Em 16 de fevereiro, dois católicos britânicos foram absolvidos de todas as acusações relacionadas a rezar do lado de fora de uma clínica de aborto em Birmingham, na Inglaterra.

 

Um dos dois absolvidos foi o padre Sean Gough, da arquidiocese de Birmingham.

 

O comparecimento do padre em um tribunal criminal ocorreu devido a uma lei relativamente nova: o Ato de Policiamento de Crime e Comportamento Anti-Social de 2014, que cria Ordens de Proteção de Espaços Públicos (PSPO, na sigla em inglês). Segundo o site do governo local, uma PSPO “serve para combater comportamento anti-social" e tem como objetivo “garantir que espaços públicos possam ser desfrutados livres de comportamento anti-social”.

 

Essas leis foram usadas para silenciar testemunhos pró-vida perto de clínicas de aborto.

 

Em 9 de fevereiro, o padre Gough estava perto de uma clínica de aborto em Station Roads, na região de Kings Norton em Birmingham. Ele segurava uma placa que dizia: “Orando pela liberdade de expressão”. Logo depois, o padre foi abordado por policiais que acreditavam que ele estava desrespeitando a PSPO. O padre Gough foi interrogado em uma delegacia. Policiais o questionaram sobre a sua placa e suas ações e, em seguida, o acusaram do crime de “intimidar usuários do serviço” da clínica de aborto. Foi dito pela polícia que o padre enfrentava uma segunda acusação relacionada a um adesivo em seu carro estacionado que dizia: “Vidas não nascidas importam”.

 

Aparentemente, as acusações contra o padre Gough não foram levadas adiante devido a “evidências insuficientes”. No entanto, o Crown Prosecution Service, ministério publico na Inglaterra e no País de Gales, reservou-se ao direito de restabelecer as acusações se novas evidências vierem à tona. Portanto, uma nova audiência no tribunal foi necessária para garantir que nenhuma acusação adicional pudesse ser feita nessas questões. Na audiência no Tribunal de Magistrados em Birmingham em 16 de fevereiro, o padre foi representado por advogados do escritório de advocacia Alliance Defending Freedom (ADF UK). Ao final da audiência, todas as acusações contra o padre Gough foram retiradas.

 

Ainda permanece a controvérsia se o caso deveria ter sido apresentado. Após a audiência, o advogado do padre Gough, Jeremiah Igunnubole, da ADF UK, disse que o Parlamento britânico “está considerando o lançamento de uma legislação de censura, que pode levar a mais situações em que os pensamentos das pessoas sejam julgados”.

 

“Sejamos claros: se o padre Sean estivesse parado no mesmo lugar com pensamentos diferentes, provavelmente não teria sido preso. O processo judicial de hoje é de grande significado cultural. Não estamos em 1984, mas em 2023 – ninguém deve ser criminalizado por seus pensamentos, por suas orações, por sua expressão pacífica em uma rua pública”, acrescentou Igunnubole em uma declaração após a audiência no tribunal.

 

Então, quem é o padre que está no centro disso tudo?

 

“Sou de Walsall, nas West Midlands da Inglaterra. Fui criado em uma família católica, mas só comecei a rezar por volta dos dez anos. Quando comecei a rezar, meu relacionamento com Deus começou a crescer. Minha consciência de que Deus poderia estar me chamando para servi-lo como sacerdote também surgiu…  Aos 23 anos, decidi candidatar-me ao seminário, embora não tivesse certeza de que Deus queria que eu fosse padre. Rapidamente,após ingressar no seminário, percebi que era o caminho certo, especialmente por ver em primeira mão a diferença que o ministério sacerdotal faz na vida das pessoas”, disse o padre Gough ao jornal National Catholic Register, da EWTN, empresa de comunicação católica a que pertence ACI digital.

 

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Espera-se que um padre católico seja pró-vida. Para o padre Cough, no entanto, a questão do aborto é pessoal.

 

“Fui concebido num contexto de violência, e minha mãe escolheu a vida por mim. Nasci em circunstâncias em que era impossível considerar o dom de minha vida como garantido”, explicou.

 

Este conhecimento o inspirou a dedicar grande parte de seu ministério sacerdotal a apoiar mulheres em circunstâncias difíceis, especialmente mulheres grávidas.

 

“Através de meu trabalho com o Rachel's Vineyard, um ministério que apoia mulheres e homens afetados pelo trauma e pelo luto do aborto, pude ver em primeira mão que há mágoa e dor a serem encontradas no aborto, mas também esperança e cura depois dele”, diz o padre.

 

Ele sente que desempenha um “pequeno papel na vida dessas mulheres e homens”, e que é isso que o motiva “a ficar próximo à causa pró-vida” e torna a questão extremamente pessoal para ele.

 

“Fui ameaçado de prisão, interrogado pela polícia sob cautela e acusado criminalmente por oração silenciosa, o que, por si só, para um padre, nas palavras de hoje, é uma ocorrência bizarra e distópica”, disseo padre Gough.“Tive a sensação de que foi a isso que fui chamado para defender neste momento: a liberdade de expressão e o direito humano fundamental à vida de todas as pessoas, nascidas e não nascidas, apoiando-me firmemente em minhas crenças, enraizadas em minha fé católica. Senti paz durante todo esse processo”.

 

Dito isso, fica claro que o episódio foi inquietante para ele, e as implicações para a liberdade de expressão sobre a questão do aborto no Reino Unido são preocupantes para todos.

 

“Há algo claramente orwelliano que não se encaixa em ser alvo de sanções legais por orar silenciosamente. A absolvição que recebi do tribunal confirma que a oração nunca pode ser um crime, mas à medida que avançamos com a possível legalização de zonas de censura em todo o país, este é realmente apenas o começo da questão”, acrescenta o sacerdote.

O padre Gough fez a observação reveladora de que, em sua opinião, a natureza ligeiramente absurda de sua acusação é uma tática deliberada.

“Este caso ficou no sistema por cerca de dois meses e meio. Não podemos perder de vista o quão absurdamente custoso isso é, por não ter cometido nenhum crime em primeiro lugar. O próprio processo tornou-se a punição quando se trata de infringir a censura sancionada pelo governo”, continua.“As últimas semanas foram difíceis. Ninguém deveria ser criminalizado pelos pensamentos que tem ou por suas orações, mas fui tratado como um criminoso por isso. Mesmo que as acusações tenham sido retiradas, é horrível ter que se defender na polícia e nos tribunais por nada mais do que rezar silenciosamente em uma rua pública”.

Grato pelo apoio recebido de pessoas de todo o mundo, a esperança do padre Gough é de que o Parlamento britânico não estenda as PSPOs.

“Infelizmente, o caso do padre Gough indica que mais situações desse tipo venham a acontecer, pois nosso parlamento considera estender zonas de censura em todo o país”, disse Lois McLatchie, oficial de comunicações da ADF Internacional, ao Register.

Ela acrescenta que uma disposição dentro da proposta de Lei de Ordem Pública proibiria qualquer forma de “influência” do lado de fora das clínicas de aborto.

“Essa proibição vagamente redigida não só poderia resultar na primeira legislação do Reino Unido sobre 'crime de pensamento', ao proibir a oração silenciosa - como também poderia resultar na proibição de conversas pacíficas e consensuais. As zonas de censura não são ‘pró- escolha', elas não têm escolha. Elas removem opções viáveis ​​de mulheres que enfrentam gestações em crise”, explica McLatchie.

“Toda pessoa tem o direito de pensar, orar e agir pacificamente de acordo com suas convicções no espaço público. Minha grande esperança é que minha história ajude a contribuir para o reconhecimento de que uma sociedade livre não deve censurar pensamentos ou expressões pacíficas e abra caminho para um mundo em que todas as vidas sejam protegidas e todas as mulheres e suas famílias sejam apoiadas em acolher a vida neste mundo”, diz o padre Gough.

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