Que um cardeal deseje mudar o ensinamento da Igreja sobre a moralidade dos atos sexuais entre pessoas do mesmo sexo não é novidade. Mas um dos mais novos membros do colégio de cardeais decidiu aderir.

 

O cardeal Jean-Claude Hollerich, criado cardeal pelo papa Francisco em 2019 e nomeado relator geral do Sínodo sobre a Sinodalidade, tem defendido essa mudança alegando que o “fundamento sociológico-científico desse ensinamento não é mais correto.”

 

Agora, o cardeal Robert McElroy, bispo de San Diego criado cardeal pelo papa Francisco em agosto passado, uniu-se ao cardeal Hollerich em um amplo ensaio na revista jesuíta dos EUA America na última terça (24). O cardeal McElroy alega que o Sínodo da Sinodalidade é um momento oportuno para revisitar – e revisar – algumas doutrinas da Igreja. Entre elas está a questão da ordenação sacerdotal de mulheres, mas seu foco principal é a “inclusão radical de pessoas LGBT”.

 

Houve muitas reações e outras certamente se seguirão ao ensaio. Aqui gostaria apenas de chamar a atenção para um aspecto da abordagem pastoral do cardeal McElroy: a abolição da castidade.

 

O cardeal McElroy, em sua discussão sobre a Sagrada Comunhão, se opõe ao ensinamento católico tradicional de que “todas as ações sexuais fora do casamento são tão gravemente más que constituem objetivamente uma ação que pode cortar o relacionamento de um crente com Deus”, pecado mortal, na linguagem usual.

 

“Essa objeção deve ser enfrentada de frente”, escreve o cardeal. Um trecho do seu ensaio diz: “A distinção entre orientação e atividade não pode ser o foco principal para tal abraço pastoral porque inevitavelmente sugere dividir a comunidade LGBT entre aqueles que se abstêm de atividade sexual e aqueles que não o fazem. Em vez disso, a dignidade de cada pessoa como filho de Deus que luta neste mundo, e o amoroso alcance de Deus, devem ser o coração, a alma, o rosto e a substância da postura e da ação pastoral da igreja.

 

Na prática pastoral tradicional, os dois fatores devem andar juntos: afirmar a dignidade de cada pessoa e ao mesmo tempo aconselhar que atos pecaminosos sejam evitados.

 

Essa distinção pode não ser o “foco principal”, o foco principal é sempre o amor e a misericórdia de Deus, mas a distinção é pastoralmente essencial.

 

Existem inúmeros pecados sexuais — sendo a pornografia, a masturbação e a fornicação os mais comuns — onde a distinção entre uma orientação, uma disposição, um desejo, um hábito e um determinado ato, é fundamental.

 

Não sei como os cursos pré-matrimoniais são feitas em San Diego, mas presume-se que a coabitação e a fornicação sejam abordadas. A “distinção entre orientação e atividade” não se aplica apenas à homossexualidade.

 

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Os noivos heterossexuais certamente são orientados para a união conjugal, mas a união conjugal real é pecaminosa antes do casamento. Eu concordaria que este não deveria ser o “foco principal” da preparação para o casamento, mas é difícil deixar esse tema de lado por medo de “dividir” as classes pré-matrimoniais entre aqueles que estão lutando pela castidade e aqueles que não estão.

 

Abandonar a distinção entre “orientação e atividade” em questões sexuais significa o fim da castidade como uma virtude a ser almejada. Ou, pelo menos, implica uma visão de que “a comunidade LGBT” não é capaz de ser casta e, portanto, um evangelho diminuído deve ser pregado a ela.

 

Uma nota final sobre o próprio cardeal McElroy. Sua criação como cardeal em agosto passado foi digna de nota. O arcebispo José Gómez, de Los Angeles – chefe da maior diocese dos EUA, então presidente da USCCB, imigrante mexicano e defensor dos imigrantes – foi preterido em favor do bispo de San Diego.

 

Para um papa cuja frase favorita é o santo pueblo fiel de Dios - o santo povo fiel de Deus - preferir McElroy a um bispo latino foi curioso. No mesmo dia em que o ensaio do cardeal McElroy foi publicado, o papa concedeu uma entrevista à agência de notícias Associated Press em que acusou o “caminho sinodal” alemão de ser “elitista”.

 

Parece que algo semelhante poderia ser dito sobre o desejo do cardeal McElroy de usar o Sínodo da Sinodalidade para abolir a castidade. E não há bispo americano mais elitista do que o cardeal McElroy, com diplomas de Harvard, Stanford, Berkeley e da Pontifícia Universidade Gregoriana em Roma, administrada pelos jesuítas.

 

Quando McElroy foi criado cardeal em San Diego, alguns se perguntaram se isso poderia ser uma repetição do que o papa Francisco fez ao criar Joseph Tobin cardeal enquanto ainda era arcebispo de Indianápolis. Logo depois, o cardeal Tobin foi transferido para Newark. O novo cardeal de San Diego poderá em breve estar a caminho de Washington ou de volta a Harvard, como arcebispo de Boston?

 

Pode ser que o cardeal McElroy tenha uma visão além disso. Seria o ensaio sobre “inclusão radical” um pedido para ser transferido para a Alemanha?

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