O Vaticano divulgou ontem uma carta circular enviada a todas as conferências episcopais do mundo na que especifica ainda mais o procedimento a ser seguido contra os abusos cometidos por alguns membros do clero, e na qual se solicita a redação de linhas mestras que estabeleçam o procedimento específico a ser seguido de acordo a cada realidade, e que deve ser enviada à Santa Sé até maio de 2012.

O documento apresentado hoje amplia o texto já conhecido desde abril de 2010, no qual a Congregação para a Doutrina da Fé (CDF) assinalava os passos a serem seguidos ante uma denúncia de abusos cometidos por parte de membros do clero.

Em uma nota preparada pelo Diretor do Escritório de Imprensa da Santa Sé, o Pe. Federico Lombardi, sobre a carta circular apresentada ontem, o sacerdote explica que a Congregação para a Doutrina da Fé oferece "oferece uma ampla série de princípios e indicações, que não somente facilitarão a formulação de Linhas guia e, portanto, a uniformidade da conduta das autoridades eclesiásticas nas diferentes nações, mas também garantirão a coerência no nível de Igreja universal, ainda que respeitando as competências dos Bispos e dos superiores religiosos".

"A atenção prioritária às vítimas, os programas de prevenção, a formação dos seminaristas e a formação permanente do clero, a cooperação com as autoridades civis, a aplicação atenta e rigorosa da normativa canônica mais atualizada nesta matéria são as orientações principais que devem constituir as Diretrizes em todo mundo", prossegue.

A nota assinala ademais que há duas indicações claras do Cardeal William Llevada, Prefeito da CDF, para os bispos: "em primeiro lugar, implicar os Superiores Maiores dos institutos religiosos clericais (para que se tenha em conta não só ao clero diocesano, mas também ao religioso), e depois, enviar cópia das Linhas guia à Congregação ‘antes de fins do mês de maio do 2012’".

Três partes da carta circular

O Pe. Lombardi explica logo em sua nota que "a carta circular em si é breve, mas muito densa, e se divide em três partes".

A primeira parte desenvolve uma série de indicações gerais, incluindo, em particular: a atenção prioritária às vítimas de abuso sexual: a escuta e a assistência espiritual e psicológica às vítimas e aos familiares.

Neste compartimento se precisa o desenvolvimento de programas de prevenção para criar ambientes verdadeiramente seguros para os menores, a formação dos futuros sacerdotes e religiosos e o intercâmbio de informação sobre os candidatos ao sacerdócio ou à vida religiosa que se transladam.

Também se considera o acompanhamento dos sacerdotes, sua formação permanente e a formação a sua responsabilidade no âmbito dos abusos, a maneira de segui-los quando são acusados, de tratar segundo o direito os eventuais casos de abuso, a reabilitação da reputação de quem tem sido acusado injustamente.

Finalmente, a primeira parte explica a "cooperação com as autoridades civis no âmbito de suas respectivas competências (...). A cooperação deveria aplicar-se não só nos casos de abusos por parte do clero, mas também do pessoal que trabalha em estruturas eclesiásticas".

A segunda parte recorda logo as prescrições atualmente vigentes da legislação canônica depois da atualização de 2010.

Esta segunda parte "recorda a competência dos bispos e superiores maiores para a investigação preliminar e, em caso de acusações acreditáveis, a obrigação de remeter o caso à Congregação para a Doutrina da Fé, que oferece as indicações para o seguimento do caso".

Também "fala-se das medidas cautelares que deverão ser impostas e da informação que deverá ser  dada ao acusado durante a investigação preliminar" e "recorda-se as medidas canônicas e as penas eclesiásticas que poderão ser aplicadas aos culpados, incluindo a demissão do estado clerical".

Por último, especifica-se "a relação entre a legislação canônica válida para toda a Igreja e as eventuais normas específicas particulares adicionais que as Conferências Episcopais considerem apropriadas ou necessárias, e o procedimento que deve ser seguido nestes casos".

A terceira e última parte enumera uma série de observações úteis para formular as orientações operativas concretas para os Bispos e Superiores maiores.

Entre outras coisas, a nota "sublinha a necessidade de oferecer assistência às vítimas; de tratar com respeito o denunciante e assegurar a privacidade e a reputação das pessoas; de ter devidamente em conta as leis civis do país, incluindo a eventual obrigação de avisar as autoridades civis; de garantir ao acusado informação sobre as acusações e possibilidades de responder, e, em todo caso uma manutenção justa e digna; de excluir a volta do clérigo ao ministério público, em caso de perigo para os menores ou de escândalo para a comunidade".

"Uma vez mais, reitera-se a responsabilidade primitiva dos bispos e superiores maiores, que não pode ser substituída por órgãos de controle ou discernimento, apesar de ser úteis ou necessários para sustentar esta responsabilidade".

O Pe. Lombardi conclui sua nota explicativa assinalando que a carta circular é, portanto, "um passo muito importante para promover em toda a Igreja a consciência da necessidade e da urgência de responder de maneira mais eficaz e com visão de futuro ao flagelo dos abusos sexuais por parte de membros do clero, renovando assim a plena credibilidade do testemunho e da missão educativa da Igreja, e contribuindo a criar na sociedade em geral aqueles ambientes educativos seguros dos quais existe uma necessidade urgente".