“Muito me marcou a pessoa e o ministério de são João Paulo II”, escreveu o bispo auxiliar de Lisboa, Portugal, dom Daniel Batalha Henriques, em seu testamento espiritual. Ele morreu de câncer, em novembro de 2022, aos 56 anos. O testamento foi divulgado pelo patriarcado de Lisboa ontem (30), data do aniversário natalício do bispo auxiliar.

Em uma nota introdutória ao seu testamento espiritual, dom Henriques falou sobre sua relação com são João Paulo II, desde a infância, passando pela adolescência, sacerdócio, episcopado, até o momento de sua doença.

O bispo recordou que o pontificado de João Paulo II começou quando ele tinha “apenas doze anos de idade e a sua morte quando já contava trinta e nove”. Disse dever ao papa polonês as “mais fortes interpelações vocacionais” quando acompanhou “o atentado à sua vida”, em 1981, e também quando, “ainda adolescente”, participou de um encontro de jovens com o papa em Portugal, em 1982.

Também recordou quando, em 1991, “padre há apenas um ano”, celebrou a missa com João Paulo II em Portugal, ocasião em que renovou “a decisão de viver a condição de padre em obediência e comunhão com o Santo Padre e com o meu bispo”.

“A S. João Paulo II muito devo na forte marca que deixou em mim, na pujança da vida e das minhas capacidades pastorais, o avançar da sua doença, o caminho de progressiva debilidade e o forte testemunho de grandeza espiritual que nos legou até ao dia da sua morte”, escreveu dom Daniel Henriques.

“De fato, o ministério do papa, dos bispos e dos sacerdotes nunca esteve, não está, nem estará nas suas capacidades e possibilidades humanas, mas na poderosa ação de Deus que se manifesta tão mais excelentemente quanto autêntica e elevada for a nossa humildade”, acrescentou.

O bispo recordou o funeral de João Paulo II, em 8 de abril de 2005, “sem qualquer triunfalismo nem exaltação”, quando multidões foram se despedir do papa. “Marcou-me para sempre sobre a certeza de que a nossa verdadeira grandeza é servir e dar a vida, como Jesus, apagando-nos depois como uma vela que não deixa de iluminar até à última gota de cera”, disse.

Para ele, a beatificação de João Paulo II, em 2011, e a canonização, em 2013, “vincaram esta grande certeza de que só a santidade merece ocupar em nós o lugar supremo nesta vida e só essa Graça devemos pedir, sabendo que será sempre obra divina nas vidas simples e humildes”.

Dom Henriques lembrou ter lido o testamento de João Paulo II “como uma obra póstuma que constitui como que uma sumula admirável pela sua fé, humildade e despojamento”, o que o edificou.

Por isso, contou, pensava em também escrever o seu testamento espiritual. “O admirável Deus da bondade e das surpresas isto precipitou com os acontecimentos dos últimos meses: a minha nomeação episcopal pelo papa Francisco, a 13 de outubro de 2018 e, dez meses depois, a notícia de que tenho um tumor maligno no cólon com várias metástases no fígado”, disse.

O bispo recordou que, “ainda abalado com a notícia”, partiu para o curso dos novos bispos em Roma, onde pôde visitar a basílica de São Pedro, se confessar e rezar “abundantemente diante do túmulo de são João Paulo II, relendo o seu testamento e tomando a decisão de não adiar mais este meu intento”.

Pouco mais de um mês depois, retornou a Roma para o consistório em que o também português dom José Tolentino foi criado cardeal. Mas, não chegou a participar da cerimônia, pois teve que ser internado para uma operação de urgência no hospital Gemelli. “Quis a providência que fosse intervencionado no hospital e fizesse a convalescença no mesmo piso e quarto onde são João Paulo II fora internado por ocasião do seu atentado”, contou.

“No dia 18 de outubro tive finalmente alta médica e, no dia 20, pude concelebrar com o papa Francisco a eucaristia na capela de Santa Marta. Precisamente no dia em que a Igreja celebra a festa de são João Paulo II! Tudo sinais admiráveis de como a bondade de Deus se espelha e reflete na vida e intercessão dos santos, nossos amigos muito queridos”, completou.

Além da nota introdutória, o testamento espiritual de dom Henriques inclui um texto escrito entre setembro de 2019 e a Quaresma de 2020 e outro escrito na Quaresma de 2022, por ocasião do retiro anual dos bispos, em Fátima.

No primeiro texto, ele recordou sua família, a formação e o ministério sacerdotal, o chamado ao episcopado e o ministério episcopal. No segundo, lançou o olhar para sua doença.

Dom Henriques disse ter compreendido que o câncer era “uma nova missão” que Deus o confiava, “uma missão específica dentro do chamamento ao episcopado”. Para o bispo, essa nova missão consistia na “proximidade com quem mais sofre, o testemunho de confiança na adversidade, a experiência da alegria inefável que nasce da Esperança cristã, a certeza Pascal da vitória da Vida sobre a morte, a fecundidade da doença tornada dom salvífico, quando me uno a Vós”.

O bispo disse acreditar que morreria naquele ano de 2022. “Vós, Senhor, que sois o Senhor das estatísticas, me direis a seu tempo o que esperais de mim e da minha pobre vida nesta terra. Por tudo, sempre Vos louvarei. Apenas Vos peço que, hoje e sempre, não afasteis de mim o Vosso olhar misericordioso e que a Vossa Graça me fortaleça no combate contra as investidas do Tentador que, ‘como leão, anda à nossa volta procurando a quem devorar’ (I Pe 5,8). Ámen”, concluiu.

A íntegra do testamento espiritual de dom Daniel Batalha Henriques pode ser lida AQUI.

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