Em um artigo publicado em L'Osservatore Romano (LOR), Simona Beretta, perita em Doutrina Social da Igreja da Universidade Católica do Sacro Cuore, ressalta a atualidade, ante a crise financeira global, da encíclica de Pio XI Quadragesimo Anno, escrita em 1931 depois do craque de 1929 e a 40 anos da Rerum Novarum de Leão XIII.

No artigo titulado "O fracasso dos atalhos financeiros", que será publicado em sua integridade o próximo 16 de janeiro na revista bimestral "Vita e pensiero" (Vida e pensamento), e após citar amplamente algumas passagens da encíclica Quadragesimo Anno, de Pio XI; e duas passagens da encíclica Centesimus Annus, de João Paulo II; Beretta assinala que "quando se obscurece nos operadores a consciência da natureza e o significado das finanças, estas deixam de ser o que são, deixam de ser a ponte entre as economias e os investimentos; e se auto-condenam ao fracasso a mediano e longo prazo".

Seguidamente explica que "inclusive as inovações jurídicas mais 'inteligentes', ordenadas para o melhor funcionamento do mercado, podem retorcer-se contra o mercado mesmo. O exemplo da encíclica (Quadragesimo Anno, subtitulada proféticamente "sobre a restauração da ordem social em perfeita conformidade da lei evangélica") são as sociedades por ações, que consentem a participação difundida da propriedade de empresa limitando o risco individual, mas que concentram o poder de decisão nas mãos de uns poucos".

Logo depois de comentar que "somente 'aumentando a razão' seremos capazes de entender a realidade, incluída a crise presente, e assim procurar soluções", a perita afirma, citando a Centesimus Annus que "a Igreja não tem modelos que propor", mas "muito por dizer". "As encíclicas sociais se tomam a peito o assunto do poder utilizando também expressões fortes e põem sempre em evidência a centralidade concreta e humilde do trabalho humano", adiciona.

Para a perita, em meio da "atual crise financeira, que é certamente a crise de um sistema de poder econômico, político e cultural" alguns ainda se vêem tentados a "tomar atalhos, emprestando e tomando empréstimos dentro de relações anônimas, 'de mercado', ocultas no presente, com contrapartes que se busca abandonar velozmente quando o vento muda de direção. A tentação do atalho é forte, porque parece permitir fazer os próprios negócios em completa liberdade, sem criar vínculos estáveis com nenhum: finanças 'líquidas' para uma sociedade 'líquida'".

Depois de lembrar as palavras do Papa Bento XVI em seu discurso ao mundo da cultura no Colégio dos Bernardinos em Paris: "seria fatal se a cultura (…) de hoje pudesse compreender a liberdade atual solo como a falta total de vínculos", Simone Beretta conclui precisando que "ao menos no mercado financeiro, temos a prova de que a 'liberdade' de comprar e vender riscos financeiros em um mercado anônimo que não exige o esforço dos vínculos, eventualmente, termina sendo fatal", conclui a perita.