O papa Francisco participou hoje (4) do Encontro ecumênico e oração pela paz na catedral de Nossa Senhora da Arábia, em Awali, no Bahrein.

A seguir, o discurso do papa Francisco:

«Partos, medos, elamitas, habitantes da Mesopotâmia, da Judeia e da Capadócia, do Ponto e da Ásia, da Frígia e da Panfília, do Egito e das regiões da Líbia cirenaica, colonos de Roma, judeus e prosélitos, cretenses e árabes ouvimo-los anunciar, nas nossas línguas, as maravilhas de Deus» (At 2, 9-11).

Santidade, caro Irmão Bartolomeu, amados irmãos e irmãs, estas palavras parecem escritas para nós, hoje: de tantos povos e tantas línguas, de tantas partes e tantos ritos, estamos aqui juntos, e fazemo-lo por causa das maravilhas realizadas por Deus! Estamos em paz, como naquela manhã de Pentecostes em que não se compreendia nada! Em Jerusalém, no dia de Pentecostes, apesar de virem de muitas regiões, sentiram-se unidos num só Espírito: hoje, como então, a variedade de origens e línguas não é um problema, mas um recurso. Um autor antigo escreveu: «Se alguém nos diz “se recebeste o Espírito Santo, porque não falas em todas as línguas?”, devemos responder-lhe «falo certamente em todas as línguas, porque sou membro do Corpo de Cristo, isto é, da sua Igreja, que se exprime em todas as línguas”» (Sermão de um Autor africano do século VIPL 65, 743).

Irmãos, irmãs, isto é válido também para nós, porque, «num só Espírito, fomos todos batizados para formar um só corpo» (1 Cor 12, 13). Infelizmente, com as nossas dilacerações, ferimos o corpo santo do Senhor, mas o Espírito Santo, que une todos os membros, é maior do que as nossas divisões carnais. Por isso é justo afirmar que, quanto nos une, supera em muito quanto nos divide e que, quanto mais caminharmos segundo o Espírito, tanto mais seremos levados a desejar e, com a ajuda de Deus, a restabelecer a plena unidade entre nós.

Voltemos ao texto de Pentecostes. Ao meditar nele, ressoaram em mim dois elementos, que me parecem úteis para o nosso caminho de comunhão, desejando por isso partilhá-los convosco; são a unidade na diversidade e o testemunho de vida.

A unidade na diversidade. No Pentecostes – dizem os Atos dos Apóstolos –, os discípulos «encontravam-se todos reunidos no mesmo lugar» (2, 1). Notemos como o Espírito, apesar de Se pousar sobre cada um, todavia escolhe o momento em que estão todos juntos. Podiam adorar a Deus e fazer bem ao próximo mesmo separadamente, mas é convergindo em unidade que se abrem de par em par as portas à obra de Deus.

O povo cristão é chamado a reunir-se, para que aconteçam as maravilhas de Deus. O fato de estar aqui no Bahrein como um pequeno rebanho de Cristo, disperso em vários lugares e confissões, ajuda a sentir a necessidade da unidade, da partilha da fé: assim como neste arquipélago não faltam ligações seguras entre as ilhas, assim aconteça também entre nós, para não estarmos isolados, mas em comunhão fraterna.

Irmãos e irmãs, pergunto-me: Como fazer para aumentar a unidade, se a história, a habituação, as obrigações e as distâncias nos parecem atrair para outras partes? Qual é o «lugar de encontro», o «cenáculo espiritual» da nossa comunhão?

É o louvor de Deus, que o Espírito suscita em todos. A oração de louvor não isola, nem nos fecha em nós mesmos e nas nossas necessidades, mas introduz-nos no coração do Pai e, assim, nos liga a todos os irmãos e irmãs. A oração de louvor e adoração é a mais elevada: gratuita e incondicional, atrai a alegria do Espírito, purifica o coração, reconstitui a harmonia, sanifica a unidade.

É o antídoto contra a tristeza, a tentação de nos deixarmos turbar pela nossa pequenez interior e pela insignificância exterior dos nossos números. Quem louva, não presta atenção à pequenez do rebanho, mas à beleza de sermos os pequeninos do Pai. O louvor, que permite ao Espírito derramar em nós a sua consolação, é um bom remédio contra a solidão e a nostalgia de casa.

Permite-nos notar a proximidade do Bom Pastor, mesmo quando pesa a falta de Pastores próximos, caso frequente nestes lugares. Precisamente nos nossos desertos, o Senhor gosta de abrir novos e inesperados caminhos e fazer brotar fontes de água viva (cf. Is 43, 19). O louvor e a adoração conduzem-nos até lá, até às fontes do Espírito, levando-nos de novo às origens, à unidade.

Será bom continuar a alimentar o louvor de Deus, para serdes ainda mais sinal de unidade para todos os cristãos! Continuai também com o bom costume de colocar à disposição doutras comunidades os edifícios de culto para adorar o único Senhor. Na realidade, não só aqui na terra, mas também no Céu, há um rasto de louvor que nos une: é o rasto dos inúmeros mártires cristãos de várias confissões. Quantos houve, nestes últimos anos, no Médio Oriente e em todo o mundo! Quantos!!!

Agora formam um único céu estrelado, que aponta a estrada a quem caminha nos desertos da história: temos a mesma meta, somos todos chamados à plenitude da comunhão em Deus.

Lembremo-nos, porém, de que a unidade para a qual caminhamos sobrevive na diferença. É importante ter isto em consideração: a unidade não é fazer «todos iguais», não! É feita na diferença. A narração de Pentecostes especifica que cada um ouvia os apóstolos falarem «na sua própria língua» (At 2, 6): o Espírito não cunha uma linguagem idêntica para todos, mas permite a cada um falar línguas alheias (cf. 2, 4), de modo que cada um possa ouvir, de outros, o próprio idioma (cf. 2, 11).

Em suma, não nos encerra na uniformidade, mas predispõe-nos para nos acolhermos nas diferenças. Isto acontece a quem vive segundo o Espírito: aprende a encontrar cada irmão e irmã na fé como parte do corpo a que pertence. Este é o espírito do caminho ecumênico.

Caríssimos, perguntemo-nos a nós mesmos como avançamos neste caminho. Eu, pastor, ministro, fiel, sou dócil à ação do Espírito? Vivo o ecumenismo como um peso, como um compromisso extra, como um dever institucional, ou então como o desejo veemente de Jesus de que nos tornemos «um só» (Jo 17, 21), como uma missão que brota do Evangelho?

Concretamente, que faço eu por aqueles irmãos e irmãs que acreditam em Cristo e não são dos «meus»? Conheço-os, procuro-os, interesso-me por eles? Mantenho as distâncias comportando-me de maneira formal ou então procuro compreender a sua história e apreciar as suas particularidades, sem as considerar obstáculos intransponíveis?

Depois da unidade na diversidade, passemos ao segundo elemento: o testemunho de vida. No Pentecostes, os discípulos abrem-se, saem do Cenáculo. A partir de então, irão a todos os lugares do mundo. Jerusalém, que parecia o seu ponto de chegada, torna-se o ponto de partida duma aventura extraordinária. Já ninguém se recorda do medo que os mantinha, fechados, em casa! Agora vão por todo o lado, não para se distinguir dos outros, nem mesmo para revolucionar a ordem da sociedade e a organização do mundo, mas para irradiar por todos os cantos a beleza do amor de Deus através da sua vida.

Com efeito, o nosso anúncio não é tanto um discurso feito de palavras, como sobretudo um testemunho que se há de mostrar com os fatos; a fé não é um privilégio que se há de reivindicar, mas um dom a partilhar. Como diz um texto antigo, os cristãos «não têm cidades próprias, não usam uma linguagem peculiar, e a sua vida nada tem de excêntrico (…). Toda a terra estrangeira é sua pátria (…).

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Habitam na terra, mas a sua cidade é o Céu. Obedecem às leis estabelecidas, mas pelo seu modo de vida superam as leis. Amam a todos» (Epístola a Diogneto, 5). Amam a todos: aqui está o distintivo cristão, a essência do testemunho. O fato de estar aqui, no Bahrein, permitiu a muitos de vós voltar a descobrir e praticar a genuína simplicidade da caridade: penso na assistência aos irmãos e irmãs que chegam, numa presença cristã que com humildade quotidiana testemunha, nos locais de trabalho, compreensão e paciência, alegria e mansidão, benevolência e espírito de diálogo. Numa palavra: paz.

Será bom interrogar-nos também sobre o nosso testemunho, porque, com o passar do tempo, podemos avançar apenas por inércia e esmorecer em mostrar Jesus através do espírito das Bem-aventuranças, a coerência e a bondade da vida, a conduta pacífica. Agora que nos encontramos a rezar juntos pela paz, perguntemo-nos: Somos verdadeiramente pessoas de paz? Estamos possuídos pelo desejo de manifestar, por todo o lado e sem esperar nada em troca, a mansidão de Jesus? Fazemos nossas – trazendo-as no coração e à oração – as fadigas, as feridas e as desuniões que vemos à nossa volta?

Irmãos e irmãs, quis partilhar convosco estes pensamentos sobre a unidade, que o louvor fortalece, e sobre o testemunho, que a caridade fortifica. Unidade e testemunho são coessenciais: não se pode testemunhar verdadeiramente o Deus do amor, se não estivermos unidos entre nós como Ele deseja; e não se pode estar unido seguindo cada um por conta própria, sem se abrir ao testemunho, nem dilatar os confins dos próprios interesses e das próprias comunidades em nome do Espírito que abraça toda a língua e anseia por conquistar a cada um.

Permitam-me acrescentar uma reflexão: naquele dia, o Espírito Santo cria uma grande diversidade, que parece uma grande desordem. Mas o mesmo Espírito que dá a diversidade dos carismas é o mesmo que cria a unidade, mas a unidade como harmonia. O Espírito é harmonia, como dizia um grande Padre da Igreja: «Ipse harmonia est – Ele é a harmonia». Por isto é que nós rezamos: para que aconteça entre nós esta harmonia. Ele une e envia, reúne em comunhão e manda em missão. Na oração, confiemos-Lhe o nosso percurso comum e invoquemos sobre nós a sua efusão, um renovado Pentecostes que dê olhares novos e passos pressurosos ao nosso caminho de unidade e paz.

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