A visita do papa Francisco à Hungria em setembro ameaça tornar-se um sério incidente diplomático já que ele planeja ficar três horas na capital do país, sair sem visitar o presidente e passar três dias e meio na vizinha Eslováquia. Convidado para uma visita oficial à Hungria, o papa deixou claro que só irá à missa de encerramento do Congresso Eucarístico de Budapeste na manhã de 12 de setembro.

Há muito esforço sendo feito para convencer o Papa a ficar na Hungria além da manhã e não omitir intencionalmente visitas de cortesia ao presidente János Áder, que é católico, e ao primeiro-ministro Viktor Orbán, apesar dos insistentes convites do governo húngaro para que o papa faça da estadia uma visita oficial.

“Alguma coisa aqui não está certa, pelo menos do ponto de vista da diplomacia e do protocolo”, escreveu Luis Badilla, editor do Il Sismografo, um agregador de notícias administrado pela Secretaria de Estado do Vaticano. O papa parece querer evitar reuniões políticas, daí a tensão.

Segundo o último itinerário planejado, o papa irá do aeroporto à praça dos Heróis, no centro de Budapeste, para celebrar a missa de encerramento do congresso eucarístico. Em seguida, ele parte para Bratislava, capital da Eslováquia. Desde que surgiu a possibilidade de uma visita à Hungria no ano passado, o papa deixou claro que só estaria presente no congresso eucarístico da Hungria. Falando a jornalistas no voo de volta do Iraque em 8 de março, Francisco disse: “Não farei uma visita ao país, apenas irei para a missa. Mas Budapeste fica a duas horas de carro de Bratislava: por que não visitar os eslovacos? Não sei."

“Seria ultrajante”, disse ao National Catholic Register um membro da Igreja em Budapeste ao Register. “Seria o equivalente a ele passar meio dia em Israel e depois três dias e meio no Irã, ou meio dia na Polônia e depois viajar para a Rússia por alguns dias. Todos considerariam isto inaceitável”. A Eslováquia hoje tem boas relações com Budapeste, mas o país teve uma história difícil com a Hungria.

O cardeal Péter Erdő, arcebispo de Esztergom-Budapeste, e Zsolt Semjén, um dos dois vice-primeiros-ministros da Hungria, visitaram Roma na semana passada para negociar um itinerário mais aceitável. O programa oficial da viagem deveria ter sido anunciado em 26 de maio, mas as alegadas preferências do papa levaram a atrasos e esforços intensos para fazê-lo mudar de ideia.

As diferenças políticas entre Francisco e o governo húngaro são o pano de fundo do imbroglio diplomático. O papa discordou publicamente tanto do governo de Viktor Orbán quanto de bispos da Hungria sobre a política de imigração, que contrasta com a abordagem de acolhimento e de “portas abertas” preferida pelo Papa para a questão.

Orbán é também um dos principais políticos conservadores da Europa que lutou para defender a identidade cristã da Hungria e assumiu um papel de liderança na defesa de cristãos perseguidos em todo o mundo, o que o levou a confronto com a União Europeia. Francisco vê os governos que privilegiam a soberania como governos que exibem um "nacionalismo míope, extremista, ressentido e agressivo" e que mostram “sinais de uma certa regressão".

Se for mesmo à Eslováquia como pretende, o papa será recebido pela primeira presidente mulher do país, Zuzana Čaputová, uma política de esquerda, advogada e ativista ambiental.

O Papa Francisco fez visitas curtas anteriormente a outros países por distintas razões que não constituíram uma visita oficial àqueles países: ele voou para Estrasburgo, na França, para falar no Parlamento Europeu e no Conselho da Europa em 25 de novembro de 2014, visitou a ilha grega de Lesbos em 16 de abril de 2016, para chamar a atenção para a situação dos imigrantes ali, e foi ao Conselho Mundial de Igrejas em Genebra, Suíça, para um encontro ecumênico em 21 de junho de 2018.  Nenhuma destas visitas incluiu passagens do papa pelas capitais dos países e, portanto, as visitas de cortesia a chefes de Estado não estiveram na agenda, embora o então presidente da Federação Suíça, Alain Berset, tenha ido a Genebra encontrá-lo.

Quando Francisco fez breves visitas de um dia a capitais de países europeus como Tirana, Albânia, em 21 de setembro de 2014, ou Sarajevo, capital da Bósnia e Herzegovina, em 6 de junho de 2015, fez questão de visitar e falar aos chefes de estado e às autoridades civis dos países. Assim, a visita de um papa a uma capital que não inclua um encontro com os governantes do país é algo sem precedentes.

Também é raro que um papa participe de um Congresso Eucarístico Internacional, Francisco será o primeiro Romano Pontífice a fazê-lo em 20 anos. A última vez que um Papa esteve em um congresso eucarístico internacional foi São João Paulo II, que encerrou a edição de Roma, no marco do grande jubileu, no dia 25 de Junho de 2000.

O Congresso Eucarístico de Budapeste que ocorre entre os dias 5 e 12 de setembro, reúne clérigos, religiosos e leigos para testemunhar a presença real de Jesus na Eucaristia. Ele deveria ter ocorrido no ano passado, mas foi adiado como parte das medidas de combate `pandemia de covid-19. Os congressos são organizados pelo Pontifício Comitê para os Congressos Eucarísticos Internacionais, atualmente presidido pelo Arcebispo Piero Marini. O congresso da Hungria será o 52º encontro desde que a iniciativa teve início na França em 1881.

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