O cardeal Fernando Filoni, prefeito emérito da Congregação para a Evangelização dos Povos, disse que o cardeal Joseph Zen Ze-kiun que está sendo julgado na China é um "homem de Deus" e "um chinês autêntico" que não deveria ser condenado. O julgamento contra o bispo emérito de Hong Kong e outros cinco acusados começou ontem (26). Todos são acusados de não terem registrado a empresa Fundo de Ajuda Humanitária 612, que prestava apoio jurídico e econômico a ativistas pró-democracia.

“Em um processo, o testemunho é fundamental. O Cardeal Zen não deve ser condenado. Hong Kong, a China e a Igreja têm nele um filho devoto, de quem não devem se envergonhar. Este é o testemunho da verdade”, disse o cardeal Filoni, também Grão-Mestre da Ordem do Santo Sepulcro, em uma carta publicada no jornal italiano Avvenire na sexta-feira (23).

No texto, o cardeal disse que, nos julgamentos, quem pode falar deve fazê-lo. Filoni falou de são João Batista, "homem que suscitou admiração e profundo respeito religioso", morreu "dando testemunho da verdade à qual ninguém é superior, reivindicando a unidade da lei divina, recebida da tradição hebraica".

“Jesus também pagou por seu testemunho da verdade. Que é a verdade?, perguntou Pilatos ironicamente em um processo dramático em que o Nazareno foi acusado de ter violado a soberania de Roma”, lembrou.

“O veredito foi proferido e Jesus foi condenado a uma morte infame; mas esse processo, nunca concluído, não será esquecido até que o Evangelho seja anunciado na terra. 'Eu sou a verdade', Jesus havia proclamado, mas na opinião de Pilatos isso não importava. E lavou as mãos", escreveu Filoni.

Filoni conheceu o cardeal Zen em Hong Kong, onde viveu por oito anos.

Zen era, então, inspetor dos Salesianos. “Muito inteligente, arguto, com um sorriso cativante. Disseram-me: 'Ele é de Xangai!' Aos poucos entendi o significado.”

Zen falava italiano perfeitamente e conhecia a cultura europeia, no entanto, "permaneceu chinês, ele nunca renunciou à sua identidade", disse Filoni.

“E isso para mim foi muito bonito e fascinante. Representou para mim o protótipo de uma interculturalidade que me lembrou Xu Guangqi, um 'cristão na corte dos Ming', ou, em outros aspectos, a sagacidade do bispo Aloysius Jin Luxian, jesuíta, bispo de Xangai no tempo de Deng Xiaoping em diante, que adorava se apresentar como o 'Nicodemos de nossos tempos'. Ambos de Xangai."

Segundo Filoni, Xangai era “uma cidade mártir na época da ocupação de estilo nazista dos japoneses. Foi um período incrivelmente triste, cheio de violência e destruição que ninguém esquece. A família do Cardeal Zen também foi vítima”.

“O jovem Zen nunca esqueceu essa experiência e tirou dela aquela coerência e modo de vida característicos”, escreveu Filoni. “E também um grande amor pela liberdade e pela justiça”.

“Xangai foi heroica, e heróis eram considerados, quase intocáveis ​​até pelo regime comunista, seus filhos. O cardeal Zen é um dos últimos discípulos dessas famílias. Os heróis nunca foram humilhados. Era a mentalidade do establishment chinês, como é no Ocidente para as vítimas do nosso nazifascismo”, acrescentou.

Em seu texto, o cardeal Filoni disse que o respeito e o apoio à pessoa sempre foram o pilar da visão humana e sacerdotal do cardeal chinês, mesmo agora em Hong Kong nestes dias em que está sendo julgado.

O cardeal italiano disse que a integridade moral do cardeal Zen foi altamente considerada quando são João Paulo II o nomeou bispo e quando Bento XVI o criou cardeal.

“Ainda tenho que testemunhar duas coisas: o Cardeal Zen é um 'homem de Deus'. Às vezes destemperado, mas submisso ao amor de Cristo, que o quis seu sacerdote, profundamente apaixonado, como dom Bosco, pela juventude. É por isso que ele era um professor confiável. Ele também é um 'verdadeiro chinês'. Ninguém, entre aqueles que conheci, posso dizer, é verdadeiramente 'leal' como ele”, disse o Cardeal Filoni.

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