Recentes pesquisas realizadas nos documentos inéditos do Arquivo Secreto do Vaticano correspondentes ao pontificado do Papa Pio XI revelam os grandes esforços humanitários e de mediação entre nacionalistas e republicanos por parte da Igreja para evitar matanças de civis durante a Guerra Civil espanhola (1936-1939), afirmou hoje o destacado historiador e sacerdote Vicente Cárcere Ortí.

A Igreja desempenhou neste período da história da Espanha um grande "papel mediador" entre Francisco Franco e a II República e, particularmente, o Papa Pio XI uma "extraordinário trabalho humanitário a favor de prisioneiros e condenados a morte", quem além disso, "sempre tentou evitar a guerra", destacou hoje o sacerdote valenciano durante uma conferência no Centro Espanhol de Estudos Eclesiásticos de Roma.

Desta maneira, o Pe. Cárcere Ortí adiantou os primeiros dados de sua investigação, iniciada depois da abertura aos investigadores no mês passado de setembro dos documentos inéditos do Arquivo Secreto Vaticano correspondentes ao pontificado do Papa Pio XI, informou a agência AVAN.

A Santa Sé, assinalou o historiador, "não pôde evitar a Guerra Civil espanhola de 1936, porque aquilo foi uma autêntica revolução em que se enfrentaram duas Espanhas que se odiavam até a morte, entretanto, Pio XI tentou uma mediação ou armistício, que não foi aceito por Franco".

Do mesmo modo, Pio XI "interveio diretamente perante as autoridades da zona nacional, através de telegramas e despachos, comunicados por seu secretário de Estado, o Cardeal Eugenio Pacelli, depois Papa Pio XII, para impedir os bombardeios aéreos sobre os civis", acrescentou.

Em sua exposição, o estudioso, explicou que por motivo do Natal de 1938, a Santa Sé tratou de conseguir uma trégua de 24 ou 48 horas, "que o Papa pediria às duas partes em guerra, mas Franco lhe manifestou que esta não era possível porque era iminente a ofensiva da Catalunha, que marcaria o final da guerra".

A Santa Sé "interveio sempre de forma autônoma, convencida de que sua ação, inspirada nos supremos princípios religiosos e morais, teria maior eficácia e não seria considerada como uma ingerência política nos assuntos da Espanha", indicou Cárcere, precisando que o Santo Padre recomendou "moderação e não aceitou as pressões da França e Inglaterra, que perseguiam interesses políticos concretos".

Segundo o sacerdote, o Arquivo Secreto Vaticano conserva listas de prisioneiros e condenados à morte por Franco, assim como numerosa correspondência familiar "de quem solicitava a intervenção do representante pontifício, Monsenhor Antoniutti, pedindo clemência, embora poucas vezes foi escutado por parte de ambos os bandos". O prelado se ocupou, além disso, da volta dos milhares de crianças bascas expatriadas no princípio da guerra e as devolveu a suas famílias.

"As razões que aduziam os nacionais para justificar as execuções eram que o Governo republicano fuzilava indiscriminadamente os prisioneiros políticos, sem processo algum", segundo Cárcere.

Por outro lado, o próprio executivo republicano tentou em 1937 reatar as relações com o Vaticano, interrompidas desde novembro de 1936, mas a Santa Sé argumentou que não podia de modo algum receber um representante do mesmo, por causa da grave situação que se criou com a tremenda perseguição religiosa desencadeada: foram assassinados doze bispos e milhares de sacerdotes e religiosos, e incendiadas e destruídas a maioria das Igrejas e além de estar totalmente proibido o culto religioso público e privado.