Na noite deste domingo, durante o voo que o levou da Romênia a Roma, o Papa Francisco concedeu uma coletiva na qual abordou os temas do ecumenismo, suas recentes visitas a Bento XVI e pediu que a Europa retome o sonho dos pais fundadores da União Europeia.

A seguir a íntegra da conferência de imprensa:

Alessandro Gisotti (Diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé):

Boa noite, bem-vindo Santo Padre. Estamos voando de volta a Roma e o lema desta viagem era “caminhamos juntos”, mas também voamos juntos porque penso que voamos sempre tanto, também o compromisso, o cansaço. No discurso à imprensa estrangeira há poucos dias S.S. concluía dizendo “vejo nas viagens apostólicas vosso cansaço, o cansaço, a fadiga, o compromisso dos colegas que relatou esta viagem, hoje, Dia da das Comunicações Sociais, obviamente já sabem o tema “...” . Santo Padre, sei que quer, antes das perguntas, oferecer alguma reflexão sobre esta jornada dedicada a nós comunicadores:

Papa Francisco:

Boa noite. Muito obrigado a sua companhia e como disse Gisotti, hoje esta jornada é uma chamada a vocês, atrai nosso pensamento a vocês. Vocês trabalham nas comunicações, são trabalhadores como disse Alessandro, mas sobretudo vocês são, deveriam ser, testemunhos da comunicação. Hoje a comunicação vai em retrocesso, em geral, realizar contatos é mais importante que comunicar, faz-se contatos e não se chega a comunicar. E vocês por vocação são testemunhas no comunicar. É verdade, é preciso fazer os contatos, mas não deter-se aí. Animo-vos a ir adiante neste testemunho de comunicar. Este tempo tem menos necessidade de contatos e mais de comunicação. Obrigado, felicidades por seu dia e adiante com as perguntas.

Diana Dumitrascu (TVR - Romênia):

Santo Padre, agradeço sua visita à Romênia. Santidade, você sabe que milhões de nossos compatriotas emigraram nos últimos anos. Qual seria sua mensagem para uma família que deixa os próprios filhos para trabalhar no estrangeiro com o objetivo de assegurar um futuro melhor?

Papa Francisco:

Isto me faz pensar no amor da família, porque partir (famílias) em duas e três não é uma coisa boa. Sempre está a nostalgia pelo reencontro, mas partir-se porque não falte nada à família é um ato de amor. Na Missa de ontem escutamos a última petição daquela senhora que trabalhava no estrangeiro para ajudar a família. Um deslocamento assim é doloroso. E por que se vão? Não para fazer turismo mas por necessidade. Tantas vezes não é porque no país não encontrem...tantas vezes são resultado de uma política mundial que termina nisto. Sei que na história de seu país depois da queda do comunismo, e tempos depois, muitas, muitas empresas estrangeiras fecharam para abrir em outros países e ganhar mais. Fechar hoje uma empresa é deixar as pessoas na rua e esta é uma injustiça mundial, generalizada, de falta de solidariedade. É um sofrimento.

Como lutar? Procurando abrir fontes de trabalho. Não é fácil, não é fácil na situação mundial das finanças e da economia. Mas pensem que têm um nível de natalidade impressionante, aqui não se vê o inverno demográfico que se vê na Europa. É uma injustiça não poder ter fontes de trabalho para tantos jovens. Por isso desejo que resolva esta situação que não depende apenas da Romênia, mas da ordem mundial financeira, desta sociedade do consumismo, do ter mais, do ganhar mais, onde tantos ficam abandonados. Esta é minha resposta, um apelo à solidariedade mundial neste momento que Romênia tem a presidência (rotativa da União Européia NdT).

Cristian Micaci (Radio Maria Romênia em idioma húngaro) :

Santo Padre, como disse o diretor antes, falou-se muito de caminhar juntos. Agora à sua partida o que aconselharia à Romênia, como deveriam ser as relações entre as confissões, em particular entre a Igreja Católica e Ortodoxa, entre a minoria católica e a maioria ortodoxa, a relação entre as várias etnias, a relação entre o mundo político e sociedade civil?

Papa Francisco:

Que seja uma relação de verdade, eu diria. A relação da mão estendida quando há conflitos. Hoje um país em desenvolvimento com alto nível de natalidade como vocês, não pode se dar o luxo de ter inimigos dentro.

Deve haver um processo de aproximação, sempre. Diversas etnias, diversas confissões religiosas, sobre tudo as duas cristãs. Isto é o primeiro: sempre a mão estendida, a escuta do outro. Com os ortodoxos, vocês têm um grande patriarca, um homem de grande coração e um grande estudioso. Conhece a mística dos padres do deserto, a mística espiritual, estudou na Alemanha, e também um homem de oração. É fácil aproximar-se de Daniel, é fácil, porque o sinto irmão, e falamos como irmãos, e não direi mais porque vocês na segunda-feira o dirão... Caminhemos juntos tendo sempre esta idéia: o ecumenismo não é chegar ao final da partida, da discussão. O ecumenismo se faz caminhando juntos, rezando juntos; o ecumenismo da oração.

Temos o ecumenismo do sangue. Quando assassinavam cristãos não perguntavam: Você é ortodoxo?, você é católico?, você é luterano?, você é anglicano? Não, você é cristão. O sangue se mesclava.

Um ecumenismo do testemunho, da oração, do sangue, o ecumenismo do pobre que é trabalhar juntos. Isso: devemos trabalhar para ajudar os doentes, marginados, ajudar. Mateus 25 é um belo programa ecumênico. Caminhar juntos é já uma unidade dos cristãos, mas não esperem que os teólogos cheguem a um acordo para chegar à Eucaristia. A Eucaristia se faz todos os dias com a oração, com a memória do sangue de nossas mártires, com as obras de caridade e desejando o bem.

Em uma cidade da Europa há uma relação entre o arcebispo católico e o arcebispo luterano. O arcebispo católico devia estar no Vaticano no domingo à noite, chamou-me a dizer que chegaria na segunda-feira na manhã. Quando chegou me disse: “me desculpe, ontem o arcebispo luterano precisou ir a uma reunião deles e me pediu ‘venha por favor a minha catedral e realize o culto’”. Existe a fraternidade, chegar a este ponto é muito, não? E a fez o católico. Ele não celebrou a Eucaristia, somente a predicação.

Quando eu em Buenos Aires fui convidado pela Igreja escocesa a fazer prédicas, ia e fazia a prédica. É possível caminhar juntos. Unidade, fraternidade, mão estendida, é preciso olhar-nos bem. Falar mal de outros... Defeitos temos todos, mas se caminharmos juntos, todos os defeitos nós deixamos de lado.

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Xavier de Normand (por parte dos meios de comunicação franceses):

Santidade, minha pergunta tem a ver com a primeira. O primeiro dia deste viaje S.S. foi à catedral ortodoxa para este momento belo mas também um pouco duro da oração do Pai-Nosso. Um pouco duro porque católicos e ortodoxos estavam juntos, mas não rezaram juntos. Você falou que ecumenismo da oração. Minha pergunta é: Santidade, o que pensou você quando permaneceu em silencio durante a oração do Pai-Nosso em romeno?, e quais são os próximos passos concretos neste caminhar juntos?

Papa Francisco:

Faço uma confidência. Eu não permaneci em silêncio, rezei o Pai-Nosso em italiano e vi durante a recitação do Pai-Nosso, a maioria das pessoas fosse em romeno, fosse em latim, rezava. O Povo vai além de nós, que somos as cabeças. Nós, os chefes, temos que fazer os equilíbrios diplomáticos para assegurar que caminhemos juntos, há hábitos, regras diplomáticas que é bom manter para que as coisas não se arruínem. Mas cada povo reza junto, também nós quando estamos sozinhos rezamos juntos. Este é um testemunho, e tenho uma experiência de oração com tantos pastores, luteranos, evangélicos, também ortodoxos. Os patriarcas estão abertos, também nós os católicos têm gente fechada que não quer, que diz que os ortodoxos são cismáticos. São coisas velhas. Os ortodoxos são cristãos. Há grupos católicos um pouco integristas. Devemos tolerá-los, rezar por eles, porque o Senhor com o Espírito Santo os abrande. Mas eu rezei os dois, não olhei para Daniel mas acredito que ele também tenha feito o mesmo.

Manuela Tulli (Ansa):

Estivemos na Romênia, país que se mostrou europeísta. Nestas eleições alguns líderes como nosso vice-premiê Matteo Salvino fizeram campanha política mostrando símbolos religiosos. Que impressão lhe deu isto?, e se é verdade que S.S. não quer encontrar a nosso vice-premiê…

Papa Francisco:

Começo com a segunda (pergunta). Eu não recebi de ninguém do governo, exceto do premier, um pedido audiência, de ninguém. Porque para uma audiência se deve falar com a Secretaria de Estado. O premiê Conte solicitou, e foi concedida como indica o protocolo. E tive uma boa audiência com o premiê, de uma hora ou mais possivelmente, é um homem inteligente, um professor que sabe do que fala.

Segundo: do vice-premiê não recebi nada, nem de outros ministros. Mas sim do presidente da República e eu o recebi.

Sobre as imagens: confessei tantas vezes que dos periódicos leão dois: o jornal do partido, que é o L’Osservatore Romano. Seria bom que vocês o lessem porque encontrariam interpretações muito interessantes, e coisas que digo também estão aí. E depois Il Messaggero que eu gosto porque tem os títulos grandes e o folheio assim, algumas vezes me detenho ali; e não me detive nestas notícias das propagandas, nas notícias de como os partidos fizeram suas propagandas eleitorais, de verdade.

Há um terceiro elemento. Nisto me confesso ignorante: eu não entendo a política italiana e de verdade devo estudá-la, então, emitir uma opinião sobre o conteúdo de uma campanha eleitoral, de um dos partidos, sem uma informação assim, seria muito imprudente de minha parte. Eu rezo por todos, para que a Itália vá adiante, para que os italianos se unam e sejam leais no compromisso, também eu sou italiano porque sou filho de um imigrante italiano, de sangue sou italiano. Meus irmãos todos têm a cidadania italiana, eu não quis tê-la porque na época que a concederam eu era bispo e disse que o bispo deve ser da pátria.

Há na política de tantos países a enfermidade da corrupção. Por todos lados. Não digam amanhã que o Papa disse que a política italiana é corrupta. Não. Eu disse que uma das enfermidades da política, por toda parte, é cair na corrupção. Por favor, não me façam dizer o que não disse. Uma vez me disseram como são os pactos políticos. Imagine uma reunião de nove empresários, à mesa; discutem para ficar de acordo sobre o desenvolvimento de sua empresa, ao final depois de horas, horas, café, café e mais café, entram em acordo, tomaram a palavra, fecham o negócio, agradecem, todos dizem: “de acordo, de acordo” e enquanto imprimem os papéis, tomam um uísque para festejar, e depois, começam a passar de mão em mão os papéis para finalmente assinar o acordo. Então, no momento que os papéis circulam pela a mesa, um passa outro documento por debaixo da mesa... Isto é corrupção política. Que acontece um pouco por toda parte. Nós, devemos ajudar aos políticos a serem honestos, a não fazer campanha com bandeiras desonestas, com a calúnia, a difamação, os escândalos; e tantas vezes semeando ódio e medo.

Isto é terrível, um político nunca deve semear ódio e medo, só esperança. Justa, exigente, mas esperança, porque deve conduzir o país até lá e não impor-lhe medo.

Eva Fernández (COPE):

Santo Padre, ontem no encontro com os jovens e as famílias insistiu de novo na importância da relação entre os avós e os jovens a fim que os jovens tenham raízes para ir para frente e os avós possam sonhar. Você não tem uma família próxima, mas disse que com Bento XVI é como ter um avô em casa. Ainda o vê assim?

Papa Francisco:

Agora ainda mais! Cada vez que vou visitá-lo eu o sinto assim, tomo a mão e lhe faço falar. Fala pouco, fala devagar, mas com a mesma profundidade de sempre, porque o problema de Bento são os joelhos, não a cabeça. Tem uma grande lucidez. E sentindo-o falar me sinto forte, sinto a seiva das raízes que me chegam e me ajudam a seguir adiante. Sinto esta tradição da Igreja que não é coisa de museu, a tradição... A tradição é a raiz que lhe dão seiva para crescer, e você não será como a raiz, não; você florescerá, a árvore crescerá e dará os frutos, e as sementes serão as raízes para outros. A tradição da Igreja está sempre em movimento.

Em uma entrevista que de Andrea Monda no L’Osservatore Romano – vocês lêem o L’Osservatore, não? – há uns dias atrás, havia uma situação que me agradou muito, tratava-se do músico Gustav Mahler, e falando da tradição ele dizia: a tradição é a garantia do futuro e não a custódia das cinzas. Não é um museu. A tradição não custodia as cinzas. A nostalgia dos integristas: retornar às cinzas. Não, as tradições são raízes que garantem que a árvore cresça, floresça e dê fruto; e repito essa peça do poeta argentino (Francisco Luis Bernárdez, Ndt) que eu gosto tanto: tudo o que a árvore tem de florido, vive do sepultado.

Estou contente porque em Iasi fiz referência a essa avó que teve um gesto de cumplicidade e com os olhos, naquele momento... estava tão emocionado que não pude nem reagir, e o papamóvel seguiu adiante mas poderia ter dito àquela avó que viesse para mostrar a todos aquele gesto, e disse ao Senhor Jesus: é uma pena, mas Tu és capaz de resolver, e nosso bravo Francisco (fotógrafo) quando viu a comunicação que tive com aquela mulher com o olhar, tomou a fotografia e a publicou. Vi-a nesta tarde no Vatican Insider. Estas, pois, são as raízes. E isto crescerá, não será como eu, mas eu dou o meu contributo. É importante este encontro.

Depois estão os verbos, quando os avós sentem de ter netos que levarão adiante a história, começam a sonhar; e os avós quando não sonham se deprimem. Existe o futuro e os jovens animados começam a profetizar.

Lucas Wiegelmann (Herder Correspondenz):

Santo Padre nestes dias falou muito sobre a fraternidade, as pessoas e o caminhar juntos, como já escutamos outras vemos, mas, vemos que na Europa cresce o número dos que não desejam a fraternidade, e sim o egoísmo e o isolamento, e preferem caminhar sozinhos. Por que é assim?, e o que deve fazer a Europa para mudar isto?

Papa Francisco:

Desculpe-me por citar a mim mesmo, mas o faço sem vaidade, por utilidade. Eu falei deste problema nos dois discursos no Estrasburgo: no discurso que dei quando recebi o Prêmio Carlo Magno e depois no discurso que dei a todos os chefes de Estado e de governo na Capela Sistina no aniversário dos pactos, na fundação da União Europeia.

Nestes discursos disse tudo o que penso, e também há um quinto discurso que não fui eu quem dei, mas o prefeito Bugermeister de Aachen (na Alemanha). Este é uma jóia, a jóia dos alemães.

A Europa deve dialogar, não deve dizer “somos unidos, agora digam a Bruxelas vocês que se virem”.

Todos somos responsáveis pela União Europeia e esta circulação da presidência não é um gesto de cortesia como dançar o minueto: agora você, agora você. Não. Isto é um símbolo da responsabilidade que cada um dos países tem sobre a Europa. Se a Europa não olhar bem os desafios futuros, a Europa se desvanecerá, será desvanecida. Permiti-me dizer em Estrasburgo que sinto que a Europa está deixando de ser a mãe Europa; está-se convertendo na “avó Europa”. Ela envelheceu, perdeu a ilusão de trabalhar juntos. Possivelmente às escondidas algum pode fazer a pergunta: não será este o fim de uma aventura de 60 anos?

Retomar a mística dos pais fundadores... Retomar isto... Europa tem necessidade de si mesma, de ser ela mesma, da identidade própria, da própria unidade; e superar com isto, com tantas coisas que a boa política oferece, as divisões e as fronteiras. Estamos vendo como estão as fronteiras na Europa. Isto não faz bem, ao menos as fronteiras culturas, não fazem bem. É verdade que o país tem sua própria cultura e deve cuidá-la, mas com a mística do poliedro. Há uma globalização onde se respeita a cultura de todos, mas todos unidos.

Por favor, que a Europa não se deixe vencer pelo pessimismo ou as ideologias, porque a Europa hoje é atacada não com canhões ou bombas neste momento, sim com ideologias, ideologias que não são europeias, que vêm de fora, ou crescem nos grupinhos da Europa, que não são grandes. Pensem na Europa dividida e beligerante do 14 e do 32, 33, até o 39, quando estalou a guerra. Não retornemos a isto por favor. Aprendamos da história, não caiamos no mesmo buraco. Da outra vez lhes contei um ditado que afirma que o único animal que cai duas vezes no mesmo buraco é o homem. O asno nunca o faz. Mas leiam o discurso do Bugermeister, é uma joia.

Gisotti:

Obrigado Santo Padre, obrigado por esta disponibilidade ao final de três dias tão ocupados, também por estas cinco viagens, uma após a outra nesta primeira parte do ano, ricas de momentos.

Papa Francisco:

Agora duas coisas, por motivos do clima precisei viajar em automóvel ontem por duas horas e quarenta. Foi uma graça de Deus, vi uma paisagem tão bela como nunca tinha visto. Cruzei toda a Transilvânia.

Hoje para ir a Blaj, o mesmo. Uma coisa linda. A paisagem deste país, agradeço também a chuva que me fez viajar assim e não de helicóptero. Tive mais contato com a realidade.

A segunda coisa: sei que alguns de vocês são crentes, outros nem tanto, mas direi aos crentes: rezem pela Europa, rezem pela Europa, o Senhor nos dê a graça. Aos não-crentes desejem a boa vontade, aquele desejo sincero de que a Europa volte a ser o sonho dos pais fundadores.

Confira: