O cardeal Sérgio da Rocha, arcebispo de Salvador (BA) e primaz do Brasil, celebrou no dia 21 de maio, uma missa pelas vítimas da “LGBTFobia”, com a presença de ativistas da agenda gay, entre os quais um transformista caracterizado. Em declarações à ACI Digital, o cardeal disse que a equipe responsável pela organização da missa “não favoreceu a divulgação ou o uso ideológico da celebração”.

A missa foi celebrada na capela Sagrada Família, em Salvador, a pedido do Centro de Promoção e Defesa dos Direitos LGBT da Bahia (CPDD-LGBT), órgão da Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social da Bahia (SJDHDS), e da Instituição Beneficente Conceição Macedo (IBCM). Além de ativistas da agenda gay, participaram lideranças de diferentes confissões religiosas, autoridades civis e representantes de diversas organizações baianas. Durante a transmissão, o coordenador do CPDD, Renildo Barbosa, afirmou que iriam assistir um “marco histórico, que é uma Missa celebrada aqui na Igreja, pelo cardeal”.

A Missa foi transmitida ao vivo pelo Instagram do CPDD. Antes do início da celebração, o transformista Édson Júnior, caracterizado de sua personagem Scarleth Sangalo, fez uma saudação, usando a chamada linguagem neutra defendida pela ideologia de gênero. “Boa tarde a todos, a todas e a todes, eu sou Scarlette Sangalo, sou da comunicação do CPDD, além de transformista. Eu estou aqui, na Capela das Doroteias (como é conhecida a Capela da Sagrada Família, por ter abrigado antigamente o Colégio das Irmãs Doroteias), no Garcia, e já já vai começar a Missa em prol dos LGBTs assassinados, trans, lésbicas, gays, travestis, enfim, a todos”. Após a comunhão, o transformista cantou a música “Ave Maria”, de Vicente Paiva e Jaime Redondo, sendo aplaudido pelos presentes.

O fundador do Grupo Gay da Bahia, Luiz Mott, disse ao site da associação que “é a primeira vez na história do Brasil que um cardeal, a mais alta autoridade da Igreja Católica, primaz do Brasil, celebra uma Missa em memória dos LGBT assassinados”. O site também afirmou que “o sermão, além de citar nominalmente LGBT, diversas vezes falou da importância da caridade dos cristãos para evitar esse tipo de violência e viver em comunidade”.

Em entrevista à ACI Digital, o cardeal Sérgio da Rocha afirmou que a Missa “não foi uma celebração em homenagem às pessoas falecidas, mas em sufrágio das almas”. O arcebispo também disse que, “infelizmente, a instrumentalização ideológica ocorre quando se distorce a realidade dos fatos ou se atribui significado indevido, podendo ser de esquerda ou de direita”. Quanto às críticas pela celebração da Missa, disse que procura “respeitar as críticas respeitosas, buscando superar as falhas. Às ofensas pessoais, respondo com o silêncio e a oração”.  

Além disso, dom Sérgio da Rocha afirmou que o uso da sigla LGBTQIA+ “para referir-se a condições ou situações vividas pelas pessoas no campo da sexualidade não implica necessariamente em valoração ética ou aceitação da ideologia de gênero”.

Homilia foi convite a seguir Jesus, diz cardeal

Em sua homilia, dom Sérgio da Rocha afirmou que “somos convidados a refazer a experiência dos primeiros discípulos”, os quais “são reconhecidos pela vivência do mandamento do amor”. “Jesus disse: ‘nisso todos conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros’. E acrescentando logo a seguir: ‘como eu vos amei, assim também vós deveis vos amar uns aos outros’”.

Afirmou ainda que “precisamos dizer ‘não’ à violência nas suas múltiplas faces” e que “a violência contra a população LGBTI+ é um sinal triste de uma sociedade que convive com constantes violações da vida, da dignidade, dos direitos de tantas vítimas de morte brutal”.

Nesse sentido, declarou à ACI Digital que o “convite a seguir a Cristo” foi o “centro da reflexão desenvolvida” e que, “se os presentes se abriram para seguir a Cristo, na Igreja, haverá ocasião para que possam conhecer melhor a doutrina da Igreja a respeito da sexualidade”.

“As primeiras palavras de Jesus aos primeiros discípulos não foram um discurso sobre a sexualidade, mas um convite para o discipulado. Este convite estava no Evangelho proclamado, que não foi escolhido para a ocasião. Sem o coração de discípulo, é difícil alguém aceitar o caminho de santidade proposto por Jesus para ser vivida nos vários campos da vida, incluindo a sexualidade”, declarou.

Além disso, afirmou que “a morte violenta não se justifica por condição social, de raça, cultura ou sexualidade” e que “quem é contra a ideologia de gênero também deve ser contra a morte violenta das pessoas em razão de sua vida sexual”.

Caminho sinodal alemão

Na internet e redes sociais, muitos observaram que a Missa celebrada pelo arcebispo de Salvador se deu no mesmo período do caminho sinodal alemão, processo que envolve bispos e leigos em debates sobre futuro da igreja no país e tem levantado temas como fim do celibato dos padres, ordenação de mulheres e mudança da moral sexual da Igreja inclusive sobre o homossexualismo. No último dia 10 de maio, padres e agentes pastorais da Igreja na Alemanha abençoaram uniões homossexuais em um evento intitulado "O amor vence", em desafio aberto à proibição explícita pelo responsum da Congregação para a Doutrina da Fé de 15 de março, que declarou que esse tipo de bênção não é possível.

O presidente da Conferência Episcopal Alemã, dom Georg Bätzing, disse a CNA Deutsch, agência em alemão do grupo ACI, que o responsum reflete "o estado do ensino da Igreja”. Segundo ele, porém, a pastoral já avançou além disso e a doutrina tem que acompanhar a pastoral, a prática do mundo e as ciências humanas sobre o homossexualismo.

Diante dessa questão, o cardeal Sérgio da Rocha disse que não discute “os pronunciamentos do Papa Francisco ou que são por ele autorizados, como da Congregação para a Doutrina da Fé”. “Procuro acolher e pôr em prática, contando com a graça de Deus”, afirmou.

Confira também: