Depois de assistir ontem na Sala Paulo VI a um concerto em sua honra por seu aniversário e seu 5° aniversário de eleição à Sede de Pedro oferecido por Kirill I, Patriarca ortodoxo de Moscou e de todas as Rússias, o Papa Bento XVI assinalou que ante a tendência da cultura atual, especialmente na Europa, de esquecer suas raízes cristãs, é necessário voltar para elas para gerar um novo humanismo que permita o autêntico progresso humano.

Em seu discurso depois do concerto que se realizou no marco das "Jornadas de cultura e espiritualidade russa no Vaticano, o Santo Padre recordou que "nestas obras está presente de forma profunda a alma do povo russo e com ela a fé cristã, que encontram uma extraordinária expressão precisamente na Liturgia Divina e no canto litúrgico que a acompanha sempre".

"Efetivamente há um estreito ligame originário entre a música russa e o canto litúrgico: é na liturgia e a partir da liturgia onde se manifesta e inicia grande parte da criatividade artística dos músicos russos para dar vida a obras mestras que mereceriam ser mais conhecidas no mundo ocidental".

Seguidamente Bento XVI destacou que os compositores russos dos séculos XIX e XX, como Mussorgsky, Rimski-Korsakov, Tchaikovsky e Rachmaninov "souberam entesourar o rico patrimônio musical-litúrgico da tradição russa, refazendo-o e harmonizando-o com motivos e experiências musicais do Ocidente e mais próximos à modernidade. Na música, portanto, já se antecipa e em certo sentido se realiza a confrontação, o diálogo, a sinergia entre o Oriente e Ocidente, assim como entre tradição e modernidade".

"Em uma visão análoga, unitária e harmoniosa da Europa, pensava o venerável João Paulo II quando, recorrendo à imagem de Vjaceslav Ivanovich Ivanov dos ‘dois pulmões’ com os quais deverá voltar a respirar, auspiciava ser de novo conscientes das profundas e comuns raízes culturais e religiosas do continente europeu, sem as quais a Europa de hoje estaria como privada de uma alma e marcada, de qualquer forma, por uma visão redutora e parcial".

O Papa advertiu logo que "a cultura contemporânea e particularmente a européia corre o risco da amnésia, do esquecimento e, portanto, do abandono do extraordinário patrimônio suscitado e inspirado pela fé cristã, que constitui a espinha dorsal da cultura européia, e não só dela".

"As raízes cristãs da Europa estão formadas, não só pela vida religiosa e o testemunho de tantas gerações de crentes mas também pelo inestimável patrimônio cultural e artístico, orgulho e recurso precioso dos povos e dos países em que a fé cristã, em suas diferentes manifestações, dialogou com as culturas e as artes", precisou.

O Papa Bento XVI sublinhou logo que "hoje também essas raízes são vivas e fecundas, no Oriente e no Ocidente, e podem, é mais, devem inspirar um novo humanismo, uma nova estação de autêntico progresso humano, para responder eficazmente aos numerosos e, às vezes, cruciais provocações que nossas comunidades cristãs e nossas sociedades devem enfrentar, em primeiro lugar a secularização, que não só empurra a prescindir de Deus e do seu projeto, mas acaba por negar a mesma dignidade humana, em uma sociedade regulada apenas por interesses egoístas".

"Voltemos a fazer que a Europa respire a plenos pulmões, a devolver a alma não só aos crentes mas também a todos os povos do continente, a promover a confiança e a esperança, enraizando-as na experiência milenária da fé cristã!", animou o Papa.

Finalmente o Pontífice indicou que "neste momento, não pode faltar o testemunho coerente, generoso e valente dos crentes para que possamos olhar juntos ao futuro comum, como a um futuro onde a liberdade e a dignidade de cada homem e de cada mulher se reconheçam como um valor fundamental e se valorize a abertura ao Transcendente, a experiência de fé como dimensão constitutiva da pessoa".

O concerto, com música de compositores russos dos séculos XIX e XX foi interpretado pela Orquestra Nacional Russa, dirigida pelo professor Carlo Ponti, com a participação do Coro Sinodal de Moscou e da Capela de São Petersburgo.