Não penses que são desejos irrealizáveis, mas investe sobre os grandes objetivos da vida! E, depois, treinar-se. Como? Em diálogo com Jesus, que é o melhor treinador possível: ouve-te, motiva-te, acredita em ti, sabe como tirar o melhor de ti. E sempre nos convida a fazer equipe: nunca sozinhos, mas com os outros; na Igreja, na comunidade, juntos, vivendo experiências comuns.

Penso, por exemplo, nas Jornadas Mundiais da Juventude, e aproveito a ocasião para vos convidar para a próxima, que será em Portugal, na cidade de Lisboa, nos primeiros dias de agosto.

Hoje, porém, a grande tentação é contentar-se com um telemóvel e qualquer amigo. Embora seja isto o que muitos fazem e ainda que seja também o que te apetece fazer, todavia isso não te fará feliz.

Há ainda um elemento importante no treino que se deve cuidar, um elemento que tu, Krisztina, nos lembraste ao dizer que hoje, no meio de corridas sem conta, tanto frenesim e velocidade, há uma coisa essencial que falta aos jovens, e também aos adultos. Eis as tuas palavras: «Não reservamos tempo para o silêncio no meio do barulho, porque temos medo da solidão e, depois, acabamos o dia a dia esgotados». Deixai que vos diga: nisto, não tenhais medo de ir contracorrente, encontrando diariamente um tempo de silêncio a fim de parar e rezar.

Hoje tudo nos diz que é preciso ser rápido, eficiente, praticamente perfeito, como máquinas. Mas depois damo-nos conta de que muitas vezes ficamos sem gasolina e não sabemos o que fazer. É bom saber parar para abastecer, para recarregar as baterias. Mas – atenção! - não é para mergulhar nas próprias melancolias ou ruminar as próprias tristezas, não é para pensar em quem me fez isto ou aquilo, elaborando teorias sobre o modo como se comportam os outros; isso não te faz feliz!

O silêncio é o terreno onde se pode cultivar relações benéficas, porque nos permite confiar a Jesus aquilo que vivemos, apresentar-Lhe rostos e nomes, entregar-Lhe as preocupações, lembrar os nossos amigos e rezar por eles. O silêncio dá-nos a possibilidade de ler uma página do Evangelho que fala à nossa vida, de adorar a Deus reencontrando assim a paz no coração. O silêncio permite-nos pegar num livro que não somos obrigados a ler, mas que nos ajuda a conhecer o espírito humano, permite-nos observar a natureza para não viver apenas em contacto com coisas feitas pelos homens mas descobrir também a beleza que nos rodeia. Contudo o silêncio não é para se ficar preso ao telemóvel e às redes sociais. Isso não, por favor! A vida é real, não virtual; não acontece num visor, mas no mundo!

Assim o silêncio é a porta da oração, e a oração é a porta do amor. Dóra, quero agradecer-te por teres falado da fé como duma história de amor, onde dia a dia enfrentas as dificuldades da adolescência, mas sabendo que está contigo Alguém, Alguém para ti, e que esse Alguém – Jesus – não tem medo de superar contigo todo e qualquer obstáculo que encontres. A oração ajuda a fazê-lo, porque é diálogo com Jesus, tal como a Missa é encontro com Ele, e a Confissão o abraço que se recebe d’Ele.

Vem-me à mente o vosso grande músico Ferenc Liszt. Durante uma limpeza do seu piano, foram encontradas algumas contas do terço que, talvez por ter rebentado, caíram lá dentro. É um indício que nos faz pensar como ele, antes duma composição ou dum concerto, e talvez mesmo depois dum momento de diversão no piano, tivesse o hábito de rezar: falava ao Senhor e a Nossa Senhora daquilo que amava e colocava a sua arte e os seus talentos na oração. Quando rezardes, não tenhais medo de levar até Jesus tudo o que se passa no vosso mundo interior: afetos, medos, problemas, expetativas, recordações, esperanças. A oração é diálogo, é vida.

Bertalan, hoje não tiveste vergonha de nos contar a todos a ansiedade que às vezes te paralisa e as dificuldades que sentes para te aproximares da fé. Como é belo ter a coragem de ser verdadeiro, que não significa mostrar que nunca se tem medo, mas abrir-se e partilhar as próprias fragilidades com o Senhor e com os outros, sem esconder, nem disfarçar, nem usar máscaras. Como vemos narrado em cada página do Evangelho, o Senhor faz coisas grandes, não com pessoas extraordinárias, mas com pessoas verdadeiras. Pelo contrário, quem se apoia nas próprias capacidades e vive de aparências para ser bem visto, mantem Deus longe do coração. Jesus, com as suas perguntas, o seu amor, o seu Espírito, escava dentro de nós para nos tornar pessoas verdadeiras. E hoje há tanta necessidade de pessoas verdadeiras!

A propósito, impressionou-me aquilo que disseste tu, Tódor, partindo do nome que recebeste em honra do Beato Teodoro, um grande Confessor da fé que nos chama a não nos contentarmos com meias medidas. Quiseste «fazer soar o despertador», dizendo que o zelo pela missão é anestesiado pelo nosso viver em segurança e conforto, enquanto a poucos quilómetros daqui, na ordem do dia, temos a guerra e o sofrimento. Daí o convite: assumir a vida, para ajudar o mundo a viver em paz. Para isso, deixemo-nos desinquietar. Cada um de nós interrogue-se: Que faço pelos outros, pela Igreja, pela sociedade? Vivo a pensar só no meu bem ou arrisco pelos outros, sem me cingir aos meus interesses? Interroguemo-nos sobre a nossa gratuidade, sobre a nossa capacidade de amar segundo Jesus, isto é, servir.

Queridos amigos, há uma última coisa que quero partilhar convosco: uma página do Evangelho, que resume tudo o que dissemos. Há ano e meio, estive aqui para o Congresso Eucarístico; ora, no capítulo VI do Evangelho de João, há uma bela página eucarística em cujo centro aparece um jovem. Lá se fala dum rapaz que estava no meio da multidão a escutar Jesus. Provavelmente pensou que o encontro se ia prolongar muito e, previdente que era, trouxe o almoço consigo. Ora Jesus, compadecido da multidão, quer alimentá-la; então, com o seu estilo, interroga os discípulos para despoletar as suas energias. Pergunta a um deles como fazer para isso, e chega a resposta dum «contabilista»: «duzentos denários de pão não chegam para cada um comer um bocadinho» (Jo 6, 7). Por outras palavras, matematicamente é impossível! Entretanto, outro vê aquele rapaz e faz uma constatação, embora também ela pessimista: «Há aqui um rapazito que tem cinco pães de cevada e dois peixes. Mas que é isso para tanta gente?» (6, 9). Ao contrário, para Jesus bastam e sobram para realizar o famoso milagre da multiplicação dos pães e dos peixes.

O Evangelho, porém, não especifica um detalhe, que deixa à nossa imaginação: como conseguiram os discípulos convencer aquele jovem a dar tudo o que tinha? Talvez lhe tenham pedido para disponibilizar o seu almoço; ele olhou em redor vendo milhares de pessoas e terá talvez respondido, como eles, dizendo: «Não basta, porque me pedis a mim e não vos encarregais vós próprios, que sois os discípulos de Jesus?» Então ter-lhe-ão dito que foi o próprio Jesus que pediu. E o rapaz faz uma coisa extraordinária: confia, dá tudo, não guarda nada para si. Veio para receber de Jesus e vê-se na situação de dar a Jesus. Mas é assim que acontece o milagre. Nasce da partilha: a multiplicação realizada por Jesus começa pela partilha daquele jovem com Ele a favor dos outros. O pouco daquele rapaz nas mãos de Jesus torna-se muito.

É aqui que conduz a fé: à liberdade de dar, ao entusiasmo do dom, à superação dos medos, a pôr-se em jogo! Amigos, cada um de vós é precioso para Jesus, e também para mim! Lembra-te que ninguém pode ocupar o teu lugar na história da Igreja e do mundo: ninguém pode fazer aquilo que só tu podes fazer. Ajudemo-nos, então, a crer que somos amados e preciosos, que fomos feitos para grandes coisas. Rezemos por isso e encorajemo-nos a isso! E recordai-vos também de fazer bem a mim com a vossa oração. Köszönöm [obrigado]!

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