Dom Cristóbal López é o atual Bispo de Rabat (Marrocos), que em poucos dias receberá o Papa Francisco em sua quinta viagem a um país muçulmano.

Em entrevista concedida ao Grupo ACI, o Prelado explicou que as expectativas desta viagem histórica estão centradas especialmente em que, "como uma comunidade cristã, esperamos que nos confirme na vivência cristã nesta terra do Islã, que reforce nossa esperança, porque nós o esperamos como servo da esperança e também que nos ajude a acender nosso coração no amor".

Em relação à visita de Estado que o Papa fará ao Reino do Marrocos, o Bispo de Rabat assegura que espera que "as boas relações já existentes entre o Vaticano e Marrocos se reforcem".

"Que a mensagem que o Papa está dando sobre o diálogo inter-religioso e a aproximação entre cristãos e muçulmanos para trabalhar pela paz e fraternidade universal receba um forte impulso, porque se encontra com outro líder religioso e político muito importante, como é o Rei do Marrocos e ambos, juntos, podem reforçar muito esta mensagem que o Papa não se cansa de difundir por onde passa”, afirmou ao Grupo ACI.

Neste sentido, o Bispo de Rabat recordou a visita do Papa João Paulo II ao Marrocos em 1985 e assegurou que não foi só o país que mudou substancialmente desde então, "mas o mundo inteiro".

"Quando há pessoas que querem levantar muros e fronteiras, cavar fossas que separem os povos, este Papa quer construir pontes e nossa Igreja está envolvida. O mundo mudou e é o momento de demonstrar que as religiões não são um problema, mas devem ser parte da solução dos problemas do mundo. Viver uma fé não é motivo para que a pessoa ignore os problemas do mundo, mas se comprometa na busca da solução. É questão de construir pontes e dar-nos as mãos todos os que temos uma fé no Deus único e verdadeiro para trabalharmos para construir um mundo melhor”, indicou.

Algo que o Prelado resumiu em "um chamado a construir a fraternidade universal".

Além disso, assegurou que o gesto do Papa ao visitar o Marrocos é especialmente relevante "porque não foi à Espanha, à Argentina, à França em uma visita oficial. Mas foi para a Armênia, para a Albânia... que são países periféricos política e religiosamente falando. Isso nos chama a ser uma Igreja em saída. E o Papa não só fala, como faz. Ver o Papa junto com o rei do Marrocos, caminhando juntos como líderes que querem construir a paz, é o grande sinal que eu espero".

Presentes para o Papa

Dom López destacou durante a entrevista ao Grupo ACI que a Igreja no Marrocos vai presentear o Papa Francisco durante a Missa final com uma escultura de metal de Jesus com a Cruz nas costas "feita por um escultor marroquino", além de uma árvore de argão.

"Um grupo de jovens preparou uma árvore viva, que entregarão ao Papa, não sei se será plantada no Vaticano ou se as raízes pegarão, porque é uma árvore que só existe no Marrocos. É o 'arganier' [árvore de argão, em francês] da amizade, como as oliveiras, mas típico daqui porque é exclusivo do país", destacou.

A minoria cristã no Marrocos

A comunidade cristã no Marrocos é "viva, vibrante e gozosa" e, ainda que Dom López assegure que é "insignificante" em número, porque não chegam a 30 mil entre os 37 milhões de habitantes do país, é uma comunidade "significativa", porque "temos a mensagem do Evangelho que carregamos em vasos de barro e que anunciamos com a nossa vida e com o nosso testemunho".

Em relação aos católicos, a grande maioria são estudantes universitários da região subsaariana com bolsas de estudos do governo do Marrocos para estudar nas universidades do país.

"Por isso somos uma Igreja em constante mudança, porque dos 30 mil que somos, todos os anos vão e vêm por volta de seis mil alunos... Além disso, em nossas comunidades, há cristãos de mais de 100 nacionalidades. Somente entre os religiosos e sacerdotes presentes no país reunimos 40 nacionalidades. Então, nesse sentido, somos muito católicos, muito universais", assegurou o Bispo.

"Na verdade, aqui todos nós somos migrantes, porque todos os católicos somos estrangeiros, porque não são migrantes apenas aqueles que cruzam o país com a esperança de alcançar a Europa, mas somos também todos os que deixamos um país para ir para outro", disse ao Grupo ACI.

Além disso, afirmou que é uma comunidade muito ecumênica, já que trabalha lado a lado com "protestantes, ortodoxos e anglicanos".

Este ecumenismo estará presente na viagem do Papa, porque na oração do Ângelus do domingo, 31 de março, estarão os representantes anglicanos, ortodoxos e evangélicos do Marrocos.

Nesse sentido, Dom López destacou a importância do Instituto Ecumênico de Teologia Al Mowafaqa, "que compartilhamos com os protestantes e que é único no mundo, onde se pode estudar teologia cristã e licenciatura em estudos eclesiásticos". Indicou que "50% pertence à Igreja Católica e os outros 50% à Igreja Protestante. Na verdade, sou presidente junto com a pastora protestante".

Afirma que neste instituto, estudam tanto leigos como religiosos, jovens e adultos, homens e mulheres, com "os professores cristãos, católicos e protestantes, mas também muçulmanos, para que os alunos compreendam as fontes do Islã. É muito interessante".

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Pessoas migrantes

O Papa Francisco terá outro encontro com os migrantes na sede da Cáritas diocesana de Rabat. Na verdade, Dom López afirmou que a Igreja no Marrocos é "samaritana", porque "acolhemos todos aqueles que necessitam, principalmente pessoas migrantes e os marroquinos que estão em necessidade e o fazemos sem perguntar, sem pedir explicações. Vemos um ferido e o atendemos, se alguém está com fome e podemos, damos de comer. Saímos ao encontro do ser humano que está em situação de desespero ou de extrema necessidade".

Nesse sentido, Dom López recordou a visita que o Papa Francisco fará ao Centro Rural de Serviços Sociais de Témara.

"É uma obra maravilhosa, onde tudo o que é feito é a favor das pessoas pobres do Marrocos, particularmente das vítimas de queimaduras, que são muitas, porque é um dispensário especializado na cura de grandes queimaduras. Há também uma creche, um centro de promoção das mulheres... É incrível como trabalham as três religiosas encarregadas, em meio a um ambiente totalmente rural e a favor de tantas pessoas necessitadas”, indicou.

Destacou também o trabalho realizado pela Cáritas Rabat, junto com a delegação de migrações da Diocese de Tánger, que cuida dos filhos dos migrantes que devem ir à escola.

Dom López conhece bem a realidade educacional, porque, de 2003 a 2010, foi diretor da escola Dom Bosco de Kénitra (Marrocos) e, por isso, destacou a importância de cuidar das crianças que não sabem falar francês nem árabe. Contou que a Igreja, através da Cáritas, “serve como mediadora entre as famílias e as escolas”, para que estas crianças tenham acesso à educação.

Recordou também um projeto que facilita o acesso à cirurgia para diversas cardiopatias de crianças que, de outra maneira, estariam fadadas à morte. Este projeto é possível graças à Igreja Católica.

"Já operaram mais de 50, que de outra maneira, teriam morrido. São operadas crianças marroquinas e muçulmanas que precisam graças à ajuda da Igreja Católica. Mas não fazemos isso para atuar socialmente, mas porque queremos ser testemunhas do amor de Deus a este povo que nos acolhe, fazemos sem olhar a quem e com todo o carinho de nosso ser cristão, que é a essência de nossa fé”.

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