O Bispo de San Sebastián, Dom José Ignacio Munilla, publicou em 8 de setembro, um artigo no ‘Diario Vasco’, no qual alertou sobre o "panorama desolador" da natalidade na Espanha, onde morrem mais pessoas do que nascem, sem que a sociedade avalie o que estas cifras significam.

O Prelado escreveu este artigo por ocasião da festa da Natividade de Nossa Senhora. Por isso, fez memória dos pais da Virgem Maria, São Joaquim e Sant’Ana, a quem agradeceu "por terem trazido ao mundo aquela de quem nasceria o autor da vida”.

Sobre a natalidade na Espanha, o Bispo lembrou os dados publicados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) no final de junho passado e que mostram "um panorama desolador em matéria de natalidade".

Segundo dados do artigo, “a fertilidade é de 1,25 filhos e os nascimentos caíram 6% em comparação com o ano anterior. Acumulamos uma queda de 30% na última década; e se não tivéssemos nos beneficiado pela natalidade de imigrantes, esse declínio na Espanha chegaria a 44%”.

Ou seja, na Espanha "morrem mais pessoas do que nascem e, embora a população com mais de 65 anos ultrapasse nove milhões de pessoas, as menores de 15 anos não chegam a sete milhões".  Estes dados ficam mais graves "ainda se nos referimos ao território basco”.

Dom Munilla explica que "parece que estamos nos acostumando a escutar periodicamente esse tipo de dados, sem avaliar suficientemente o que implicam".

Por isso, ressalta que a publicação desse tipo de cifras, as quais descreve como “cada vez mais inquietantes”, suscita a preocupação lógica “pela sustentabilidade do sistema previdenciário”.

Além disso, assegura que há aqueles que "chegam a demonstrar certo temor pelo futuro de nossa civilização, pois os fluxos migratórios se aceleram devido à descompensação demográfica”.

Apesar disso, afirma que também existem vozes, "poucas, infelizmente", que levantem a necessidade de "implementar medidas para promover a natalidade, tais como o equilíbrio entre vida profissional e familiar, combate à especulação no preço da moradia, incentivos diretos, etc.".

O Bispo de San Sebastián também explica que "não estamos diante de um fenômeno novo na história da humanidade", pois essa "crise de natalidade acompanhou quase todos os declínios culturais".

O Prelado colocou o exemplo da Grécia Antiga, onde o historiador greco-romano do segundo século II, Polibio, escrevia que a taxa de natalidade havia caído bastante nos últimos anos na Grécia. “O povo deste país cedeu à vaidade e ao apego aos bens materiais; apegaram-se à vida fácil e não querem se casar ou, se o fazem, recusam-se a manter os recém-nascidos com eles, ou apenas criam um ou dois no máximo, a fim de proporcionar-lhes o maior bem-estar enquanto são pequenos e depois deixá-los com uma fortuna considerável”, disse Polibio.

Dom Munilla pontua que, poucos anos depois dessas crônicas de Polibio, "o Império Romano fagocita a Grécia decadente, até que séculos mais tarde chega o declínio do Império Romano, acompanhado novamente por uma profunda crise de natalidade".

Diante dessa situação, o Bispo de San Sebastián assegura que "seria muito triste se nossa preocupação com a crise demográfica se limitasse ao temor pelo enfraquecimento de nossas aposentadorias ou pelo medo da chegada de estrangeiros".

Ressalta que "também seria muito ingênuo supor que uma administração pública será capaz de reverter essa tendência com a mera aprovação de incentivos à natalidade, por mais necessários que sejam".

De fato, enfatiza que as classes sociais “mais ricas” não têm uma taxa de fertilidade acima da média, enquanto “os imigrantes na Espanha têm um número de filhos muito maior do que os nativos, mesmo que seu nível econômico seja menor e suas dificuldades objetivas para a conciliação trabalhista sejam maiores”.

Por isso, explica que "nossa crise de natalidade é um dos sinais mais evidentes da crise de valores que o Ocidente sofre".

“No contexto de uma sociedade na qual a qualidade de vida se identifica com mero bem-estar, o desafio da maternidade e da paternidade é percebido como muito exigente”, afirma o Prelado e destaca que “é inegável que a educação das crianças exige uma entrega plena e incondicional, me atreveria a dizer heroica, que não é facilmente compatível com a cultura do weekend, da invasão digital, do consumismo compulsivo, da desordem generalizada da vida, da crise existencial”.

Por isso, afirma que, "certamente, a maternidade e a paternidade exigem 'dar a vida' no sentido mais amplo do termo", uma vez que "a crise demográfica esconde uma crise de esperança".

Nesse sentido, ressalta que, “para abordar a questão é importante que entendamos que a baixa taxa de natalidade não compromete apenas o futuro de uma cultura, mas afeta muito seu presente”, pois “a falta de crianças em nossas famílias e em nossa sociedade nos empobrece muito mais do que supomos".

Por isso, destaca que “em algumas ocasiões constatamos que apenas a inocência das crianças é capaz de nos tirar de nossa zona de conforto, de nosso aburguesamento, levando-nos a entregar o melhor de nós mesmos até atingirmos o pico da maturidade, que geralmente coincide com o esquecimento de si mesmo” e, por isso, destaca que ”nossa cultura precisa urgentemente de crianças, porque há poucas coisas tão falsas quanto uma alegria sem inocência”.

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Dom Munilla também recorda que é importante não "roubar das crianças a experiência de fraternidade", pois seu déficit "se traduz na educação, em uma dificuldade notável de socialização e numa propensão a desenvolver a ferida narcisista".

“Se a experiência filial nos ajuda a tomar consciência de nossa dignidade, de que somos únicos e irrepetíveis, a experiência de fraternidade nos ensina a ser mais um entre todos; algo absolutamente necessário”, assegura o Bispo.

Por isso, explica que a "paternidade e a maternidade exigem 'dar a vida'. Mas a vida é algo que nos supera. É um ‘milagre’ que recebemos de graça e que somos chamados a transmitir generosamente", por isso "os fiéis geralmente não falam sobre reprodução, mas sobre procriação" e "os pais colaboram com Deus, o criador, para dar vida ao mundo".

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