O Secretário de Estado do Vaticano, Cardeal Pietro Parolin, explicou os objetivos das negociações da Santa Sé com o governo comunista da China, que há alguns anos assedia os católicos, especialmente os bispos que permanecem fiéis à Sé de Pedro.

Em uma entrevista concedida ao italiano Gianni Valente, publicada na quarta-feira, 31 de janeiro, no Vatican Insider, o Cardeal explicou que o Santo Padre acompanha “pessoalmente os atuais contatos com as autoridades do governo chinês. Todos os seus colaboradores agem de acordo com ele. Ninguém toma iniciativas privadas. Honestamente, qualquer outro tipo de raciocínio parece fora de lugar”.

Estas palavras ratificam a declaração do dia 30 de janeiro do Diretor da Sala de Imprensa do Vaticano, Greg Burke. O porta-voz disse que é “uma surpresa e lamentável que se afirme o contrário por parte de pessoas de Igreja e se alimentem assim confusões e polêmicas”.

Embora não tenha mencionado, a declaração ocorreu um dia depois que o Bispo Emérito de Hong Kong, Cardeal Joseph Zen Ze-kiun, publicou em seu site uma carta na qual explica e analisa a difícil situação da Igreja Católica na China, em particular os bispos, ante as pressões e a perseguição do governo comunista.

Na missiva publicada em seu site, o Cardeal recordou que nos últimos dias a mídia informou que o Vaticano pediu a um bispo para que renuncie e a outro bispo para que aceite a sua renúncia a fim de permitir que os bispos relacionados ao governo assumam os seus cargos.

A carta detalhada do Purpurado é bem crítica e assinala, entre outras coisas, que “o problema não é a renúncia dos bispos legítimos, mas o pedido de abrir espaço para os ilegítimos e inclusive excomungados”.

“Eu sei que sou pessimista em relação à situação atual da Igreja na China, mas o meu pessimismo é baseado na minha longa e direta experiência da Igreja na China. Entre 1989 e 1996, costumava dedicar seis meses por ano ensinando em vários seminários da comunidade da Igreja oficial. Por isso, vi diretamente a escravidão e a humilhação à qual os nossos irmãos bispos estão submetidos”, assinala o Cardeal Zen em sua carta.

Na missiva carta, o Bispo Emérito pergunta: “Acreditaria que o Vaticano está vendendo a Igreja Católica na China? Sim, definitivamente, se eles estão indo na direção na qual estão segundo o que eles estão fazendo nos últimos anos e meses”.

Na entrevista publicada na quarta-feira, o Cardeal Parolin reconheceu que na Igreja existe o direito de discordar e criticar, mas não deveriam “provocar divisão”. Nesse sentido, continuou, “nenhum ponto de vista pessoal pode ser considerado um intérprete exclusivo do que é bom para os católicos chineses. Por isso, a Santa Sé trabalha a fim de encontrar uma síntese da verdade e um caminho viável para responder as expectativas legítimas dos fiéis, dentro e fora da China”.

O Purpurado sublinhou que “a comunhão entre o Bispo de Roma e todos os bispos católicos toca a alma da unidade da Igreja: não é um tema privado entre o Papa e os bispos chineses ou entre a Sé Apostólica e as autoridades civis”.

Em seguida, destacou que “o principal objetivo da Santa Sé no diálogo é precisamente proteger a comunhão na Igreja, sendo fiel à genuína tradição da Igreja e da constante disciplina eclesiástica”.

Outro objetivo importante das negociações com o governo chinês, disse o Cardeal, é “que se chegue, quando o Senhor quiser, a não mais falar de bispos ‘legítimos’ e ‘ilegítimos’, ‘clandestinos’ e ‘oficiais’ na Igreja da China, mas a encontrar-se como irmãos, aprendendo novamente a linguagem da colaboração e da comunhão”.

As relações diplomáticas entre a China e o Vaticano se romperam em 1951, dois anos depois da chegada ao poder dos comunistas que expulsaram os clérigos estrangeiros.

Desde então, a China permite o culto católico unicamente à Associação Patriótica Católica Chinesa, subordinada ao Partido Comunista da China, e rechaça a autoridade do Vaticano para nomear bispos ou governá-los.

Os bispos que permanecem fiéis ao Papa vivem em uma situação quase clandestina, assediados constantemente pelas autoridades comunistas.

O Cardeal Pietro Parolin explicou que “a Santa Sé jamais esquecerá as provações e sofrimentos passados e presentes dos católicos chineses e seu generoso testemunho do Evangelho. Ainda há muitos problemas para a vida da Igreja e estes não podem ser resolvidos todos juntos. Mas, neste contexto, a questão da escolha dos bispos é crucial”.

“Por outro lado, não podemos esquecer que a liberdade da Igreja e a nomeação dos bispos sempre foram temas recorrentes nas relações entre a Santa Sé e os Estados. Certamente, o caminho iniciado com a China por meio dos atuais contatos, é gradual e ainda exposto a tantos imprevistos, assim como a novas possíveis emergências. Ninguém, em sã consciência, pode dizer ter soluções perfeitas para todos os problemas”.

O Cardeal expressou que é preciso “tempo e paciência para que se possam curar as tantas feridas pessoais causadas reciprocamente dentro das comunidades. Infelizmente, é certo que haverá ainda incompreensões, dificuldades e sofrimentos a serem enfrentados. Mas todos nutrimos a confiança que, uma vez considerado adequadamente o ponto da nomeação dos bispos, as restantes dificuldades não deveriam mais ser  tais, a ponto de impedir aos católicos chineses de viver em comunhão entre eles e com o Papa”.

"Isto é o mais importante, e o que São João Paulo II e Bento XVI desejavam. Isto é o mias importante e hoje o Papa Francisco persegue com clarividência”, ressaltou.

Dirigindo-se às autoridades chinesas, o Cardeal disse que “a Igreja na China não pretende substituir o Estado, mas quer oferecer a sua contribuição serena e positiva para o bem de todos. Portanto, a mensagem da Santa Sé é uma mensagem de boa vontade, com a esperança de continuar no diálogo iniciado a fim de contribuir na vida da Igreja Católica na China, ao bem do povo chinês e à paz no mundo”.

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Há alguns anos, a Santa Sé trabalha em um acordo para o restabelecimento das relações diplomáticas com a China, uma aproximação incentivada pelo Papa Francisco.

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