Em São João del-Rei (MG) uma tradição de Quaresma leva várias pessoas às ruas nas madrugadas de sexta-feira para rezar pelos mortos. Trata-se do Cortejo de Encomendação de Almas, uma herança dos colonizadores portugueses, que acontece há mais de 300 anos.

Manter uma tradição como essa nos tempos atuais é “gritar ao coração do mundo que Deus existe, que há um horizonte, que é o horizonte da transcendência, que nossa vida tem uma promessa de imortalidade”, disse à ACI Digital o padre Geraldo Magela da Silva, pároco da paróquia da catedral de Nossa Senhora do Pilar.

O cortejo se reúne em um ponto da cidade e percorre um trajeto que passa por cemitérios, igrejas, cruzeiros e encruzilhadas. Em cada um desses pontos de parada, primeiro soa a matraca, dando o sinal para o silêncio. Canta-se, então, um moteto sobre Paixão de Cristo. Em seguida, reza-se pelos mortos. No percurso, que costuma ser longo, os fiéis rezam o rosário.

“A Encomendação de Almas é algo muito próprio da piedade popular”, disse o padre Geraldo Magela. O padre ressalta que não se trata de folclore. “Nós aqui em Minas Gerais somos muito ligados à meditação da Paixão. Isso está muito forte na espiritualidade do nosso povo”, completou.

São poucos os lugares que mantêm a tradição do Cortejo de Encomendação de Almas, nas sextas-feiras da Quaresma. Em São João del-Rei, a tradição segue forte e acontece nas três primeiras sextas-feiras desse tempo litúrgico. Outro diferencial é que rezam “de maneira especial pelos músicos falecidos, porque o cortejo é acompanhado sempre pela Orquestra Lira Sanjoanense”, disse Geraldo Magela.

“Interessante isso acontecer durante a Quaresma, porque estamos meditando a Paixão e morte de nosso Senhor Jesus Cristo, à luz de sua ressurreição. Foi por esse mistério que nós alcançamos a vida eterna. E faz parte da nossa fé católica rezar pelos falecidos, para que, nesse estado do purgatório, possam se abrir ao dom da salvação que Deus oferece sempre e até neste último momento”, disse o padre.

Quem conduz o cortejo são os leigos. “Os padre podem participar, mas é algo muito próprio dos leigos, são eles que mantêm essa tradição”, disse o pároco.

Segundo ele, a participação das pessoas é grande, inclusive de jovens. “Alguns já têm a tradição religiosa, outros são atraídos pela curiosidade, pela beleza da música”, disse, lembrando que São João del-Rei é uma cidade universitária. Por isso, acredita que essa tradição é também “uma oportunidade de evangelização”, para “despertar a espiritualidade no coração dos mais jovens”.

A cidade também é conhecida pelo turismo religioso e, segundo padre Geraldo Magela, há “uma presença muito forte dos turistas nessa e em outras celebrações nossas”. “Vemos até hoje uma participação muito respeitosa e sempre é algo que deixa um encantamento nas pessoas. Então, insisto que são oportunidades formidáveis de evangelização”, completou.

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