Já era muito esperado que uma grande reforma da diocese de Roma estava por vir, já que o papa Francisco vinha pensando nisso há algum tempo.

 

Mas ninguém esperava que isso acontecesse em 6 de janeiro, um dia após o funeral do antecessor de Francisco como bispo de Roma, o papa emérito Bento XVI.

 

Com a reforma, o papa Francisco assume firmemente as rédeas do vicariato, da hierarquia, da diocese. Tudo está centralizado, e tudo deve passar, ao menos formalmente, pelo controle do papa.

 

O vigário do papa para a diocese de Roma, atualmente o cardeal Angelo de Donatis,teve seu papel profundamente diminuído. Os bispos auxiliares da diocese reforçam seu vínculo direto com o papa. No fim, o papa deixou claro que ele também preside formalmente o conselho episcopal, órgão criado como “expressão da sinodalidade”.

 

A última reforma da estrutura do vicariato de Roma foi feita pelo papa são João Paulo II em 1998, com a constituição apostólica Ecclesia in Urbe. Para a nova reforma, o papa Francisco copia e cola várias passagens desse documento. Em alguns casos, elas foram minimamente reescritas para enfatizar alguns detalhes em vez de outros. Em outros casos, foram feitas mudançasmaiores, mas que pouco fizeram para alterar a substância básica das coisas.

 

A reforma apresenta duas características gerais da forma de legislar do papa Francisco: fazer uso de conselhos e comissões e exigir que esses órgãos se reportem diretamente a ele.

 

É claro que o papa é o bispo de Roma e que o vigário do papa para a diocese de Roma é o seu auxiliar. O papa Francisco, porém, neste caso, vai mais longe, incluindo na constituição um decreto que define diretamente as áreas de competência dos bispos auxiliares.

 

Assim, o papa Francisco mostra uma vontade de exercer maior controle pessoal sobre tudo o que acontece no vicariato. Ao mesmo tempo, essa escolha também mostra uma “quebra” na relação de confiança do papa com o seu vigário, o cardeal Donatis.

 

Embora Francisco tenha chamado Donatis para pregar em retiros na Cúria Romana em 2014, ele nunca foi o candidato do papa para suceder o cardeal Vallini como vigário. O papa queria o cardeal Paolo Lojudice.

 

Francisco, no entanto, quis primeiro consultar os párocos de Roma, e 80% delespreferiram Donatis. Era impossível para o papa não os ouvir. Ele nomeou De Donatis vigário e fez Lojudice arcebispo da prestigiada diocese de Siena. Ambos foram criados cardeais.

 

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Em maio de 2022, na assembléia geral da Conferência Episcopal Italiana (CEI), ficou claro que Francisco preferia Lojudice como presidente da CEI.

 

O plano era nomear Lojudice vigário da diocese de Roma para suceder Donatis, que havia encerrado seu mandato de cinco anos. Lojudice se tornaria o principal contato do papa tanto em Roma quanto entre os bispos italianos.Donatis teria sido nomeado penitenciário no lugar do cardeal Mauro Piacenza, que completou 78 anos agora.

 

Os bispos italianos, no entanto, escolheram o arcebispo de Bolonha, cardeal Matteo Zuppi, como presidente da CEI.

Lojudice também não se tornou vigário da Diocese de Roma, como todos supunham que aconteceria. Enquanto isso, a relação de confiança entre Donatis e o papa parece ter sido interrompida em 2020, quando, no início das restrições contraa covid-19, Donatis decidiu fechar as igrejas de Roma. Quando o Papa Francisco, mais tarde,falou da inconveniência de fechar igrejas, Donatis retirou o decreto, mas disse que todas as decisões tinham sido tomadas de coum acordo com o papa.

O papa agora parece decidido a mudar de vigário este ano, quando o mandato de Donatis expirar. Uma indicação disso é o fato de que no decreto em que o papa define a área e as competências pastorais dos bispos auxiliares, Donatis não é mencionado como vigário. Pode-se considerar sua presença como certa, é claro, mas a interpretação geral é de que a mudança será feita.

 

Opapa francisco extinguiu a figura doprelado secretário-geral, e deuao vice-gerente (substituto do vigário) a administraçãodos escritórios da Secretaria-Geral. O secretário do prelado tinha também a função de moderador da Cúria. Neste caso, tudo é confiado ao vice-gerente, que assim tem as suas funções e o seu peso ampliados.

O papa escolheu o vice-gerente entre os bispos auxiliares e, neste caso, Baldassare Reina foi escolhido. O bispo Reina não vem da diocese de Roma, mas foi chamado de Agrigento. A lógica do papa é quebrar possíveis cadeias de poder ao trazer forças novas e estrangeiras.

A escolha de um novo pároco é confiada a um longo processo que deve, em todo caso, ser submetido ao papa, que age como o verdadeiro e próprio bispo de Roma sem depender do vigário, que fica com a nomeação de párocos auxiliares.

O artigo 20 da constituição exige que um relatório para cada candidato ao sacerdócio ou diaconato seja apresentado antes da ordenação. Além disso, neste caso, os candidatos devem ser apresentados pelo cardeal vigário ao papa, e somente após obter o consentimento do conselho episcopal. Portanto, o vigário parece ser praticamente um comissário: ele não escolhe os candidatos, mas os submete ao papa e só pode apresentá-los depois que o conselho episcopal validar a escolha.

O conselho é definido como o "primeiro órgão da sinodalidade" e deve reunir-se "pelo menos três vezes por mês", presidido pelo papa. Somente na ausência do papa o cardeal vigário pode presidir o conselho, que é composto pelo vice-gerente e pelos bispos auxiliares. No entanto, o papa quer receber "a agenda de cada reunião o mais rápido possível".

Por fim, há também o estabelecimento de uma comissão fiscalizadora independente. Ela um regulamento que deve ser "aprovado pelo papa" e seis membros nomeados pelo papa que poderão permanecer no cargo por no máximo dois mandatos de cinco anos.

Acrescenta-se também o serviço para a proteção de menores e pessoas vulneráveis, que “reporta ao Conselho Episcopal, por meio do bispo auxiliar nomeado por mim”, decretou o papa.

A constituição também redistribui as áreas e ofícios da Cúria do Vicariato, e o decreto que a acompanha atribui a cada bispo auxiliar uma tarefa específica.

Tudo agora deve passar pelas decisões do papa. Antes, o cardeal vigário gozava de confiança e certa autonomia. Pela primeira vez, porém, o vigário do papa é definido como "auxiliar". Ele é, portanto, um auxiliar entre os auxiliares, com considerável redução de influência.

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