A Conferência Episcopal Alemã e Adveniat, sua agência de ajuda solidária para a América Latina, anunciaram uma investigação independente por causa das acusações de abusos sexuais e de encobrimento de padres abusadores cometidos pelo bispo alemão Emílio Lorenzo Stehle, que dirigiu Adveniat por vários anos, serviu como padre na Colômbia, como bispo no Equador, e morreu em maio de 2017.

Dom Stehle não é acusado só de ter cometido abusos sexuais na Alemanha, mas também de ter acobertado pelo menos um padre alemão que fugiu para a América Latina, depois de ter recebido ordem de prisão das autoridades alemãs na década de 1960.

Este padre teria continuado a receber dinheiro da Conferência Episcopal Alemã por meio do escritório Fidei Donum, enquanto estava escondido na América do Sul.

Um grupo de especialistas tornou públicas as acusações enquanto investigava outro bispo alemão acusado de abusos, o atual bispo de Hildesheim, dom Heinrich-Maria Janssen.

Em 14 de dezembro, a chefe do grupo, Antje Niewisch-Lennartz, solicitou uma "investigação imediata e sistemática" das acusações em uma carta aberta dirigida a dom Georg Bätzing, atual presidente da conferência episcopal.

Niewisch-Lennartz é uma ex-juíza que atuou por quatro anos no Ministério da Justiça do estado alemão da Baixa Saxônia. Em sua opinião, as acusações têm credibilidade.

“Com base na minha experiência no contexto do meu trabalho no grupo de especialistas, mas também com base nos meus muitos anos no campo judicial, não tenho motivos para duvidar da veracidade das acusações” contra dom Stehle.

Após a publicação da carta, Adveniat confirmou as acusações em 15 de dezembro, especificando que recebeu informações "que também indicam Stehle como um perpetrador em casos de abuso sexual".

Niewisch-Lennartz também pediu a dom Bätzing, que também é acusado de possível encobrimento de abusos, para investigar se era praxe enviar os padres para a América do Sul quando já não eram considerados “viáveis” na Alemanha, e se houve mais ações de encobrimento.

Adveniat também confirmou que dom Stehle havia impedido que um homem conhecido só como “Padre B.” (devido a lei alemã de proteção de dados) fosse processado. O padre teria fugido para o Paraguai para escapar da polícia alemã.

O ministério público de Braunschweig emitiu um mandado de prisão para o "Padre B." em 1963 por ser suspeito de abuso sexual de menores necessitados de proteção.

"O envolvimento de Stehle no encobrimento e falsificação de identidade contribuiu para que o autor do crime não pudesse ser levado à justiça", explicou Adveniat em 15 de dezembro, expressando seu "grande pesar" pelo assunto.

É provável que dom Stehle também tenha conseguido garantir que o abusador recebesse dinheiro mensalmente da Conferência Episcopal Alemã.

Niewisch-Lennartz destaca em sua carta a dom Bätzing que as ações de Stehle “sugerem claramente que, de acordo com o grupo de especialistas, a forma como o processo contra o sacerdote acusado foi evitado não foi um caso isolado ou excepcional”.

Adveniat confirmou que os arquivos do escritório de coordenação Fidei Donum também deverão ser examinados "de forma externa, independente, profissional e sistematicamente para verificar sinais de abusos sexuais cometidos por sacerdotes fidei donum ou encobrimento”.

A agência de ajuda dos bispos alemães disse que defende "a estratégia de tolerância zero para crimes de abuso sexual na Alemanha e na América Latina", e que os resultados do relatório serão enviados às dioceses alemãs responsáveis ​​pelos padres fidei donum, bem como às dioceses responsáveis ​​na América Latina.

Os sacerdotes fidei donum (dom da fé) são padres enviados aos territórios de missão, especialmente na América e na África, ou para colaborar nos lugares onde os fiéis ainda se encontram em um estágio incipiente de formação. São o resultado de uma encíclica do papa Pio XII com o mesmo nome.

Emilio Lorenzo Stehle nasceu na Alemanha em 1926 e foi ordenado sacerdote pela arquidiocese de Friburgo em 1951. Ele serviu em países como Colômbia e Panamá desde 1957.

Em 1969, Stehle tornou-se diretor da recém-fundada Adveniat e, em 1972, foi promovido a vice gerente geral.

Entre 1983 e 1988 foi ao mesmo tempo diretor-geral da Adveniat e bispo no Equador, onde foi primeiro bispo auxiliar de Quito e depois o primeiro bispo da diocese de Santo Domingo de los Colorados. Neste último, atuou entre 1987 e 2002.

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Em 1972, os bispos alemães o nomearam primeiro diretor do escritório de coordenação Fidei Donum para os padres alemães que serviam na América Latina. Ele esteve no cargo até 1984.

Em 1986, ele recebeu a Grã-Cruz ao Mérito do governo alemão por sua participação na libertação de sete trabalhadores alemães na Nicarágua e por seus serviços no processo de paz em El Salvador.

Dom Stehle foi bispo no Equador até 2002 e depois se aposentou na Alemanha, na cidade de Constança, no sul. Como bispo emérito, ele continuou celebrando as crismas até 2006. Morreu em 16 de maio de 2017.

Com um total de três mil projetos por ano e um volume de cerca de 45 milhões de euros, a Adveniat é considerada a maior organização europeia de ajuda à América Latina e Caribe.

Tem 96 membros. Em junho de 2021, o padre jesuíta Martin Maier foi nomeado diretor executivo da agência.

Em 2019, a Adveniat e outra agência de ajuda alemã, Misereor, estiveram no centro das atenções por sua influência na Rede Eclesial Pan-amazônica (REPAM) e no Sínodo sobre a Amazônia realizado no Vaticano em outubro daquele ano.

Nesse mesmo ano, o então diretor da Adveniat e bispo de Essen, dom Franz-Josef Overbeck, apoiou uma "greve de mulheres" contra a Igreja realizada por ativistas que exigiam a ordenação de mulheres.

Dom Overbeck disse então que "nada será como antes" depois do Sínodo da Amazônia, no qual, em sua opinião, seria reconsiderado o papel da mulher na Igreja, a moral sexual, o papel do sacerdócio e a estrutura hierárquica eclesial; alguns dos temas que fazem parte do Caminho sinodal que está sendo realizado pela Igreja na Alemanha.

Em maio deste ano, dom Overbeck permitiu que os padres da sua diocese abençoassem uniões homossexuais, apesar da proibição explicitada em março deste ano pelo Vaticano

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