O relatório sobre abusos sexuais na arquidiocese de Munique e Freising, apresentado hoje em Munique, contém investigação de uma possível má conduta do ex-arcebispo Joseph cardeal Ratzinger, hoje papa emérito Bento XVI, e do arcebispo atual, Reinhard cardeal Marx.

Foram examinadas 261 pessoas acusadas de abuso na área de responsabilidade da arquidiocese de Munique e Freising entre 1945 e 2019. "Algo foi encontrado" em 235 pessoas.

Entre eles, segundo os especialistas, foram considerados culpados 173 padres, nove diáconos, cinco oficiais de pastoral e 48 pessoas de outros grupos profissionais, como, por exemplo, do serviço escolar.

Marx não estava na conferência de imprensa que apresentou o documento.

Na entrevista coletiva, que começou às 11h da manhã de quinta-feira, estavam presentes, além da moderadora Barbara Leyendecker, os especialistas do escritório de advocacia contratado Marion Westpfahl, Ulrich Wastl e Martin Pusch. Leyendecker anunciou que Marx "decidiu não participar", sem entrar nos possíveis motivos.

Marion Westpfahl disse que o cardeal foi "expressamente" convidado, mas não aceitou o convite. "Lamentamos muito a sua ausência", disse Westpfahl.

Os investigadores contratados supõem que haja 497 vítimas. Martin Pusch enfatizou que isso pode não refletir "o número inteiro". Para ele, o número de casos não-notificados é maior.

A maioria das vítimas é do sexo masculino (247), 182 dos atingidos são do sexo feminino e em 68 casos não foi possível saber.

Das vítimas do sexo masculino, 60% tinham entre oito e 14 anos na época dos supostos crimes. Entre as vítimas do sexo feminino, as menores representam um terço.

Martin Pusch explicou que queria "enfatizar particularmente" que o Papa Emérito Bento XVI respondeu "extensamente" às perguntas que lhe foram feitas. Sua declaração de 82 páginas deu aos especialistas uma "visão autêntica".

O então arcebispo Ratzinger tinha quatro casos para explicar: dois padres condenado por abuso pelo Estado que continuaram a trabalhar no cuidado pastoral sem serem processados ​​sob o direito canônico; a contatação pela diocese de um padre que "já havia sido condenado por um tribunal não-alemão", e o caso do padre Peter H., que reincidiu como agressor condenado na arquidiocese.

Os investigadores achavam que Ratzinger, como arcebispo de Munique e Freising, também tinha conhecimento do caso de Peter H, mas não conseguiram nenhuma prova. O investigador Ulrich Wastl conjectura que é "predominantemente provável" que ele soubesse.

Bento XVI nega isso até hoje e afirmou que ainda pode se referir à sua "excelente memória de longo prazo".

O diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé disse em Roma hoje, 20 de janeiro: "A Santa Sé acredita que deve dar a devida atenção ao documento, cujo conteúdo desconhece no momento. Nos próximos dias, após sua publicação, tomará conhecimento dele e será capaz de examinar seus detalhes apropriadamente."

“A Santa Sé reitera sua vergonha e remorso pelos abusos de menores cometidos por clérigos e assegura a todas as vítimas sua proximidade e reafirma o caminho percorrido para proteger os mais jovens e garantir-lhes um ambiente seguro”.

Os especialistas de Munique acusam o arcebispo em exercício em Munique e Freising, Reinhard cardeal Marx, de má conduta ao lidar com casos de violência sexual duas vezes. Em primeiro lugar, Marx não teria tomado nenhuma medida para abordar as vítimas de abuso e dar-lhes mais ajuda. Em segundo lugar, o cardeal teria agido ilegalmente ao não relatar casos à Congregação para a Doutrina da Fé da Santa Sé.

No que diz respeito ao discernimento do arcebispo, o relatório da chancelaria levantou indiretamente dúvidas. Em sua declaração aos investigadores, Marx enfatizou que, em sua opinião, a principal responsabilidade pelo processamento dos casos era de seu ordinariato e do vicariato geral. Se esses não cumpriram seus deveres, ele, Marx, sentia apenas uma "responsabilidade moral".

O advogado Pusch observou que Marx também enfatizou que, como arcebispo, ele era o principal responsável pela "proclamação da palavra de Deus".

Essa avaliação "não foi compartilhada sem reservas" pelos investigadores. "Quando, senão no caso do abuso sexual de menores, é apropriado classificar um tema como 'prioridade máxima'? Isto é especialmente verdadeiro quando os regulamentos relevantes atribuem um papel central ao bispo diocesano."

O comportamento dos predecessores de Marx também foi examinado. O cardeal Friedrich Wetter, arcebispo de 1982 a 2008, fez muito pouco para esclarecer 21 casos e deixou de cuidar das vítimas, diz o relatório.

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Wetter reconhece sua culpa em apenas um caso.

Os ex-arcebispos Michael von Faulhaber, Joseph Wendel e Julius Döpfner também são acusados ​​de má conduta ao lidar com casos de abuso, mas estão mortos.

Horas depois da apresentação do relatório, o arcebispo Marx disse em um pronunciamento que seu primeiro pensamento foi para as vítimas de abuso sexual. "Estou chocado e envergonhado", disse o cardeal. "Para mim, os encontros com vítimas de abuso sexual foram um ponto de virada. Eles mudaram minha percepção da igreja e continuam a mudá-la."

"Como tenho dito repetidamente, como arcebispo de Munique e Freising, sinto que compartilho a responsabilidade pela Igreja como instituição nas últimas décadas. Como arcebispo em exercício, peço desculpas em nome da arquidiocese pelo sofrimento infligido às pessoas nas últimas décadas", disse Marx.

Marx enfatizou sua convicção de que o Caminho Sinodal Alemão, iniciado quando ele era o presidente da conferência episcopal alemã, desempenha um papel importante. O motivo alegado para a convocação do Caminho Sinodal, um processo de discussão que deve durar três anos, foi exatamente a crise dos abusos sexuais do clero. No processo, criticado pelo papa Francisco e por parte do clero alemão, discute-se a mudança da estrutura governamental da Igreja, dando maior lugar aos leigos, a mudança na moral sexual da doutrina católica, a ordenação de mulheres, e o fim do celibato sacerdotal, todos temas que, segundo a Santa Sé, não podem ser decididos no âmbito de uma igreja nacional.

"É sobre a renovação da igreja, é sobre o que também estamos tentando fazer e avançar no Caminho Sinodal na Alemanha”, disse o arcebispo. “Lidar com o abuso sexual não pode ser separado do caminho de mudança, renovação e reforma da Igreja. Continuaremos trabalhando nisso juntos”.

No ano passado Marx tentou renunciar de seu posto de arcebispo de Munique, mas o papa Francisco não aceitou.

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