A Cúria Geral da Companhia de Jesus (jesuítas) publicou uma cronologia das investigações sobre as acusações contra o padre e artista plástico Marko Rupnik, acusado de ter abusado de ao menos nove consagradas, embora uma fonte se refira a pelo menos 20 mulheres adultas.

Rupnik é famoso por suas obras de arte espalhadas pelo mundo, que incluem os mosaicos das fachadas da basílica de Nossa Senhora Aparecida, em Aparecida (SP), cuja primeira parte foi inaugurada em março último. Rupnik recebeu o título de doutor honoris causa da Pontifícia Universidade Católica do Paraná em cerimônia do dia 30 de novembro último. Também foi encarregado de criar a imagem oficial do X Encontro Mundial das Famílias (EMF) que aconteceu em Roma de 22 a 26 de junho de 2022.

A agência Associated Press (AP) publicou na segunda-feira (19) trechos de duas cartas do bispo auxiliar de Roma e comissário da Santa Sé para a Comunidade de Loyola, dom Daniele Libanori, que confirmou a veracidade dos abusos contra as consagradas de que é acusado Rupnik.

O caso do padre jesuíta, cofundador da Comunidade Loyola na Eslovênia na década de 1980, foi denunciado pela imprensa italiana no início deste mês.

Na cronologia publicada pelos jesuítas no domingo (18), especifica-se que na realidade não é uma, mas duas investigações que foram feitas com Rupnik.

"Absolvição de um cúmplice num pecado contra o sexto mandamento"

O sexto mandamento da Igreja Católica é "Não cometerás atos impuros".

Antes da publicação da cronologia, o superior geral dos Jesuítas, padre Arturo Sosa, confirmou que Rupnik foi excomungado por confessar uma das suas vítimas. Confessar e absolver um cúmplice acarreta excomunhão automática. A sentença foi revertida mais tarde com a confissão e arrependimento de Rupnik.

A cronologia desta primeira investigação contra Rupnik, segundo os jesuítas, é a seguinte:

- Outubro de 2018: “As acusações de absolvição de um cúmplice do padre Rupnik em um pecado contra o sexto mandamento são recebidas pelo delegado da Cúria SJ para as casas internacionais em Roma. A Companhia abre uma investigação preliminar”.

- Maio de 2019: “A investigação considera as acusações confiáveis. Um dossiê é enviado para a CDF”, ou seja, à Congregação para a Doutrina da Fé, atualmente Dicastério para a Doutrina da Fé.

- Junho de 2019: “O padre Verschueren, superior mor da DIR, impõe restrições”. Os jesuítas não precisam quais são.

- Julho de 2019: “A CDF solicita à Companhia que instaure um processo penal administrativo”.

- Janeiro de 2020: “Os juízes (todos externos da Companhia de Jesus) dizem unanimemente que de fato houve uma absolvição de um cúmplice”.

- Maio de 2020: “A CDF emite um decreto de excomunhão; a excomunhão é revogada por um decreto da CDF mais tarde, no mesmo mês”.

Em declarações à AP, o padre Arturo Sosa, superior geral dos Jesuítas, disse que de fato Rupnik “foi excomungado. Como uma excomunhão é levantada? A pessoa tem que reconhecê-lo e tem que se arrepender, e isso aconteceu".

Mesmo esse caso de Rupnik tendo envolvido uma mulher adulta, a Igreja considera abuso sexual uma relação sexual em que haja diferença de poder e autoridade, como entre um fiel católico e um padre, um diretor espiritual ou um superior. 

Por ter confessado a uma mulher com quem teve relações sexuais, padre Rupnik incorreu em excomunhão automática, conhecida no direito da Igreja Católica como latae sententiae.

Ao contrário do abuso sexual adulto, uma excomunhão latae sententiae não prescreve até que o papa ou alguém nomeado diretamente por ele emita um decreto de absolvição, geralmente por meio da Penitenciária Apostólica.

Ao responder sobre se o papa Francisco sabia ou interveio no caso do padre Marko Rupnik, o superior da Companhia de Jesus disse que "poderia imaginar" que o prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé, cardeal Luis Ladaria, também jesuíta, teria comunicado a decisão.

Mais em

A cronologia jesuíta não menciona o papa Francisco em nenhum momento.

“Acusações contra o padre Rupnik em relação aos membros da Comunidade Loyola”

- Junho 2021: “A Congregação para a Doutrina da Fé entra em contato com a Cúria Geral SJ a respeito de acusações relativas ao padre Rupnik e alguns membros da Comunidade de Loyola”.

- Julho 2021: O padre geral abre uma investigação preliminar conduzida por uma pessoa de fora da Companhia. O padre Verschueren, superior mor da DIR, impõe restrições”.

- Janeiro de 2022: “A investigação conclui que há um caso a ser resolvido. Os resultados são enviados à CDF com a recomendação para um processo penal”.

- Outubro de 2022: “O Dicastério para a Doutrina da Fé declara que as acusações em questão dizem respeito a casos que estão prescritos e não se procederá com o processo”.

- “Permanecem as restrições ao ministério do padre Rupnik impostas pelo padre Verschueren, superior mor da DIR”.

As restrições que pesam sobre Rupnik são: proibição de exercer o sacramento da confissão, a direção espiritual e o acompanhamento dos Exercícios Espirituais”. Rupnik também “foi proibido de se envolver em atividades públicas sem a permissão de seu superior local".

No entanto, o Santuário da Santa Casa de Loreto, Itália, agendou para o padre Rupnik uma jornada de exercícios espirituais de 13 a 17 de fevereiro de 2023.

A resposta dos jesuítas em Roma às acusações de abuso

Na terça-feira (20), o padre Johan Verschueren, delegado do padre geral Sosa SJ e superior mor das Casas Internacionais, explicou o sistema de resposta em Roma a denúncias de abusos, implementado em setembro de 2022.

Quando alguém escreve para teamreferente.dir@gmail.com, a mensagem vai para a equipe de resposta composta por psicólogos, guias espirituais e advogados. Um deles entra em contato com o denunciante para recolher o depoimento e é feita uma averiguação preliminar “se os fatos o parecem justificar”.

A equipe oferece ajuda e se for necessário um processo formal contra um jesuíta, é feito de acordo com a lei canónica.

“Todos nós precisamos continuar trabalhando para encontrar melhores maneiras de lidar com essas situações difíceis e garantir o reconhecimento dos fatos, justiça e um caminho para uma possível cura (reconhecendo que este pode ser um processo longo e doloroso)”, disse Verschueren.

“Estamos determinados a continuar melhorando a nossa resposta a qualquer situação de abuso e a receber todas as denúncias de forma aberta e justa”, concluiu.

Confira também: