A polícia espanhola investiga a autoria e credibilidade de um manuscrito enviado ontem ao jornal madrilenho ABC em nome da rede Al Qaeda, que contém críticas e ameaças à a Santa Sé e uma justificação dos atentados terroristas na Espanha, Inglaterra e Itália.

No comunicado, escrito em árabe e dividido em duas seções intituladas "Operação Vaticano" e "Iraque e o ataque terrorista mundial", o autor critica duramente o papel do Vaticano durante o século XX, particularmente no holocausto judeu por parte dos nazistas, e qualifica os atentados realizados em tais países europeus de atos "de defesa pessoal contra o terrorismo no Iraque e Afeganistão".

Segundo o ABC, "a Delegacia de polícia Geral de Informação está analisando ‘de forma exaustiva’ o documento que qualificam como ‘um escrito ameaçador com arranjo a uma situação histórica –há várias referências ao papel do Vaticano no extermínio de judeus perpetrado pelos nazistas–, posta em relação com a atualidade do Ocidente e de vários países árabes’".

Na última página do documento de três páginas escrito em árabe clássico, destaca-se que "a guerra do Iraque conseguiu o apoio do Vaticano aos países capitalistas, tudo pelo petróleo iraquiano. Aqueles governantes irão colher o que plantaram por seu apoio e pelo que mataram. Hitler foi a cabeça de turco do Vaticano e foram assassinados por parte dos nazistas 44 milhões de pessoas com o fim de lhes tirar-lhes suas riquezas".

Segundo o ABC, sob o título dedicado ao Vaticano, o documento mistura, "dados sobre o papel do partido nazista e seu apoio por parte da Santa Sé. Segundo os investigadores, este compartimento ‘foi copiado de algum artigo ou um livro’ e de fato, em algum de seus parágrafos cita o The New York Times’ em um artigo publicado em dezembro de 1941".

Quem são os verdadeiros terroristas?

Em relação à primeira parte do comunicado, intitulado "o Iraque e o ataque terrorista mundial", o jornal assinala que se expõe uma filosofia geral do terrorismo em relação com a guerra do Iraque e o conflito do Afeganistão, com uma péssima redação e um escasso fio argumental.

Nesta seção, o "autor se pergunta quem são os terroristas verdadeiros, a seu juízo quem ‘está matando e torturando no Iraque e Afeganistão’ e diz falar para o mundo islâmico", informa o periódico.

Al Qaeda?

Conforme confirmaram fontes da investigação, o comunicado foi enviado primeiro à delegação do ABC em Barcelona (11h15 horas) e pouco depois (11h54 horas) à redação em Madri. Dois dias antes, a Televisão Espanhola (TVE) recebeu o mesmo texto.

Peritos em terrorismo islamista consultados pelo jornal afirmam ter "indícios bastante confiáveis" sobre os autores do comunicado, em base ao lugar de que foi enviado, um organismo oficial da Catalunha. Embora se acredita que não tem relação com nenhuma célula estável da Al Qaeda, poderia ser um "simpatizante da causa" do terrorismo islâmico.

Fontes consultadas pelo jornal madrileno assinalam que é preciso avaliar o comunicado "com prudência, sem desprezá-lo" porque tem diferenças significativas e mais indícios de verossimilhança que outro tipo de mensagens enviadas ou publicados por determinados indivíduos nos últimos meses, principalmente após os atentados de Londres.

Do mesmo modo, os investigadores repararam que a "Al Qaeda nunca reivindicou a figura de Hitler nem suas ações. Por outro lado, seria a primeira vez que uma célula terrorista ou qualquer outra que falasse em nome de Bin Laden faz alusão a um momento histórico contemporâneo (todo o período que vai desde 1924 e a ascensão do partido nazista até os anos 40), já que sempre se retroagem a Al Andalus".

Segundo o ABC, os investigadores assinalam que "o manuscrito está sendo analisado com ‘cautela’ embora em princípio não apreciam que se desprenda uma ameaça clara como as de outros comunicados islamistas, em concreto não se detectaram similitudes com o fax remetido em 3 de abril de 2004 também a este jornal, que foi redigido por Serhane, como mais tarde demonstraram as análises da Polícia Científica".

"Tampouco tem relação, nem quanto à forma nem no estilo, com documentos interceptados pela Polícia de terroristas vinculados ao 11-M, muito mais precisos quanto ao tom ameaçador e concreto. ‘Isso não significa que não possa estar vinculado a algum grupo que apóia a causa da Al Qaeda’", informa o jornal.